Heineken anuncia que não instalará fábrica de cerveja na APA Cárstica de Lagoa Santa
13 de dezembro de 2021
Em decisão pouco comum no âmbito da iniciativa privada no Brasil, a Heineken anunciou hoje (13) que não instalará fábrica na Área de Proteção Ambiental (APA) Carste de Lagoa Santa, no município de Pedro Leopoldo. A Amda uniu-se ao movimento de pesquisadores e a organizações da sociedade civil para que a Heineken buscasse alternativa locacional da fábrica.
Para a superintendente da Amda, Dalce Ricas, “a decisão mostra compromisso socioambiental da empresa, à frente, inclusive, dos órgãos ambientais brasileiros, que ainda se pautam por visões estreitas e decisões baseadas no chamado ‘carimbo ambiental’, que tem no licenciamento apenas rito autorizativo, sem buscar verdadeiramente alternativas de menor impacto. Temos de reconhecer que a Heineken mostrou humildade e respeito pelas preocupações das instituições públicas e privadas que se manifestaram contra a instalação de sua fábrica na APA”.
Para o ex-presidente da Feam, José Cláudio Junqueira, “o poder da opinião pública foi mais forte que uma política ambiental fraca”.
Em nota pública, a empresa disse que embora o governo de Minas Gerais tenha liberado a construção e a Heineken possua autorização judicial para seguir com as obras, a empresa decidiu mudar a localização da fábrica devido à proximidade do terreno com sítios arqueológicos de inestimáveis valores histórico e ambiental.
Disse ainda que a decisão considera “os diferentes entendimentos de órgãos envolvidos e da sociedade em geral”, que se manifestaram contra a instalação da fábrica onde foi descoberto o crânio de “Luzia”, o fóssil humano mais antigo do continente americano”, e que a fábrica no local “só faria sentido se, acima de tudo, contasse com o apoio de toda a sociedade, incluindo agentes que contribuem para o desenvolvimento socioambiental da região”.
Atuação da sociedade civil foi decisiva
A Amda desenvolveu campanha nas redes sociais, inclusive com publicação de uma série de posters em quadrinhos, criados pelo escritor e artista José Carlos Aragão. Buscou apoio no movimento ambientalista para ofício enviado ao presidente da Heineken e à sua maior acionista, Charlene Heineken, solicitando que a empresa considerasse os problemas levantados pela sociedade, ICMBio e MP. O ofício teve adesão de 60 ONGs.
Ofícios foram também enviados ao Conselho de Meio Ambiente da União Europeia e ao Museu de História Natural da Dinamarca, pátria de Peter Lund, pesquisador que há mais de um século descobriu presença de seres humanos e animais pré-históricos na área cárstica de Lagoa Santa. A Amda apelou até para a grande imprensa internacional. Nota em inglês foi enviada aos jornais The Washigton Post, Le Monde, The New York Times, The Guardian, El País, Euronews e Süddeutsche Zeitung.
Controvérsia
O anúncio acontece logo após pronunciamento da secretária de meio ambiente Marília Melo de que a Semad não atenderá recomendação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG) para suspender as licenças de instalação da fábrica, pois a “licença ambiental concedida à empresa não apresenta vícios ou ilegalidades, motivos pelos quais não há que se falar em penalidade de suspensão da referida licença”.
“É inédito: uma empresa posicionar-se à frente do órgão ambiental que deveria proteger a área cárstica de Lagoa Santa”, diz Dalce. Na nota, a Heineken comunica que a fábrica será instalada em Minas e o novo local será anunciado em 2022.