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Projeto de Lei que acaba com o licenciamento no Brasil avança para o Senado

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Projeto de Lei que acaba com o licenciamento no Brasil avança para o Senado
Aprovação do PL é um incentivo à destruição./Crédito: Fábio Nascimento

Sem debate público e sob onda de protestos, a Câmara dos Deputados aprovou, na semana passada, o Projeto de Lei 3.729/2004, que praticamente acaba com o licenciamento ambiental no Brasil. A proposta torna o licenciamento exceção, isentando diversas atividades de passarem pelo processo, um retrocesso que pode causar danos irreparáveis à biodiversidade do país e graves impactos socioambientais.

A versão aprovada, proposta pelo deputado Neri Geller (PP-MT), é considerada a pior e mais radical desde a proposição do PL, há 17 anos. A matéria foi apresentada uma semana antes da votação e tramitou em regime de urgência, sem qualquer participação da sociedade e transparência. Elaborado a “portas fechadas”, o texto aprovado não foi debatido nem na própria Câmara.

Ambientalistas veem a aprovação como a consolidação do plano do governo, de “passar a boiada” sobre a legislação ambiental enquanto o país enfrenta a pandemia da Covid-19. O texto, que segue agora para análise do Senado Federal, deve ser uma das prioridades deste ano, informou o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), presidente da Comissão de Agricultura e Reforma Agrária.

Ex-ministros do Meio Ambiente, organizações da sociedade civil e parlamentares já se posicionaram contra a proposta, que apresenta grave risco às florestas brasileiras, povos indígenas e comunidades afetadas por obras de infraestrutura, como hidrelétricas, barragens e estradas.

“O PL de Geller desmonta a já maltratada estrutura do licenciamento ambiental e abre a porteira para a boiada passar, e com ela novos desastres como Mariana e Brumadinho. É um cheque em branco para destruir”, declarou em nota, a Associação Nacional dos Servidores da Carreira de Especialista em Meio Ambiente (Ascema Nacional).

Entenda as principais mudanças:

Autolicenciamento

Um dos pontos mais graves do projeto é o estabelecimento da licença autodeclaratória, chamada de Licença por Adesão e Compromisso (LAC), como regra para o licenciamento no país. A licença será emitida automaticamente pelo órgão licenciador, sem análise prévia. Obras de duplicação e pavimentação de rodovias estão entre as atividades que poderão ser licenciadas automaticamente.

“É a Lei do Deslicenciamento. Esse projeto instala no Brasil o autolicenciamento ambiental como regra. Para dar apenas um exemplo, dos 2 mil empreendimentos sob licenciamento ambiental em curso na capital do Brasil, 1.990 passarão a ser autolicenciados a partir do primeiro dia de vigência da nova lei”, destacou André Lima, coordenador do Instituto Democracia e Sustentabilidade.

Renovação de licença automática

O projeto também prevê renovação automática da licença ambiental mediante declaração online do empreendedor, atestando que ele está cumprindo a legislação vigente. O requerimento deve ser pedido com antecedência mínima de 120 dias antes do vencimento da licença original. O prazo de validade será automaticamente prorrogado até a manifestação definitiva do órgão licenciador.

Alessandra Cardoso, assessora política do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc) chamou a atenção para a falta de estrutura dos órgãos para atender os prazos exigidos. “O texto aprovado produzirá uma avalanche de problemas sociais e ambientais não avaliados e não mitigados por empreendimentos de significativo impacto ambiental. Os órgãos ambientais não terão condições de se manifestar em tempo, pois o prazo é impraticável, além de estarem sucateados e silenciados”.

Dispensa de licenciamento

Outro ponto bastante criticado é a dispensa de licenciamento de 13 tipos de atividades que comprovadamente causam impactos ambientais, como obras em rodovias e de distribuição de energia elétrica; sistemas e estações de tratamento de água e esgoto; além de pecuária extensiva, semi-intensiva e pecuária intensiva de pequeno porte.

Disputa entre estados e municípios

Ao permitir que estados e municípios adotem suas próprias regras, o projeto ainda favorece um cenário de competição desleal, em que os estados podem acabar flexibilizando demais sua legislação ambiental para atrair mais empreendimentos. Assim, o Estado que mantiver, por exemplo, a exigência de estudos de impacto ambiental, poderá ser desfavorecido frente a outro que não exija.

Unidades de conservação

Ainda segundo a proposta, quando o empreendimento afetar uma unidade de conservação (Uc) ou sua zona de amortecimento, o empreendedor não precisará mais da autorização do órgão gestor da unidade, como o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), responsável pelas UCs federais.