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Ibama libera posse de papagaios para beneficiar ministro do STJ

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Ibama libera posse de papagaios para beneficiar ministro do STJ
Crédito: Rafaela Noronha

O presidente do Ibama, Eduardo Bim, mudou o entendimento da Lei de Crimes Ambientais (Lei nº 9.605/1998) sobre como o órgão deve agir em caso de posse irregular de psitacídeos. O despacho publicado no último dia 20 beneficia diretamente a esposa do ministro do Superior Tribunal de Justiça (STJ) Geraldo Og Fernandes, legalizando a posse irregular de um papagaio-verdadeiro (Amazona aestiva).

Bim proibiu os Centros de Triagem de Animais Silvestres (Cetas) de receber psitacídeos apreendidos pela fiscalização se os “donos” conseguirem comprovar a posse da ave por, no mínimo, oito anos; e ausência de maus-tratos. Caso o ‘dono’ irregular – que não adquiriu o animal em um criadouro autorizado – comprove essas exigências, a fiscalização não poderá apreender e enviar o animal para o Cetas.

A decisão favorece Roberta Leocadie Caldas Marques, esposa do ministro, que solicitou regularização da posse de um papagaio-verdadeiro no Ibama em 2008, quando morava em Recife e estava de mudança para Brasília. À época, foi elaborado termo de depósito doméstico provisório e a ave foi marcada com uma anilha aberta. Entre 2008 e 2019, o Ibama concedeu, sempre que solicitado, autorização para o transporte do papagaio entre Brasília e Recife. Segundo documentos do processo no órgão ambiental, o animal foi um presente e estava em posse da família desde 1999.

Para a Diretoria de Proteção Ambiental (Dipro), a concessão da guarda do animal e autorização de transporte foram irregulares. Por isso, em setembro deste ano, solicitou apreensão do papagaio e comunicação de crime ao Ministério Público em razão de cativeiro doméstico ilegal (artigo 29 da Lei 9.605/98). A manifestação também sugeriu que os servidores que concederam as autorizações respondessem perante a Corregedoria do Ibama por improbidade.

Em resposta, o presidente do Ibama transformou o caso particular da família do ministro do STJ em um novo entendimento da Lei de Crimes Ambientais para o caso dos psitacídeos. No despacho, Bim concedeu posse provisória de 180 dias e orientou a Dipro, a Diretoria de Uso Sustentável da Biodiversidade e Florestas (DBFLO) e a Corregedoria (Coger) para seguir o novo entendimento.

Para a Amda, o despacho do presidente do Ibama é autoritário e arbitrário. Independentemente do tempo em que o animal estiver com o dono, é fundamental que esteja abrigado em viveiro com tamanho mínimo, por exemplo. Pela experiência que tem a entidade, a soltura de papagaios que já estabeleceram ligação profunda com seres humanos tem baixíssimo êxito. A maior parte morre por não saber o que fazer. É um absurdo. Mas tempo não é o único parâmetro para não haver apreensão. A organização questiona qual será a metodologia para verificar se o animal está há oito anos com o dono e se a regulamentação define “maus tratos”.

A entidade aderiu à proposta da organização GAP Trafi (Grupo de Ação Política de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres) de questionar legalmente a medida. Para Dalce Ricas, superintendente da Amda, o despacho fere princípios básicos de administração pública, pois não tem consistência técnica. “A decisão do presidente do Ibama, por ser pontual e não parte de uma política pública, discutida com a sociedade, academia e técnicos do Ibama e de órgãos estaduais, em nada auxiliará os animais. O poder público sequer faz campanha contra o tráfico. Os livros didáticos aprovados pelo MEC, praticamente não abordam o assunto”, lembra.