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Opinião

A produção de alimentos e a perda de biodiversidade

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*Por José Eustáquio Diniz Alves

O Relatório Planeta Vivo 2020 elaborado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) mostra que o avanço do processo de crescimento contínuo da produção e consumo de bens e serviços ao bel-prazer da humanidade tem provocado uma degradação generalizada dos ecossistemas globais e gerado um ecocídio da vida selvagem que sempre existiu no planeta muito antes dos seres humanos.

Enquanto a população humana passou de 3,5 bilhões para cerca de 7,5 bilhões de habitantes, as populações de vertebrados silvestres, como mamíferos, pássaros, peixes, répteis e anfíbios, sofreram uma redução de 68% entre 1970 e 2016, com significativas diferenças regionais, conforme mostra o gráfico abaixo. A América Latina e Caribe (ALC) é a região que apresentou as maiores perdas entre 1970 e 2016.
Um quinto dos países do mundo correm o risco de colapso de seus ecossistemas devido à destruição da vida selvagem e de seus habitats naturais, de acordo com análise da seguradora Swiss Re. Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BES) incluem necessidades como fornecimento de alimentos, segurança da água e regulação da qualidade do ar, que são vitais para manter a saúde e estabilidade das comunidades e das economias.

Mais da metade (55%) do PIB global, equivalente a US$ 41,7 trilhões, depende da biodiversidade e de serviços ecossistêmicos de alto funcionamento. No entanto, um quinto dos países do Globo (20%) correm o risco de seus ecossistemas entrarem em colapso devido a um declínio na biodiversidade e serviços benéficos relacionados, segundo o Instituto Swiss Re.
Estudo de David Williams et. al., publicado na Nature (21/12/2020), mostra que o aumento da demanda mundial de alimentos, em função do crescimento populacional e do aumento da renda, especialmente em países como China e Índia, levará à perda de milhões de quilômetros quadrados de ecossistemas naturais para atender o apetite humano. Para reduzir essas ameaças é preciso conhecer com detalhes como e onde a degradação tendo sido mais grave. Os autores desenvolveram um modelo geograficamente explícito de futuro desmatamento agrícola com base nas mudanças históricas observadas e combinaram os resultados com as preferências de habitat específicas da espécie para 19.859 espécies de vertebrados terrestres. Projetaram que 87,7% dessas espécies perderão habitat para a expansão agrícola até 2050, com 1.280 espécies projetadas para perder =25% de seu habitat.

Evidentemente, a redução do crescimento demográfico global poderia mitigar o problema. Mas também políticas proativas visando mudar a forma de produção agrícola poderia reduzir as ameaças, com uma combinação de abordagens que potencialmente evitam quase todas essas perdas, ao mesmo tempo que contribuem para dietas humanas mais saudáveis. Como as metas internacionais de biodiversidade estão definidas para serem atualizadas em 2021, esses resultados destacam a importância de esforços proativos para salvaguardar a biodiversidade por meio da redução da demanda por terras agrícolas.

Observando o impacto sobre as espécies individuais em uma escala espacial detalhada, os autores foram capazes de identificar as regiões específicas, e até mesmo espécies, que provavelmente necessitarão seriamente de apoio de conservação nas próximas décadas. Sem dúvida, este é um esforço que se deve somar a outros para evitar o desastre da 6ª extinção em massa das espécies. Lembrando que o ecocídio é também um suicídio.

José Eustáquio Diniz Alves é doutor em demografia e colunista do EcoDebate

Fonte: EcoDebate