Comer 1kg de carne e “beber” sete litros de água
*Dalce Ricas
Hoje, 22 de março, é o dia mundial da água. Data usada por políticos e “tomadores de decisão” para alardearem que lutam e prezam pela proteção e uso correto deste precioso recurso, vital à vida. Mas a realidade os desmente. Basta olhar a situação dos rios no país. Há iniciativas interessantes e exitosas de recuperação de nascentes, em sua maior parte por iniciativa de comunidade, ONGs, algumas poucas prefeituras e empresas, mas é muito pouco diante da velocidade da degradação.
Políticas públicas como paralisar o desmatamento, incentivar recuperação de áreas já desmatadas para implantação de empreendimentos que tenham alternativa locacional, tratar esgotos domésticos e industriais, não ocupar margens de rios e nascentes, criar estímulos para proprietários rurais recuperarem áreas erodidas, nascentes e outras áreas importantes para proteger os rios; premiar quem preserva; rever a política agroprecuária, setor que consome mais de 90% da água no Brasil, são exemplos do que deveria ser feito para proteger a água.
A maior parte da população não faz ideia da demanda de água embutida nos produtos e serviços que consome e dos impactos sobre a mesma. Com exceção de grande parte dos rios amazônicos, ainda livres das “Belo Montes”, do garimpo e do desmatamento, as demais regiões do país continuam degradando os cursos d’água.
Estudos da USP revelam que o brasileiro come mais carne vermelha e processada do que deveria – muito mais do que a média recomendada. O que a maioria das pessoas não sabe, é que a produção de carne bovina causa impactos gigantescos sobre o meio ambiente, pois além do consumo de água, a pecuária gera mais de 50% das emissões de gases causadores das alterações climáticas, por devastar com derrubada e fogo.
Dados otimistas indicam ser necessário sete litros de água para produzir 1 kg de carne bovina, e diversos estudos demonstram que a pecuária é a principal causa do desmatamento da floresta amazônica. Assim, no voraz consumo de carne que assola o país, todo dia comemos um pedaço das florestas (e do planeta), e nos tornamos “sócios” da morte de milhares de animais silvestres, da extinção de espécies da fauna e da flora que só existem lá, da degradação dos rios e das alterações climáticas.
Durante muitos anos participamos do Copam/MG e com raras exceções, Cemig e Copasa sempre votaram favorável à concessão de licenças a empreendimentos causadores de impactos sobre a água. Curiosamente, até nas bacias que lhes fornece água, sua principal e insubstituível matéria prima.
Economizar água vai muito além de “fechar a torneira quando for escovar dentes”. Mesmo porque, o consumo de água para uso doméstico (mesmo com desperdício) representa 8% do consumo total. Mas ainda dá tempo, se quisermos, de comemorar o dia da água, deixando de ser vítimas da degradação ambiental e passando a ser sujeitos. Como? A resposta é velha: exercendo a cidadania através do voto e de outros instrumentos legais e pacíficos previstos nas democracias.
*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda.