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Opinião

Sustentabilidade e normose

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O caminho para a mudança

*Por Luana Ferreira

Muitos de nós, vivendo no mundo pandêmico, mas de privilégios, temos uma grande oportunidade de refletir sobre a nossa trajetória como cidadão ou cidadã, trabalhador ou trabalhadora e como parte da teia do globo. Essas reflexões têm despertado novas consciências, e muitas pessoas têm defendido e desejado um novo cenário pós-confinamento. Não só a gente, mas o mundo precisa de mudança: a desigualdade social, mais do que nunca, é um problema que precisa de mais protagonismos.

O meio ambiente não tem espaço nesse modelo de produção-consumo (nem a nossa saúde mental)! Então, como fazemos parte da mudança? Como a gente se conecta com a gente mesmo e consegue construir uma relação melhor com as coisas, com as pessoas e com o meio ambiente? A sustentabilidade e a normose apontam o caminho!

No mês passado, fui ao Pantanal à trabalho buscar uma experiência que me conectasse com os quatro elementos: água, terra, fogo e ar. Meu destino era uma comunidade ribeirinha que vive às margens do rio Cuiabá. Lá, mulheres nativas que há décadas se relacionam e sobrevivem do Pantanal nos esperavam para contar o que têm percebido no bioma nos últimos anos. Mais de 300 pessoas com histórias e práticas de equilíbrio entre a natureza e o homem ali habitavam. “O homem é parte daqui. Ele não é o dono”.

Essa fala é de dona Maria, dita categoricamente, como se realmente não houvesse outra forma de troca com o meio ambiente, senão a de harmonia. Por 20 anos ela é pescadora e nunca pensou em mudar de vida. Pescava, limpava, vendia por ali mesmo ou cozinhava. Porém, hoje não dá mais. “Não tem mais peixe. Planto mandioca para a gente comer. Se há dez anos eu pescava 15 peixes por dia, hoje são dois ou três quando estou com sorte”.

O Pantanal mudou. A relação do homem com o meio ambiente mudou. Queimamos, poluímos, extinguimos, brincamos, desafiamos. A cada queimada, a cada agrotóxico, a cada caça, nós desafiamos a natureza. E Dona Ana, também moradora da região, afirma: “de dinheiro a gente precisa, sim, mas aqui é mais fácil plantar e colher do que sair pra trabalhar, ganhar dinheiro e comprar comida”. Muitos moradores da comunidade pensam como dona Ana – a terra dá o que a gente precisa. Eles sabem disso e reconhecem a importância da vida que ecoa de todos os cantos do Pantanal.
“Normose” é um termo da psicologia que diz da naturalização e automatização de comportamentos que são nocivos às pessoas e à sociedade.

Ser normótico é viver uma vida tão automatizada que não cabe o questionamento para aquilo que nos adoece e entristece. Então, eu te pergunto, em que momento da humanidade a relação com o natural, com o nosso instinto primitivo, com os elementos da terra, perdeu o sentido? O que nos falta para cuidarmos da nossa casa, do ambiente que fazemos parte, de nós? Em que momento perdemos a conexão com aquilo que nos abastece de vida? Deixo um convite para reflexão.

Luana Ferreira é especialista em Responsabilidade Social e Gestão Ambiental. Fundadora da Sair do Casulo.

Fonte: O Tempo