Presidente sanciona lei sobre acesso à biodiversidade
A presidente Dilma Rousseff sancionou, nesta quarta-feira (20), com vetos, o novo Marco Legal da Biodiversidade, que define regras para acesso aos recursos da biodiversidade por pesquisadores e pela indústria e regulamenta o direito dos povos tradicionais à repartição dos benefícios pelo uso de seus conhecimentos da natureza, inclusive com a criação de um fundo específico para esse pagamento. O Marco da Biodiversidade reforça as regras criadas pela Medida Provisória 2.186-16, de 2001, que incorpora os compromissos assumidos pelo governo perante a Convenção da Diversidade Biológica (CDB), tratado internacional das Nações Unidas que regula o tema.
O objetivo do projeto é reduzir a burocracia e estimular a pesquisa e inovação com espécies nativas. No entanto, ambientalistas afirmam que o Marco privilegia empresas e amplia o acesso à biodiversidade sem proteger os povos indígenas e seus conhecimentos tradicionais. “A legislação anterior era muito ruim, tão burocrática que não gerava negócios. Mas há tantas isenções agora, que o fato de haver mais negócios não significa que as compensações crescerão da forma como deveriam”, argumenta Nurit Bensusan, assessora do Instituto Socioambiental, umas das organizações que critica o novo marco.
Para Manoel Cunha, do Conselho Nacional das Populações Extrativistas, apesar de toda “ruindade”, a nova legislação é melhor que a anterior, mas não atende aos povos tradicionais em sua totalidade. Cunha se queixa do peso maior que as empresas tiveram ao longo do processo de negociação com o governo e o Congresso. “Comemos mosca, fomos mais lentos do que as empresas. As empresas foram para dentro, colocaram todas as suas ideias e sua força política, e o governo conduziu (o processo) à luz delas”, relatou.
Um dos principais vetos da presidente está relacionado à repartição de benefícios com as comunidades tradicionais. Dilma retirou da lei um parágrafo que isentava do pagamento de royalties produtos com componentes da biodiversidade que tiveram a pesquisa, ou seja, o acesso ao patrimônio genético ou conhecimento tradicional, iniciada antes de 29 de junho de 2000, data de edição da primeira legislação sobre o tema. Com o veto, a isenção valerá apenas para quem iniciou a exploração econômica do produto acabado antes desta data e não a pesquisa.
Segundo especialistas, um dos avanços da nova lei foi descriminalizar a atividade científica. Pela legislação vigente atualmente, pesquisas feitas sem autorização do Conselho de Gestão do Patrimônio Genético eram classificadas como biopirataria. Como o processo de autorização é lento, muitos cientistas trabalhavam na ilegalidade.
Veja os principais pontos da Lei 7.735/2014 sancionados
Acesso ao patrimônio genético
Modifica a forma de solicitar autorização para explorar a biodiversidade. Antes, as empresas tinham que submeter uma documentação ao Conselho de Gestão do Patrimônio Genético (CGen) e aguardar a aprovação para iniciar os trabalhos. Agora, organizações nacionais podem fazer um cadastro simplificado pela internet.
Pagamento pela exploração
Se um produto foi criado a partir de material existente na biodiversidade brasileira, a empresa terá que repassar de 0,1% a 1% da receita líquida anual obtida com a exploração econômica. O dinheiro será destinado ao Fundo Nacional de Repartição de Benefícios.
Comunidades tradicionais
Segundo o projeto de lei, índios e povos tradicionais, como quilombolas e ribeirinhos, terão direito a participar da tomada de decisões sobre assuntos relacionados à conservação e ao uso sustentável de seus conhecimentos tradicionais. Além disso, a exploração econômica de seus conhecimentos deverá ser feita com consentimento prévio por meio de assinatura por escrito, registro audiovisual, parecer de órgão oficial competente ou adesão na forma prevista em protocolo comunitário.
Formas de pagamento
Os benefícios obtidos da exploração do conhecimento tradicional podem ser pagos em dinheiro ou em ações “não monetárias”, como investimentos em projetos de conservação, transferência de tecnologias, capacitação de recursos humanos ou uso sustentável da biodiversidade. Segundo ambientalistas, a alternativa “não monetária” pode prejudicar arrecadação de investimentos.
Isenção de pagamento
Microempresas, empresas de pequeno porte, microempreendedores individuais e cooperativas agrícolas estão isentos do pagamento pela exploração econômica do patrimônio genético de espécies encontradas no Brasil.
Isenção de infrações
Em relação às multas e condenações que foram aplicadas em razão de biopirataria, seguindo a lei anterior, todas as sanções ficam anistiadas a partir da assinatura da Medida Provisória e cumprimento do termo compromisso com a União.
Repartição de benefícios
Povos indígenas e comunidades tradicionais somente receberão a repartição de benefício quando o seu conhecimento for considerado elemento principal de agregação de valor ao produto.