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Redução de derrubada de Mata Atlântica em Minas é boa notícia, mas o desmatamento do bioma, Cerrado e Caatinga continua alto

Redução de derrubada de Mata Atlântica em Minas é boa notícia, mas o desmatamento do bioma, Cerrado e Caatinga continua alto

Em nota relativa ao dia da Mata Atlântica, a Semad/IEF divulgou diversas informações, entre elas, que a derrubada de Mata Atlântica teve queda de 57% em Minas. Mesmo considerando que o Estado, em 2023, foi vice-campeão de desmatamento do bioma, as informações são positivas e esperançosas, mas é preciso que sejam conhecidas e detalhadas. Dados percentuais não demonstram necessariamente melhoria da qualidade ambiental no Estado.

Embora o desmatamento tenha caído, as previsões são alarmantes. Linha de Tendência produzida pelo Excel a partir dos dados anuais de desmatamento aponta para aumento nos próximos anos. O desmatamento em 2023 foi 100% maior que o registrado em 2019. A perda acumulada nos últimos cinco anos equivale a aproximadamente 35 mil campos de futebol, o que representa média de sete mil campos desmatados por ano.

A matéria informa ainda, que Minas possui 1.013.862,11 hectares de área de Mata Atlântica, sendo 169.204,74 em UCs de proteção integral e 844.657,37 em UCs de uso sustentável, como Áreas de Proteção Ambiental (APAs).

Esta categoria, porém, não garante proteção da vegetação e da fauna, pois não impede que Estado e municípios autorizem empreendimentos causadores de impactos ambientais. As que têm plano de manejo são raridades. Criação de APAs pelos municípios, tornou-se “indústria” para receber ICMs ecológico no Estado. Pesquisa realizada pela Amda em 2016 constatou que a maioria são “APAs de papel” e a fiscalização pelo IEF para repasse do ICMs é insuficiente e pouco rigorosa, o que favorece municípios que não investem nada em sua proteção.

Exemplificando a fragilidade das APAs, o próprio governo estadual emitiu parecer favorável a projeto da BrasilAgro que previa desmatar quase 12.000 ha de Cerrado, na APA Estadual Cochá Gibão, localizada no norte do Estado, em área considerada prioritária para conservação, por ato do Copam – Conselho Estadual de Política Ambiental. Felizmente, a empresa desistiu do empreendimento, diante da resistência de instituições da sociedade civil. 

Outro exemplo, é o caso da APA Estadual do Alto Mucuri, que de acordo com dados do Atlas da SOS Mata Atlântica, foi a segunda unidade de conservação do país que mais perdeu Mata Atlântica no período 2022-2023, correspondendo a 123 hectares.

Como esses dois casos, muitos outros comprovam a fragilidade das UCs de uso sustentável em Minas. Computá-las no cálculo de áreas de Mata Atlântica protegidas pode levar a interpretações não realistas. E mesmo nas UCs de proteção integral correm sérios riscos, devido à estagnação no processo de regularização fundiária (aquisição de terras particulares no interior dessas UCs) e outros fatores. O Parque do Rio Doce, por exemplo, a maior área de Mata Atlântica legalmente protegida no Estado, já perdeu significativas áreas do bioma em sua Zona de Amortecimento por invasões urbanas, de onde se originam a maior parte dos incêndios que o ameaçam anualmente.

Na nota da Semad, consta ainda, aquisição de três glebas em UCs estaduais, totalizando 50,3 hectares, que pode ser considerado insignificante diante dos milhares de hectares que precisam ainda ser regularizados.

Apesar da queda do desmatamento na Mata Atlântica no Estado, o montante da área desmatada continua elevado e provocando riscos à integridade de seus ecossistemas. De acordo com dados do Prodes do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no período de 2020 a 2022 mais de 80 mil ha do bioma (mais que o dobro do Parque Rio Doce) foram destruídos.

Outro ponto preocupante envolve as disjunções (fragmentos de Mata Atlântica presentes em outros biomas) do bioma Estado. A Amda tem acompanhado casos de autorização de desmate em locais circundados por áreas previamente desmatadas, nas quais os empreendimentos poderiam ser instalados. Dados do SAD Mata Atlântica apontam aumento no desmatamento dessas áreas no Cerrado e na Caatinga. De acordo com essa base de dados, em 2023, foram desmatados mais de nove mil ha.

A matéria ressalta ainda que Minas Gerais já cumpriu mais de 11% da sua meta do Tratado da Mata Atlântica, que prevê plantio de sete milhões de mudas de espécies nativas do bioma até final de 2026 e informa que entre novembro de 2023 e abril de 2024, “foram contabilizados o plantio de 776 mil mudas de espécies nativas do bioma”.

Reconhecemos que plantio é ação importante para restauração do bioma. Para que isto ocorra, porém, é preciso observar parâmetros essenciais de “como e onde plantar”. Conectar fragmentos isolados de Mata Atlântica e unidades de conservação, que estão incluídos no percentual divulgado pela Semad/IEF é talvez o principal. Plantios isolados pouco contribuem para o objetivo declarado.

Outro parâmetro essencial é mantê-los. Colocar mudas no chão é apenas o primeiro passo. Para que formem florestas é preciso impedir pisoteio de gado, controlar capim e espécies arbustivas que podem sufocar as mudas e tomar medidas para prevenir e combater incêndios e caçadores. E este acompanhamento deve ocorrer por no mínimo quatro anos.

Nos parece que plantios decorrentes do licenciamento e de outros programas carecem de monitoramento “in loco” pela Feam ou IEF, o que permite que empreendedores recorram à “maquiagem verde”, plantando mudas muito pequenas, por exemplo, que não conseguem suportar o período de seca ou simplesmente não dando manutenção. 

Tiram fotos, enviam ao órgão ambiental e fica por isto mesmo. É público que o Estado não tem técnicos suficientes para tanto. E talvez nem seja necessário, considerando os recursos eletrônicos disponíveis e fiscalização por amostragem, com cassação da licença quando confirmado descumprimento da condicionante ou compensação. 

Nesse contexto, é fundamental que haja compilação e publicização de dados geográficos contendo os limites das áreas onde isso está ocorrendo, para que seja possível validação e monitoramento por parte do governo e da sociedade civil. A Amda solicitou à Semad/IEF informar os polígonos dos plantios, mas a resposta foi de que não existem e indicou alguns caminhos em seu site para visualizar informações. Confirmamos, porém, que citam número de mudas plantadas, sem informações dos locais e sobre qualidade dos plantios

Percentual de áreas naturais no Estado

Segundo a nota da Semad, o território mineiro tem ainda 32% de sua área coberta por vegetação natural.  Embora seja um dado importante, não reflete, porém, a qualidade ambiental dessas áreas. Parte expressiva é constituída por pequenos fragmentos, isolados geograficamente e biologicamente muito empobrecidos pela ação humana (principalmente incêndios, retirada de madeira, caça, uso de pesticidas, etc.). Além disto, o empobrecimento da fauna tem sido destacado por pesquisadores como forte fator de degradação da vegetação, já que animais e plantas possuem relação de interdependência fundamental à manutenção da diversidade vida natural nessas áreas. 

O percentual divulgado inclui áreas em processo de regeneração, que podem ter qualidade ambiental irrisória. Obviamente o dado não deixa de ser importante, mas para que reflita qualidade ambiental que pressupõe efetiva prestação de serviços ecossistêmicos como regulação de clima, fixação de carbono, proteção e respeito à fauna, produção de água e proteção da água, é preciso um Plano de Proteção dos Biomas mineiros que paralise o desmatamento. E que este Plano tem de ser Política de Governo, envolvendo obrigatoriamente instituições chaves como Seapa e Seplag.

Nesse sentido nunca é demais lembrar que a agropecuária, apontada pelo próprio IEF como a atividade que mais desmata no Estado, deveria ser direcionada e incentivada a recuperar e ocupar os milhares de hectares de terras abandonadas ou subutilizadas, ao invés de desmatar.

Imprescindível lembrar que o Estado, de forma geral, não recompensa quem preserva e premia quem destruiu. Gastos com criação e manutenção de RPPNs, citadas na nota da Semad como exemplo de proteção ambiental, são integralmente bancados pelos proprietários, que sofrem com invasão de caçadores e traficantes. Nem mesmo para combater incêndios contam com o poder público, pois brigadas do IEF são proibidas por normas legais de fazê-lo.

Ação do IEF que busca conservar, ampliar e consolidar áreas de vegetação nativa e recuperar as áreas degradadas ou alteradas é outro destaque. Segundo a matéria, em 2023, foram destinadas à conservação/recuperação 24.169,71 ha, enquanto em 2022, foi de 17.579,69 ha, o que representa aumento de 37%. Nesse cômputo estão contempladas áreas de reserva legal, as compensações e reservas legais aprovadas nos processos de intervenção ambiental.

Não há explicação sobre o que são “áreas destinadas à Conservação/recuperação”. Proteger ou recuperar Reservas Legais, no entanto, não adicionam novos fatos à restauração da vegetação nativa e combate a emissões de gás carbônico, pois são exigência legal.

Cerrado

No que se refere à queda do desmatamento de 12% no Cerrado em 2023, dado divulgado pela Semad em 29 de novembro de 2023, a informação conflita com o que foi divulgado pelo MapBiomas Alerta, ferramenta dedicada a identificar e refinar áreas desmatadas, utilizando como base os alertas de desmatamento fornecidos por diversos sistemas de monitoramento a área desmatada em Minas Gerais. 

A informação é que 2023 foi o pior ano da série histórica: quase 100% maior em comparação a 2019, o primeiro ano de medição. Em comparação com o ano anterior, 2022, o aumento foi de 50%. Em 2019, foram derrubados 37.004,59. Em 2020, 32.171,70 e em 2023, 62.389,68.

*Documento produzido pela equipe técnica da Amda.