Opinião

Após três anos e inúmeras denúncias, Semad revoga licença para exploração de ouro no leito do Rio das Velhas

*Dalce Ricas

A empresa Rio Preserv Ltda., com sede no Rio de Janeiro, conseguiu em 2020, licença ambiental simplificada/LAS da Semad, para extrair ouro no leito do rio das Velhas, durante 10 anos, antes da captação de Bela Fama. O empreendimento foi classificado como de “baixo impacto ambiental”. A licença autorizou uso de duas balsas, mas matérias publicadas na imprensa, informam presença de sete.

A extração do cascalho aurífero, depositado no fundo do rio, é feita por sucção de bombas movidas a combustível fóssil. Chama atenção, uma frase do parecer da Semad: “Quanto aos impactos ambientais a serem gerados pela atividade, foram citados a geração de efluentes e resíduos sanitários, de emissões atmosféricas e de resíduos sólidos”. Nada sobre fauna, flora, impactos no rio e na qualidade de sua água.

Mineração em leitos de cursos d’água traz consigo impactos ambientais gravíssimos. O revolvimento pela dragagem turva a água e levanta sedimentos que descem rio abaixo. Neste caso, em direção à captação da Copasa. Dependendo do grau de turbidez, pode haver mortandade de peixes e outros componentes da biota aquática. O barulho constante afugenta e prejudica a fauna.

No parecer consta que a empresa informou “que a instalação está distante de núcleos residenciais”. Mas diz ao mesmo tempo, que há residências a menos de 50 metros do local, e foi solicitado ao empreendedor apresentação de medidas de mitigação dos ruídos causados pela draga.

Em resposta, a empresa informou que realizará monitoramento dos ruídos no píer e no escritório, e fará manutenção das bombas. Mas o monitoramento deveria ser realizado nas casas e o parecer deveria prever no mínimo, que não sendo compatíveis com o bem estar de seus ocupantes, a empresa deveria compra-las ou não obter a licença! Quanto à manutenção das bombas como medida mitigatória ao barulho, chega a ser engraçado, pois além de não resolver o problema, manutenção é interesse da empresa e não favor aos moradores.

A empresa prestou informação falsa, não informou medida mitigadora solicitada e mesmo assim a licença foi concedida, caracterizando mais uma vez a tolerância pensada do governo a empreendimentos econômicos, em detrimento do meio ambiente e da qualidade de vida. Como o empreendimento foi enquadrado na Classe 2, não foram feitos estudos ambientais, a licença não foi submetida ao Copam, que teoricamente conta com participação da sociedade e não há incidência de compensação. A empresa fica com o lucro e a sociedade e o meio ambiente com o prejuízo. Em 16 de setembro, após três anos, a Semad revogou a licença.

Rios deveriam ser considerados sagrados por serem essenciais à vida. O maior mercado do ouro é fabricação de joias, produto que não pode ser considerado como essencial à sociedade. Paradoxalmente a Semad está elaborando Plano de Segurança Hídrica da RMBH. Para quê, se autoriza degradar as fontes de água?

*Dalce Ricas é superintendente da Amda.