Opinião

Relembrando os casos da Heineken, BrasilAgro e agora, Parque Eólico

*Dalce Ricas

Desde os primórdios da luta ambientalista no Brasil, ouvimos falas como “essas ONGs são contra tudo”; querem é “impedir o desenvolvimento”. Os casos Heineken e BrasilAgro provavelmente são utilizados como exemplo disto nas rodas de conversa de políticos e empresários. São “rótulos” levianos e superficiais, por parte de quem continua considerando que o respeito ao meio ambiente atrapalha o que chamam “de desenvolvimento”.

Em nenhum momento, a Amda e outras instituições disseram ser contra a instalação da fábrica da Heineken. Questionaram sim, o local de instalação, e diante das denúncias e críticas, ela decidiu se instalar em Passos. Poderia até ficar em Pedro Leopoldo, em local onde os impactos poderiam ser minimizados.

A Semad classificou o empreendimento como de médio impacto ambiental, desconsiderando o gigantesco potencial de impactos resultantes da inevitável atração de populações para seu entorno, que significa tragédia anunciada: lixo, aumento da demanda por água, desmatamentos, processos erosivos, ataque da especulação imobiliária e vandalismo ao patrimônio espeleológico.

E nem sobre o aquífero: 50 m³/h seriam captados no Ribeirão da Mata e 310 m³/h de dois poços artesianos. A APA Carste é caracterizada pela presença de centenas de cavernas, “verdadeiro queijo suíço”. Por isto, pesquisadores alertaram insistentemente que a retirada de água do subsolo poderia implicar no rebatimento do mesmo. O gerente da APA, Antônio Calazans, lembrou que a Heineken previa uso de 360 m³/h durante 24 horas, 365 dias por ano, o que equivale ao consumo de mais de 37.200 pessoas.

O caso do gigantesco empreendimento agropecuário da BrasilAgro na árida região Norte de Minas, que também desistiu, não foi muito diferente. Seriam derrubados 11.820 ha de Cerrado, grande parte na Zona de Amortecimento do Parque Veredas do Peruaçu, o que causaria grandes e irreversíveis impactos ao solo, biodiversidade e sobrevivência de comunidades humanas extrativistas. Nem mesmo a presença do cachorro-do-mato-vinagre e onças-pintadas, altamente ameaçados de extinção, e a escassez de água foram aceitos pela Semad, pelo menos para exigir estudos ambientais consequentes. Opor-se a um empreendimento insustentável é ser contra o desenvolvimento?

E agora estamos diante de outro dilema: a Semad concedeu licença simplificada para instalação de Parque Eólico na Serra do Espinhaço, no alto do Pico da Formosa (altitude = 1820 m), em Monte Azul, Santo Antônio do Retiro e Espinosa.

Nós ambientalistas sempre criticamos os barramentos de rios e usinas térmicas movidas a carvão mineral pelos violentos impactos ambientais, defendendo e cobrando geração por energia eólica e solar. Mas isto não quer dizer que sejam fontes de energia cem por cento limpas, e possam ser instaladas em qualquer lugar, sem causar impactos. Para subir com as gigantescas pás dos “cata ventos”, seriam abertas estradas com mais de nove mts de largura, derrubando vegetação, afugentando ou matando animais na construção e posteriormente por atropelamento e facilitação de captura e caça, além de coleta de orquídeas e bromélias. O local é extremamente frágil, por abrigar campos rupestres onde ocorrem espécies raras e ameaçadas de extinção.

Não faltam montanhas em Minas, em locais já antropizados para a bem vinda e desejada instalação de parques eólicos. Mas infelizmente mergulhamos em outro confronto que seria desnecessário, se o Estado tivesse realmente uma política ambiental pautada na busca da sustentabilidade, mais transparência, abertura ao diálogo e apreço pelo que diz a sociedade.

*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda.