Opinião

Oportunidades Amazônicas

*Márcio Santilli

Na última sexta-feira (21), o presidente Lula e o ministro da Justiça, Flávio Dino, anunciaram um pacote de medidas sobre segurança pública.

Entre elas, a edição de um decreto instituindo o Plano Amazônia: Segurança e Soberania (“Plano AMAS”), que prevê investir R$ 2 bilhões para estruturar uma rede de bases de vigilância e fiscalização, fixas e móveis, capaz de assegurar a presença mais efetiva do estado em regiões hoje dominadas pela economia predatória e pelo narcotráfico.

Manaus estará no epicentro do Plano e sediará a Companhia de Operações Ambientais da Força Nacional de Segurança, além de um centro de cooperação policial para articular a atuação das polícias dos países amazônicos.

Essas medidas também facilitarão a coordenação de ações entre a Polícia Federal e as Forças Armadas, dotadas de poder de polícia na faixa de fronteira, além das polícias estaduais. Espera-se que ajudem a reverter o alto nível de criminalidade da região.

COP-30
A confirmação de Belém como sede da COP-30, a reunião da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre mudanças climáticas globais, em novembro de 2025, desencadeou investimentos na cidade, tanto privados, para ampliar a oferta de hotéis e de serviços associados, quanto públicos, como os anunciados por Lula e pelo governador Helder Barbalho para o Projeto Porto Futuro, de revitalização de uma extensa área no centro da cidade.

A COP-30 será o maior evento diplomático da história da Amazônia, com a presença de dezenas de chefes de estado. Também será a primeira reunião da ONU nessa região tão relevante para a discussão climática.

Porém, enquanto oportunidade, a COP-30 vai muito além de Belém, seu epicentro, e das fronteiras do Pará. A Amazônia como um todo estará no foco das atenções dos cientistas, dos investidores e dos governantes. O que mais interessa é a articulação de projetos que possam ir muito além do evento.

Infra & CIA
Com outras mãos, o governo federal vai anunciar, logo mais, a nova versão do PAC, pacote que reúne obras e projetos prioritários nas áreas de transportes, energia e mineração.

O novo pacote, que é de âmbito nacional, poderá incluir projetos com relevante impacto na Amazônia, como a construção da Ferrogrão no eixo da BR-163, a extensão até Boa Vista do linhão de Tucuruí, o asfaltamento da BR-319, a exploração de potássio no baixo Madeira e de petróleo na foz do Amazonas, entre outros.

São projetos de naturezas diferentes, em regiões diferentes e riscos diferentes de impactos socioambientais. Porém, a sua implantação tem implicações relevantes e potencialmente contraditórias com a agenda climática anteriormente tratada.

A redução, nos últimos seis meses, dos alertas de desmatamento na Amazônia emitidos pelo Inpe, dá força moral ao presidente Lula para alegar que manterá essa tendência mesmo executando alguns desses grandes projetos.

Pode até ser que eles absorvam parte da mão de obra refém de atividades ilegais, mas o histórico de projetos similares na região, inclusive nos seus mandatos anteriores, confirma a tradição de subestimar danos e superestimar benefícios.

Lé com cré
Ocorre que a viabilidade e o ritmo de execução desses projetos depende de investimentos privados, internos e externos, além de investimentos públicos. Eles terão que ser convincentes para além do custo-benefício da obra. Agentes econômicos relevantes já não podem se dar ao luxo de danos reputacionais em escala amazônica.

Esses projetos teriam que estar inseridos em estratégias de desenvolvimento regional sustentável, ainda não formuladas.

Por outro lado, embora líderes importantes como o governador do Pará tenham percebido o cenário de oportunidades que se abre, grande parte da elite política regional continua submissa aos interesses da velha economia predatória.

No Congresso, a numerosa bancada do atraso insiste em medidas para fragilizar a política ambiental, facilitar a grilagem de terras públicas, acabar com o licenciamento ambiental de obras e impedir a demarcação de terras indígenas.

Somos um mar de contradições, com corais e petróleo. Temos um presidente experiente, bom de corda-bamba. Mas o tempo corre contra nós. O clima muda contra nós, mais rápido do que mudamos nós.

Assim mesmo, mais e mais pessoas, comunidades e instituições amazônicas vão perceber que, aproveitando as eventuais oportunidades, poderão viver melhor, ou menos pior, nesse cenário de agruras inevitáveis.

* Márcio Santilli é filósofo, sócio-fundador do Instituto Socioambiental (ISA). Autor do livro Subvertendo a gramática e outras crônicas socioambientais. Deputado federal pelo PMDB (1983-1987) e presidente da Funai de 1995 a 1996.

Fonte: Mídia Ninja