Opinião

Relatório Planeta Vivo 2022 e o declínio da biodiversidade

*José Eustáquio Diniz Alves

A perda da biodiversidade pode chegar a um ponto de não retorno, indo em direção a uma Terra praticamente inabitável
“É triste pensar que a natureza fala e que a humanidade não a ouve”- Victor Hugo 1802-1885

O Relatório Planeta Vivo 2022, divulgado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF), em 14 outubro de 2022, mostra que o crescimento das atividades antrópicas tem provocado uma degradação generalizada dos ecossistemas globais e gerado um ecocídio da vida selvagem do planeta: as populações de vertebrados silvestres, como mamíferos, pássaros, peixes, répteis e anfíbios, sofreram uma redução de 69% entre 1970 e 2018.

O relatório da WWF é baseado no acompanhamento de 31.821 populações de 5.230 espécies, utilizando câmeras, análise de pegadas, programas de investigação e ciências participativas. Da vida marinha às florestas tropicais, da abundância de pássaros, peixes, anfíbios e répteis – toda a riqueza da vida selvagem – está em queda livre, diminuindo em média mais de dois terços nos últimos 50 anos, como mostrado no gráfico abaixo.

Enquanto isto os humanos continuam a se avolumar e a desmatar florestas, consumindo além dos limites do planeta e poluindo em escala agropecuária e industrial.

Existe uma grande desigualdade entre as espécies da Terra, pois concomitantemente ao crescimento da população humana, as populações não humanas definham. Segundo Ron Patterson (2014): “Há 10.000 anos os seres humanos e seus animais representavam menos de um décimo de um por cento da biomassa dos vertebrados da terra.

Agora, eles são 97 por cento”. A jornalista Elizabeth Kolbert, no livro The Sixth Extinction, documenta o processo de extinção das espécies que ocorre com o avanço da civilização.

Em sua 14ª edição, o Relatório Planeta Vivo revela que as regiões tropicais são as mais afetadas pela perda de biodiversidade. A situação é crítica na América Latina e Caribe, onde as populações monitoradas encolheram, em média, 94% em meio século.

Na América do Norte, Europa e Ásia Central, o índice de perda de biodiversidade foi menor, cerca de 20%. Na África a taxa foi de 66% e na região da Oceania e do Pacífico Asiático o índice foi de 55%, conforme mostram os gráficos abaixo.

No Brasil, as maiores perdas de biodiversidade e as espécies mais afetadas são as onças-pintadas, corais, botos amazônicos e tatus-bola. Somente os botos cor-de-rosa tiveram uma queda de 65% entre 1994 e 2016 na Reserva de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá, no estado do Amazonas. Segundo o relatório, estes animais estão sofrendo com a captura não intencional em redes e pela contaminação por mercúrio espelhado pelo garimpo ilegal.

Na atual trajetória de extinção das espécies, a perda da biodiversidade pode chegar a um ponto de não retorno, indo em direção a uma Terra praticamente inabitável, pois o avanço do progresso humano está esbarrando em duas barreiras, que são as mudanças climáticas e o ecocídio.

A ideia utópica de uma harmonia entre o crescimento da população desenvolvimento está se transformando em uma distopia, pois o desenvolvimento sustentável está se transformando em um oximoro.

A nova edição do relatório Planeta Vivo confirma que a Terra está em meio a duas crises: climática e da biodiversidade. Sem dúvida, a humanidade tem pouco tempo evitar uma situação catastrófica.

*José Eustáquio Diniz Alves possui graduação em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG (1980), mestrado em Economia (1983), doutorado em Demografia pelo CEDEPLAR-UFMG (1994) e pós-doutorado pelo Nepo/Unicamp.

Fonte: EcoDebate