Opinião

Bolsonaro sumiu, mas deixou desmatadores e golpistas no piloto automático

*Leonardo Sakamoto

Permissão para criminosos usarem o final do governo para fazerem o que desejarem vai atrasar a reconstrução do país.

Desde que perdeu a eleição para Lula, Bolsonaro está desaparecido, talvez picotando documentos, apagando HDs, renovando o passaporte ou analisando formas de não responder pelos crimes que cometeu quando deixar o poder. Isso passa a impressão de que o petista já está governando em seu lugar, o que é um grande equívoco. Desmatadores e golpistas continuam tocando o projeto bolsonarista em meio ao silêncio presidencial e aos meses de transição.

Tudo o que Lula falou na COP27, no Egito, sobre Amazônia, meio ambiente e prioridade para mudanças climáticas, vai valer apenas a partir de 2023. Por enquanto, grileiros, madeireiros, garimpeiros e fazendeiros criminosos, aliados do presidente, aproveitam os meses que restam de fiscalização frouxa e inexistência de cobrança de multas para destruir o presente e o futuro.

Indicador disso é que, após o pior mês de setembro da série histórica que começou em 2015, os alertas de desmatamento tiveram o pior outubro, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) – aquela instituição que Bolsonaro espancou publicamente por divulgar, veja só, fatos.

Jair atua em duas frentes desde 2018: a) excita seus seguidores para defendê-lo e b) desconstrói o país que emergiu da Constituição Federal de 1988 deixando de fiscalizar o cumprimento da lei ou alterando-a.

Desde o início de seu mandato, Jair Bolsonaro enfraqueceu instituições de fiscalização, como o Ibama, o ICMBio, a Funai e o Incra, mas também a Receita Federal, a Polícia Rodoviária Federal, o Coaf, setores da Polícia Federal. Com isso, criou problemas para verificar o cumprimento das leis de proteção aos direitos sociais, culturais, econômicos, ambientais. Passou a vigorar a lei do mais forte, ou melhor, do mais armado.

Caso exemplar dessa política bolsonarista em que o certo se torna errado e o errado vira o certo foi a punição a Alexandre Saraiva, delegado da Polícia Federal responsável pela maior apreensão de toras de madeira da história. Após encaminhar uma notícia-crime ao Supremo Tribunal Federal contra o então ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por ele ter dificultado o trabalho da fiscalização e defendido interesse dos criminosos, Saraiva foi transferido da Amazônia para o interior do Rio.

E tendo dado corda ao longo de quatro anos na extrema direita, agora ela anda e fala sozinha – pedindo golpe de Estado na porta de quartéis, perseguindo jornalistas, professores e ministros do Supremo, destilando violência gratuita nas ruas.

Levado a viver em uma realidade paralela, em que vacinas contra covid-19 matam ou injetam chips 5G programados por chineses e por bilionários pedófilos para dominar o mundo e na qual urnas eletrônicas foram manipuladas para dar a vitória a Lula através de algoritmos chancelados em uma reunião em uma pizzaria de Nova York com Alexandre de Moraes, Mark Zuckerberg, António Guterres e Tony Stark, muitos não precisam mais da orientação do “mito”. Vão à luta, encarando o autoritarismo que pregam como liberdade.

O Brasil está sim no piloto automático, mas avançando em direção ao abismo. E a permissão para que seguidores e aliados criminosos do presidente aproveitem os últimos meses do governo para fazerem o que desejarem vai atrasar, e muito, a reconstrução do país nos próximos anos.

*Leonardo Sakamoto é jornalista, cientista político, professor na PUC-SP, diretor da Repórter Brasil e colunista do UOLNoticias.

Fonte: Brasil de Fato