O desmonte geral da política ambiental brasileira e seus reflexos
* Berenice Gehlen Adams
O desmonte geral das políticas públicas ambientais no Brasil tem impressionado a todos os envolvidos na busca de soluções para os graves problemas ambientais enfrentados nas mais diferentes esferas.
A explicação para este esvaziamento de tantos órgãos – tanto governamentais quanto da sociedade civil – e de entidades que se dedicam ao meio ambiente e a educação ambiental, é evidente em diversas referências. As razões são claras, e a principal delas é a de que, para o atual governo, o meio ambiente nada mais é do que um enorme “armazém de mercadorias”, como já dizia o saudoso jornalista e ambientalista Vilmar Berna, lá nos anos oitenta.
Todo este desmonte serve para promover o crescimento econômico à custa da destruição da natureza, evidenciando uma visão arcaica e predatória, que ignora o meio ambiente como totalidade da vida.
Algumas lives e matérias que tratam deste assunto apontam a dramática situação da Política Ambiental que vivenciamos.
Um dos programas do Roda de Conversa em Educação Ambiental do PPGEA/FURG, que tratou sobre o desmonte da política ambiental no Brasil, com a presença de Elisabeth Uema, Carlos Alberto Seifert Jr., com a mediação da Profa. Dione Kitzmann, foi bastante esclarecedor.
Carlos Alberto Seifert Junior, Oceanólogo, Mestre em Gerenciamento Costeiro pela FURG, Doutor em Políticas Públicas pela UFRGS, militante ambientalista e pesquisador, destaca que: “Se a dificuldade de se obter um consenso social era grande, após o [atual governo] os efeitos são desastrosos. Minimamente aspectos que a gente tinha conquistado, em termos de democracia participativa, eles foram profundamente reduzidos.
Há dificuldade em se projetar a totalidade dos efeitos futuros [de todo esse desmonte], e este é o grande desafio que a gente tem. Entre outras, a crise da cidadania, por trás desses aspectos, e a retirada da população do protagonismo na condução dessas políticas.
Então, no fundo, no fundo, o grande desafio que a gente tem hoje nas políticas ambientais é o de resguardar a democracia, de retomar o processo de ampliação do debate, e mais do que retomar, tornar ele mais amplo e mais horizontal possível […], defender as instituições democráticas e os mecanismos participativos que a gente dispõe com relação a democracia” […]
Seifert aponta, também, que “os efeitos dos desmontes da política não se dão de maneira imediata. Até porque a reconstrução das políticas é um processo de médio e longo prazo. […] A gente precisa ter um mecanismo de resistência, na escala local, muito claro. E é essa resistência na escala local, essa organização, que são as redes, cidadãos, cidadãs, instituições, é o que pode determinar uma pressão para uma mudança de política de fato.”
A servidora do Ibama, Elisabeth Uema, aposentada e ainda atuando com outras entidades preocupadas com a situação, coloca que: “Essa crise, com este governo, nos obrigou a nos organizar para fazer frente a tudo isso: a reforma administrativa e ao desmonte dos órgãos ambientais, e a questão que a gente está vendo é que os órgãos ambientais estão morrendo a míngua”.
Em relação às políticas públicas de Educação Ambiental, o descaso não é menos assustador.
Em um ciclo de palestras na Escola do Legislativo, a professora-doutora Maria Guiomar Thomaziello fez um alerta sobre o desmonte da Educação Ambiental no País: “Há um desmonte completo no setor de Educação Ambiental desde 2019, com o início da atual administração do governo federal”.
Ela apontou com detalhes que desde o início do atual governo federal – 2019 -, “foram extintos setores ligados à Educação Ambiental nos Ministérios da Educação e do Meio Ambiente, tendo sido encerradas as atividades do órgão gestor do PNEA (Programa Nacional de Educação Ambiental) […] Há um desmonte total das políticas ambientais do Brasil, algumas áreas sumiram dos ministérios e foram parar em outros ministérios que não têm condição de fazer aquela atividade, simplesmente sumiram.”
Outro aspecto que precisa ser destacado, neste contexto, é o de que uma análise realizada pelo Observatório do Clima mostrou que a proposta orçamentária para 2021, para o Meio Ambiente, é “a mais baixa do século para a pasta”. O relatório mostra, também, que “as promessas feitas pelo atual presidente na campanha eleitoral de 2018 — de acabar com o ativismo ambiental e fechar o MMA — estão sendo cumpridas à risca”, como aponta os itens destacados da matéria:
– Redução de 27,4% no orçamento para fiscalização ambiental e combate a incêndios florestais, considerando Ibama e Instituto Chico Mendes.
– Desmonte das estruturas de proteção socioambiental do Estado brasileiro, eliminando regulamentações e abdicando da gestão ambiental.
– Corte de recursos se soma a medidas como a flexibilização do controle da exportação de madeira, o loteamento de cargos nos órgãos ambientais com policiais militares e a proposta de extinção do Instituto Chico Mendes.
– A pauta ambiental e climática no Brasil sofreu retrocessos inimagináveis e em escala assustadora.
– Adotou a destruição do meio ambiente como política e sabotou os instrumentos de proteção dos nossos biomas, sendo responsável diretamente pelo aumento das queimadas, do desmatamento e das emissões nacionais.
– O governo federal, que é quem poderia trabalhar soluções para esse cenário, hoje é o foco do problema.
– O Ibama está fragilizado e deslegitimado.
Em matéria veiculada pelo Ecoa Uol, da jornalista Mariana Belmont, a coordenadora do Sinal de Fumaça Rebeca Lerer avalia que as medidas adotadas pelo atual governo, se configuram como um retrocesso de 30 anos na governança socioambiental brasileira, que vinha sendo duramente construída a partir da Constituição de 1988.
E, para encerrar este triste e pequeno levantamento, aponta-se que, em matéria veiculada no ClimaInfo, a relação desse desmonte da política ambiental brasileira com o agronegócio “tem aproveitado o dólar nas alturas e a retomada da demanda por produtos primários no exterior para exportar Deus-e-o-Mundo para Deus-e-o-Mundo.
O problema é que a bonança do agro tem sido facilitada pelo desmonte da política ambiental promovido pelo atual governo, de tal maneira que o setor está colecionando lucros e socializando mais e mais custos ambientais com todos os brasileiros, especialmente aqueles mais pobres e vulneráveis”.
A matéria finaliza com um recado: “Para a turma que ainda acha que essa economia predatória é o caminho para o progresso econômico do Brasil, Ricardo Abramovay tem uma péssima notícia. A crise climática e a escassez de recursos naturais estão forçando um redesenho de processos econômicos mundo afora, o que se reflete em exigências cada vez mais rígidas quanto ao impacto ambiental das empresas e seus produtos e serviços”.
* Berenice Gehlen Adams, é pedagoga, especialista em Educação Ambiental, editora responsável da revista Educação Ambiental em Ação e diretora da Apoema Cultura Ambiental.
Fonte: Eco Debate