Lotear o ICMBio é atentado contra o Brasil
*Maria Tereza Jorge Pádua
O maior patrimônio do país, gerido pelo governo brasileiro, está sendo leiloado para e por politiqueiros de última hora. Falo do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, mais conhecido como SNUC, que está sob a gestão do ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade). Apesar de ser um órgão pequeno em termos de pessoal e de orçamento, é o responsável legal por manejar cerca de 330 unidades de conservação de distintas categorias, que somam mais de 10% da nossa extensão territorial. Acrescente-se aí as unidades de conservação marinhas federais, geridas em conjunto com a Marinha.
Poucos têm a real dimensão do que significa administrar essas grandes extensões de terra, estabelecidas para a conservação da natureza, da nossa enorme biodiversidade, de recursos hídricos, ou de locais de extraordinária beleza cênica.
Quem primeiro propôs um Parque Nacional no país, em 1876, foi André Rebouças, nosso mulato abolicionista. Tratava-se da Ilha do Bananal, Araguaia, que já está profundamente degradada.
Desde o estabelecimento do primeiro Parque Nacional do Brasil, o de Itatiaia, em 1937, seguido do Iguaçu, proposto por Santos Dumont, e depois Serra dos Órgãos em 1939, o país assistiu ao longo dos anos a criação de mais de 70 parques nacionais, além de outros tipos de unidades de conservação em nível nacional, estadual e municipal.
Elas seguem a duras penas, enfrentando problemas como o fato de que mais de 60% das nossas áreas protegidas ainda estão nas mãos de proprietários particulares, dado o atraso no processo de sua regularização fundiária. Nossos políticos nos tornaram campeões em reduções de Parques Nacionais e outras áreas protegidas, ou de mudança de categorias mais restritas para as mais flexíveis.
Mas, mesmo capengas, perdendo áreas e biodiversidade, a missão das unidades de conservação e do sistema legal que as protege continua primordial. Em boa parte, porque os heróis do ICMBio e dos órgãos que o antecederam conseguiram preservar muito do nosso maior tesouro nacional.
No entanto, o momento é de perigo agudo, pois querem que o órgão seja rifado e loteado na politicagem inconsequente de um ano eleitoral.
Nunca foi tão grande o risco de deixar que analfabetos em conservação sejam os responsáveis por guardar para a nação e para o planeta, o que eles não podem sequer compreender a importância ou necessidade.
Decisões erradas sobre conservação são com frequência irreversíveis. Deixar que o ICMBio seja desfigurado é dar mais uma prova de que nossa espécie é suicida.
Ao contrário de sucumbir à politicagem, para viver bem e garantir a vida da nossa espécie, precisamos dos serviços ambientais que a nossa Natureza oferece.
Nessa emergência, deixo aqui meus parabéns e agradecimentos aos indivíduos em ONGs e na sociedade civil que estão vigiando e lutando para que os políticos freiem seus instintos e preservem nosso Sistema Nacional de Unidades de Conservação.
*Maria Tereza Jorge Pádua é engenheira agrônoma, membro do Conselho da Associação O Eco, membro do Conselho da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza e da comissão mundial de Parques Nacionais da UICN
Fonte: O Eco