Opinião

Governo Temer quer destruir as conquistas ambientais

*Reinaldo Canto

Nuvens carregadas tomaram conta do céu de Brasília e de lá se espalham pelo resto do país de maneira persistente, sem trégua. Não me refiro apenas ao cenário político e denúncias que atingem os nossos atuais governantes ou do assustador desmonte das leis trabalhistas e da Previdência Social.

Quero alertar para a completa destruição da legislação ambiental brasileira, que está na mira dos setores mais conservadores que hoje dão as cartas no Planalto Central, seja nos Ministérios, seja no Congresso Nacional.

São ministros que atacam as próprias pastas que representam e parlamentares cujas mais importantes ações estão centradas em suprimir direitos de minorias e avançar sobre áreas ambientais protegidas há muitos anos.

Segundo carta publicada pelo Observatório do Clima, Nenhum hectare a menos!, vivemos "talvez a maior ofensiva antiambiental desde a elaboração da Constituição de 1988". O documento também deixa claro que os retrocessos em curso no governo e no Congresso colocam em risco as metas climáticas assinadas por Temer e que fazem parte do Acordo de Paris ratificado pelo Brasil.

Para ficar em alguns exemplos, a redução em mais de 1,1 milhão de hectares das unidades de Conservação aprovada por comissões no Congresso ataca diretamente as florestas brasileiras e representa um incentivo brutal à grilagem e ao desmatamento sem limites.

Outro caso emblemático é o enfraquecimento do licenciamento ambiental (PL 3.729/2004 – Lei Geral de Licenciamento). Temos outros tristes exemplos de terra arrasada, literalmente, como a liberação indiscriminada de agrotóxicos, a facilitação da ocupação de terras públicas e o novo Código de Mineração, que pode fazer com que casos como o de Mariana deixem de ser exceção.

Se o governo de Dilma Roussef estava longe de ser amigável ao meio ambiente, o de Michel Temer representa uma visão retrógrada que, certamente, colocará o Brasil de volta ao século 19.

Os sinais são perturbadores e chegam num momento em que a situação já não era favorável. Nos últimos dois anos o desmatamento na Amazônia cresceu 60%. A manutenção de tais números torna letra morta a meta brasileira de chegar a 2020 com uma redução de 80% do desmatamento, compromisso brasileiro no Acordo de Paris para a redução dos índices de emissão de gases de efeito estufa do país.

Aumento da violência

O Brasil já era apontado como o país com maior risco no mundo para ambientalistas, mas nunca, como agora, a bandidagem que atua no meio rural se sentiu tão à vontade para agir. Não à toa, estão se multiplicando casos de ataque contra indígenas, trabalhadores rurais, extrativistas e quilombolas.

Entre os casos mais recentes e bárbaros está a chacina de dez trabalhadores num assentamento rural de Colniza, cidade a quase mil quilômetros de Cuiabá, capital de Mato Grosso. Já no Maranhão, uma disputa de terras feriu 12 indígenas da tribo Gamela, no município de Viana, alguns em estado grave, sendo que um deles além de levar dois tiros teve as mãos decepadas.

Uma ação efetiva para punir os crimes e interromper essa selvageria parece não ser a preocupação de nossas "excelências". Ao invés disso, a CPI da Funai na Câmara dos Deputados decidiu por indiciar índios, antropólogos e entidades que atuam na proteção das tribos indígenas por, entre outras razões, tentar recuperar terras griladas que lhes foram roubadas.

Luta desigual e suas consequências

É muito difícil enfrentar essa ação coordenada dos ruralistas. O movimento ambientalista faz o que pode para tentar se contrapor a essa avalanche. Nesta semana, mais de 130 organizações e entidades lançaram uma carta pública (#Resista), denunciando esses ataques e chamando os brasileiros para um movimento de resistência contra as medidas do governo e da bancada ruralista.

Importante ressaltar que a repercussão internacional negativa poderá ser um enorme tiro no pé para governo e ruralistas. No caso da gestão Temer, que busca legitimidade e a recuperação econômica, não parece ser inteligente, aos olhos do mundo, rasgar compromissos e ser carimbado como um governo responsável por um enorme retrocesso ambiental em pleno século 21.

Para o agronegócio, que recentemente passou pelo vexame da carne estragada, ser acusado de não respeitar direitos e ser responsável por assassinatos e violência no campo em virtude de disputa de terras e descumprimento de leis ambientais, deverá causar repulsa e perda de contratos em várias partes do mundo.

No fim e ao cabo, a sociedade brasileira também precisa reagir, pois essa truculência e avanço sobre direitos adquiridos não se restringem a um problema meramente rural: elas colocam em risco nossa própria existência como país civilizado. Por isso, #Resista você também.


*Reinaldo Canto é jornalista especializado em sustentabilidade e consumo consciente, é professor de Gestão Ambiental

Fonte: Carta Capital