Opinião

Um alívio imediato para o clima

*Stela Herschmann e Carlos Rittl

O Protocolo de Montreal é o mais bem-sucedido tratado internacional para o meio ambiente da história. Firmado em 16 de setembro de 1987, ele tem como objetivo a proteção da camada de ozônio que protege a Terra dos nocivos raios ultravioleta. Graças a ele, estamos conseguindo tapar o buraco na camada sobre a Antártida. Mas o seu alcance pode ser ainda maior: dentro de algumas semanas, teremos a oportunidade de realizar mais um grande feito, que poderá representar um passo importante também para o enfrentamento do desafio climático global.

A implementação do Protocolo de Montreal resultou em reduções drásticas de emissões de CFCs (clorofluorcarbonos), gases de refrigeração e aerossóis, que quando emitidos corroem a camada de ozônio e também agravam o aquecimento global. Como resultado, a camada de ozônio está em franca recuperação: estima-se que possa estar totalmente restaurada até 2065. Isso vai impedir milhões de casos de câncer de pele e danos impensáveis para as produções agrícolas e para o ambiente. O sucesso do acordo também acabou retardando em muito as mudanças climáticas. Evitou um aquecimento quase igual ao que o dióxido de carbono – o maior contribuinte para o efeito estufa – causa hoje. Mas este tratado de quase 30 anos de idade ainda tem um enorme potencial adicional.

No próximo mês, os países signatários do Protocolo de Montreal vão se encontrar em Kigali, Ruanda, para decidir sobre uma emenda para reduzir o uso de HFCs (hidrofluorcarbonos), gases que substituíram os CFCs. Uma molécula deste gás tem um potencial de aquecimento global até quatro mil vezes maior do que uma de dióxido de carbono. A emenda tem boa chance de ser aprovada, mas ainda não está claro com que grau de ambição. O que está em jogo não poderia ser mais importante: uma redução rápida na produção e no consumo de HFCs poderia evitar, também, o equivalente a cem bilhões de toneladas de emissões de CO2 até 2050, ou algo como até 0,5° grau de aquecimento até ao fim do século. Seria um passo importantíssimo para proteger o clima e contribuir para o sucesso do Acordo de Paris, que o Brasil acaba de ratificar. E, assim como aconteceu em Paris, espera-se que o os diplomatas brasileiros contribuam para o sucesso em Kigali.

O Protocolo de Montreal tem um histórico de sucesso de implementar a eliminação gradual de gases de efeito estufa de forma eficiente e – talvez mais importante – justa. Aproveitando a rápida ratificação do Acordo de Paris, o Brasil, que é signatário do Protocolo de Montreal desde 1990, deveria marcar outro ponto para o planeta, se comprometendo a apoiar um acordo ambicioso em Kigali. O sucesso em Ruanda depende de os países concordarem em estabelecer uma data a partir da qual não poderão mais aumentar seu consumo destes gases, e acertarem um calendário para sua eliminação nos anos seguinte. Esperamos que o Brasil contribua para um acordo efetivamente ambicioso em Kigali e que adote medidas para a eliminação progressiva dos HFCs no âmbito doméstico.

*Stela Herschmann é assessora para relações institucionais da ONG Uma Gota No Oceano e Carlos Rittl é secretário-executivo do Observatório do Clima e conselheiro da Uma Gota No Oceano

Fonte: O Globo