Opinião

5 conquistas realistas que podemos esperar da COP 21 em Paris

*Brenda Brito, André Ferretti e Guilherme Karam

A aguardada conferência do clima de Paris, a COP21, começa enfim neste domingo. Mais de 190 países se reunirão para tentar selar um novo acordo de combate às mudanças climáticas. Há muita expectativa sobre os resultados desse evento e, por isso, a imprensa circulará nas próximas duas semanas várias notícias sobre o que acontecerá na reunião. Para evitar frustrações pós-COP, decidimos fazer um panorama realista do que esperar da conferência.

Há coisas que nós já sabemos antes mesmo de a COP-21 começar: primeiro, que as metas de redução de emissões indicadas pelos países no novo acordo serão insuficientes para impedir que a temperatura média do planeta aumente menos que 2oC até 2100. Análises feitas sobre a maior parte das propostas apresentadas (as chamadas INDCs) preveem um aumento da temperatura média mundial de aproximadamente 2,7oC até o fim do século, mesmo se todas as INDCs forem implementadas.

Sabemos também que o acordo de Paris não impedirá as consequências das mudanças climáticas. Mesmo que, num passe de mágica, o mundo parasse de emitir gases do efeito estufa em 2016, os efeitos provocados pelo carbono que já jogamos na atmosfera continuariam ocorrendo, já que os gases-estufa permanecerão ativos por décadas. Assim, o agravamento do efeito estufa provocado continuaria e, por consequência, haveria algum aumento da temperatura média do planeta até 2100, mesmo que inferior a 2oC (mas o suficiente para provocar impactos).

O aumento do nível do mar já está em curso, ou seja, o acordo de Paris não evitará que alguns países percam parte ou até mesmo todo o seu território devido a esse processo. O acordo de Paris tampouco impedirá que o desmatamento continue ocorrendo no Brasil e em outros países com florestas tropicais. Por exemplo, o governo brasileiro apresentou políticas de baixíssima ambição para cumprir sua INDC, prevendo zerar apenas o desmatamento ilegal e apenas na Amazônia em 2030. Na maioria dos casos, o desmatamento em países em desenvolvimento é resultado de políticas perversas, que incentivam a perda da floresta para beneficiar poucos economicamente, sem reflexos na melhoria de vida da população.

Mas, então, o que esse encontro e o acordo de Paris poderão fazer? Bastante coisa:

1 – O texto do acordo de Paris deve ser elaborado de forma a permitir ajustes ao longo do tempo, sem necessidade de novas e longas negociações no curto prazo. O acordo precisa também promover cooperação efetiva entre os países. Diferentemente do Protocolo de Kyoto – que era mais inflexível, com metas e prazos estabelecidos de cima para baixo -, o novo acordo pode definir que países apresentem metas atualizadas a cada cinco anos. Como as metas previstas até o momento não resolvem o problema, elas precisam ser revisadas e aperfeiçoadas periodicamente, para possibilitar que os países caminhem em direção à redução substancial das emissões – antes que seja tarde para evitar aumentos maiores que 2oC na temperatura média do planeta.

2 – Reforçar o mecanismo de perdas e danos. As mudanças climáticas são injustas e já afetam fortemente os mais vulneráveis, que pouco contribuíram com sua principal causa (queima de combustíveis fósseis). Para tratar dos danos que inevitavelmente ocorrerão, a Convenção do Clima das Nações Unidas criou em 2013 um mecanismo de perdas de danos. Esse mecanismo ainda está sendo estruturado, mas é importante que o acordo de Paris reforce a sua relevância e sua continuidade para os próximos anos.

3 – Destravar de uma vez por todas o acesso a recursos para incentivar a manutenção de florestas. Muito já se avançou na convenção sobre as regras do chamado REDD+, que é uma forma de incentivar a redução de emissões associadas à perda florestal. Porém, ainda falta definir como esse mecanismo acessará os recursos do Fundo Verde do Clima (criado pela Convenção).

4 – Ajudar na adaptação a um novo modus operandi. O mundo como conhecemos mudará (já está mudando!). O aumento de eventos extremos previsto pelos cientistas vai requerer, em muitos casos, mudança de padrões na forma como o desenvolvimento é encarado. De acordo com estudo da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a estimativa de danos previstos com as mudanças climáticas no Brasil é de redução da área agricultável, redução da vazão de rios que fornecem água para consumo e para geração de energia, aumento da vulnerabilidade da malha rodoviária em quase todo o país e avanço do mar em cidades costeiras com prejuízos na escala de centenas de bilhões de reais; e tudo isso em menos de três décadas. Por isso, o novo acordo do clima precisa destacar a importância da adaptação e criar condições para facilitar o mapeamento das vulnerabilidades dos países, planejamento de ações e implementação de soluções, além de facilitar a troca de boas ideias e tecnologias onde será mais necessário. Nesse contexto, os ecossistemas naturais protegidos são fundamentais para tornar a biodiversidade e a sociedade mais resilientes aos impactos das mudanças climáticas, dentro do conceito conhecido como Adaptação baseada em Ecossitemas. Isso porque eles apresentam maior capacidade de resistência e recuperação quando afetados por situações climáticas extremas, além de fornecerem ampla gama de benefícios dos quais as pessoas dependem – os chamados serviços ambientais.

5 – Inspirar e estimular ações nacionais, regionais e locais de corte de emissões e adaptação às mudanças climáticas. É difícil implementar acordos internacionais como esse ligado a mudanças climáticas, porque não existe (e não existirá) uma instituição com poder de punir os países que o descumprirem. Além disso, os incentivos para não cumprir são muitos. Porém, uma característica importante desses grandes acordos é influenciar a discussão sobre seus temas nas esferas nacionais e locais. Foi assim em 2009, quando, apesar do fracasso das negociações na COP15, em Copenhague, o Congresso Nacional aprovou a Lei da Política Nacional de Mudança do Clima, estabelecendo os atuais compromissos de redução de emissões de carbono do país até 2020. Vários Estados e até municípios também publicaram normas sobre o assunto desde então.

Portanto, o que esperamos após a COP21 é que o tema de mitigação e adaptação às mudanças climáticas esteja cada vez mais no dia a dia dos governantes e da população. Mesmo que o acordo de Paris seja considerado um sucesso, isso não será suficiente para impedir o aumento dramático da temperatura do planeta e suas consequências se não houver mudanças em todas as esferas, incluindo em nossos próprios lares – e não estamos falando de uma mudança apenas para o final deste século, mas sim para um tempo próximo, quando muitos dos que estão lendo esse texto estiverem com filhos e netos começando a formar suas próprias famílias. Por isso, aproveite as próximas duas semanas para entender mais sobre o tema, conversar a respeito dele com seus amigos e sua família, e trazer essa discussão cada vez mais para sua realidade.

*Brenda Brito é consultora em assuntos ambientais e fundiários e pesquisadora associada ao Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon). Integra o comitê de coordenação do Observatório do Clima; André Ferretti é Gerente de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário e coordenador-geral do Observatório do Clima; Guilherme Karam é Coordenador de Estratégias de Conservação da Fundação Grupo Boticário.

Fonte: Blog do Planeta