S.O.S. ao governador
*Dalce Ricas
O ditado "das crises nascem as soluções" pode ser aplicado à crise da água que assola Minas. Em entrevista coletiva, o governador eleito Fernando Pimentel anunciou medidas relativas à estrutura de abastecimento e consumo que são, sem dúvida, necessárias em curto prazo. Mas que, no máximo, amenizarão a crise, porque o risco que corremos é muito maior do que não ter água em casa: é ficarmos sem ela nos rios devido ao mau uso do solo, ao desmatamento e à poluição.
Provavelmente nos relatos que o governador recebeu da Coordenadoria de Defesa Civil e da Copasa não está mencionado que praticamente todas as bacias dos cursos d’água, com suas respectivas áreas de recarga e nascentes que abastecem a barragem do Rio Manso, estão desprotegidas, sem cobertura vegetal. Que em Várzea das Flores, a especulação imobiliária e as invasões correm soltas comendo um pedaço da área de proteção da barragem a cada ano.
Uma das medidas mencionadas por ele na entrevista foi transpor água do Rio Paraopeba para a barragem do Rio Manso. Se a possibilidade for acompanhada de estudos de impacto ambiental, técnicos e sérios, como determina a lei, eles dirão o que dá para ser visto por qualquer leigo: o Paraopeba e seus tributários também estão morrendo, assolados pela ocupação desordenada do solo, incêndios, pisoteio de gado, minerações irresponsáveis, despejo de esgoto e lixo e desmatamento. E dirão que a transposição pode encher novamente a barragem, por algum tempo. Até o dia em que o Paraopeba se tornar um filete de água suja.
Segundo a Copasa, 80% da água que ela vende corresponde ao consumo residencial. A indústria responde por cerca de 5%, pois a maior parte das empresas têm captação e tratamento próprios. Pela lei, na falta de água, a prioridade é o abastecimento humano. Mas, em entrevista à imprensa, a presidente da Copasa, Sinara Meirelles, disse que a empresa está avaliando a possibilidade de sobretaxar o excesso de consumo, medida que seria adotada somente em último caso.
A afirmativa é curiosa, porque, se há excesso, há possibilidade de economia e desperdício. O desperdício, inclusive, deve ser banido com crise ou sem crise e a forma mais efetiva é encarecê-lo. Talvez as contas reais que a Copasa esteja fazendo refiram-se aos prejuízos financeiros que teria com a medida, pois muita gente passaria a economizar água para economizar dinheiro. E o lucro dela diminuiria.
Assim, a Copasa pode ficar num beco, cuja única saída (em longo prazo) será fazer o que nunca fez de forma séria: proteger seus mananciais para garantir oferta de água capaz de continuar permitindo o desperdício e garantindo seus lucros. O governo acabou de criar um Grupo de Trabalho (GT), composto por diversas secretarias e aberto à participação da sociedade mediante solicitação, para estudar e propor medidas. Entre seus objetivos, consta "debater medidas necessárias à preservação e recuperação dos recursos hídricos".
O GT não terá muito trabalho. As medidas são óbvias e há muito vêm sendo propostas por ambientalistas "chatos", técnicos e cientistas. Trabalho, ou melhor, coragem, terá de ter o governador para implementá-las, porque há interesses a serem contrariados!
*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda
Fonte: revista Ecológico