O pico dos combustíveis fósseis e a próxima crise econômica internacional
*José Eustáquio Diniz Alves
Ao contrário do otimismo da Agência Internacional de Energia, existem estudos mostrando que o pico da oferta de combustíveis fósseis e urânio está mais próximo do que se imagina e contrasta com a visão panglossiana da mídia sobre este assunto. O preço do barril de petróleo (WTI) a mais de US$ 100,00 o barril, como se encontra atualmente, já reflete um aumento do custo de extração (em poços cada vez mais profundos) e é um motivo que ajuda a desacelerar a economia global.
Um estudo do Energy Watch Group, de março de 2013, mostra o cenário para todos os combustíveis fósseis e nuclear, medido em unidades de energia (1Mtoe = 1 milhão de toneladas de óleo equivalente). As produções de carvão e gás devem chegar a seus respectivos picos de produção por volta de 2020. O pico combinado de todos os combustíveis fósseis poderá ocorrer alguns anos mais cedo do que o pico de carvão e gás e deve coincidir com o início do declínio da produção de petróleo.
Desta forma, o declínio da produção de petróleo – que está previsto para começar em breve – vai levar a um crescente hiato de energia que poderá tornar-se demasiado grande para ser preenchido por gás natural e ou carvão. A contribuição da energia nuclear é muito baixa para ter qualquer influência significativa a nível global, embora isso possa ser viável para alguns países.
A conclusão do Energy Watch Group é que o fornecimento de combustível fóssil está perto do pico, pois a produção de petróleo declinante vai criar um fosso crescente na produção de energia, que outros combustíveis fósseis serão incapazes de compensar. Nos mêses de julho e agosto de 2013, o preço do barril de petróleo (WTI) ultrapassou US$ 100 dólares, em uma época em que o consumo dos Estados Unidos está diminuindo. Estudos mostram que um aumento de US$ 10 dólares no preço do barril significa uma diminuição de cerca de 0,5% no crescimento do PIB mundial.
No caso do Brasil, o governo apresentou o pré-sal como se fosse a fonte de milagrosos recursos fósseis capazes de fazer a redenção do país. Porém, depois de bilhões de dólares investidos, a balança comercial brasileira está deficitária no ano de 2013, exatamente porque a frota de carros cresceu mas tivemos de importar gasolina a alto preço. O governo descuidou dos biocombustíveis e das energias renováveis e agora está pagando o preço pelas escolhas erradas em busca de independência baseada em combustíveis poluidores e que devem ser superados pela energia limpa. Nem a Petrobras tem escapado, como mostra o preço de suas ações.
Se os cenários globais do pico do petróleo se confirmarem a economia internacional pode entrar em uma crise profunda, pois os países desenvolvidos são muito dependentes dos combustíveis fósseis e já estão passando por dificuldades macroeconômicas, devido ao aumento do endividamento público, aos enormes déficits fiscais e ao processo de envelhecimento populacional. Como mostrou Ronald Bailey, dez entre onze recessões econômicas dos Estados Unidos foram precedidas pelo aumento do preço do petróleo. Para complicar, um aumento das taxas de juros (na média internacional) teria consequências devastadoras.
Os países em desenvolvimento também vão sofrer, pois o aumento do preço da energia deve aumentar o preço dos alimentos e a inflação de bens e serviços. A desaceleração da economia deve aumentar o desemprego e pode reverter o processo de redução da pobreza extrema que vem caindo nos últimos 40 anos.
A Arábia Saudita, por exemplo, está enfrentando vários problemas e alto potencial de desestabilização. A sociedade saudita e os cidadãos ricos dependem de milhões de trabalhadores estrangeiros qualificados e não qualificados para a construção de infraestrutura e para manter casas, bancos e restaurantes funcionando perfeitamente. No entanto, os combustíveis fósseis são limitadas e a competição internacional é forte. Enquanto isso, a taxa de desemprego é alta. Muitos jovens sauditas inexperientes buscam altos salários e altos cargos, enquanto permanece a segregação das mulheres e uma alta desigualdade de gênero. O dinheiro do petróleo permitiu ao país evitar todos os tipos de crises, incluindo os protestos da Primavera Árabe, mas os líderes devem se preparar para uma economia alternativa com menos dependência do petróleo ou, provavelmente, vão ter que enfrentar uma revolução popular.
O artigo Trouble in fracking paradise de Chris Nelder, no site Smart Planet (7/08/2013) mostra as dificuldades para a exploração de gás de xisto e apresenta uma previsão de que o preço do barril de petróleo (WTI) vai chegar a US$ 150,00 até 2015, puxando para baixo o ritmo de crescimento do PIB global. A ideia de que os Estados Unidos iria apresentar independência energética é uma fantasia, assim como é fantasioso acreditar que os combustíveis fósseis podem continuar incrementando as atividades econômicas sem uma mudança na matriz energética.
A notícia boa de tudo isto é que uma crise internacional pode dar um alívio ao efeito estufa, com menos emissão de gazes poluidores da atmosfera. Ou seja, o esfriamento da economia internacional poderá evitar que o mundo sofra um rápido processo de aquecimento global do clima e pode forçar uma aceleração da mudança da matriz energética, rumo à utilização de fontes renováveis e limpas. Para acelerar este processo, urge reduzir os subsídios ao consumo de combustíveis fósseis que, em 2010, alcançaram o valor global de 523 bilhões de dólares. A transição para uma economia de baixo carbono é uma condição necessária para que se possa construir uma alternativa de sustentabilidade no mundo.
José Eustáquio Diniz Alves é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
Fonte: EcoDebate