Opinião

Aquecimento global e mudanças climáticas extremas

*José Eustáquio Diniz Alves

Existem pessoas que ignoram os desastres ambientais causados pelos seres humanos e não acreditam no aquecimento global. Mas segundo os cientistas do National ClimaticData Center (NOAA/USA), a temperatura média global sobre superfícies terrestres e oceânicas para agosto 2013 ficou empatado com o mesmo mês de 2005, como o quarto mais quente agosto desde manutenção de registros que começaram em 1880.Também marcou o 35º agosto consecutivo e 342º mês consecutivo(mais de 28 anos), com uma temperatura global acima da média do século 20.O último registro, em agosto, abaixo da média da temperatura global foi em agosto de 1978,a última temperatura abaixo da média global de qualquer mês foi em fevereiro de 1985.

Evidentemente, os autodenominados céticos do clima (ou "negacionistas"), tentam desconsiderar a realidade ou reinterpretá-la para tentar mostrar que o aquecimento global não é fruto das atividades humanas, muito menos fruto da queima dos combustíveis fósseis, da liberação do gás metano e do desmatamento. As poderosas indústrias do petróleo e dos produtos químicos, assim como o fundamentalismo de mercado, não tem medido esforços para confundir a cabeça da opinião pública e manter os políticos longe das ações públicas visando a construção de uma sociedade de baixo carbono e de baixo impacto antrópico sobre o meio ambiente.

Porém, as principais academias de ciência do mundo já lançaram um manifesto expressando a preocupação com o aquecimento global. De cerca de 12 mil estudos acadêmicos (com revisão científica por pares) sobre o tema, em 20 anos, 97% confirmam os efeitos deletérios do aumento da temperatura média do Planeta. Até o Banco Mundial divulgou um relatório mostrando porque devemos evitar um aquecimento de 4 graus centígrados.

Embora o ritmo do aquecimento tenha desacelerado desde o pico ocorrido em 1998 (o chamado hiato), cada década tem sido mais quente do que a anterior. Evidentemente, são muitos os fatores que afetam o clima e não apenas a concentração de gases de efeito estufa (GEE). Seria ótimo que houvesse uma estabilização do aquecimento global, mas a análise de longo prazo indica que o efeito estufa é real e tende a se agravar.

A perda do gelo dos polos, por exemplo, pode ter consequências dramáticas para o Planeta. O permafrost – tipo de solo encontrado na região do Ártico – contém uma grande reserva de metano, gás-estufa 30 vezes mais potente que o dióxido de carbono. Se a liberação do gás metano (CH4) para a atmosfera for acelerada pelo degelo do Ártico, poderá haver uma aceleração acentuada e cumulativa do aquecimento global, com o aumento do nível dos oceanos e a diminuição das áreas de cultivo na foz dos principais rios do mundo, devido ao processo de salinização provocado pelo avanço do mar.

O fato é que o crescimento da população e da economia tem acelerado a queima de combustíveis fósseis, o desmatamento, a destruição de ecossistemas, o aumento da erosão dos solos, a desertificação, a acidificação dos oceanos, a redução dos recifes de corais, a diminuição da biodiversidade e o uso abusivo das fontes de água potável e dos aquíferos. Mas ao invés de mudar o modelo antrópico de exploração e dominação da natureza, os esforços internacionais (como a última reunião do G-20 em São Petersburgo) são realizados no sentido de acelerar o crescimento econômico e aumentar a demanda agregada por bens de consumo e serviços.

O resultado imediato tem sido o aumento dos eventos climáticos extremos, incluindo ondas de calor e tempestades, com o aumento do número dos refugiados do clima. A agricultura e a aquacultura seriam prejudicadas, afentando a produção de comida, o que dificultaria a capacidade de alimentar os cerca de 7 bilhões de pessoas da população atual e os bilhões de habitantes a mais que virão até o final do século.

O Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas ( IPCC na sigla em inglês), divulgou no dia 27 de setembro de 2013, o seu 5º relatório sobre o clima que aumenta o grau de certeza dos cientistas em relação à responsabilidade do homem no aquecimento global. O texto afirma que há mais de 95% (extremamente provável) de chance de que a humanidade causou a maior parte da elevação média de temperatura registrada entre 1951 e 2010, que está na faixa entre 0,5 a 1,3 grau ( o 4º relatório falava em mais de 90% de chances). Outra constatação importante é que o nível dos oceanos aumentou 19 centímetros entre 1901 e 2010.

O IPCC diz ainda que há ao menos 66% de chance de a temperatura global aumentar pelo menos 2º Centígrados até 2100 em comparação ao período pré-industrial, caso a queima de combustíveis fósseis continue no ritmo atual e não sejam aplicadas quaisquer políticas climáticas consequentes. Na continuidade dos altos índices de emissões de GEE, o nível do mar pode aumentar entre 45 e 82 centímetros, prejudicando regiões costeiras do planeta. O gelo do Ártico pode retroceder até 94% durante o verão no Hemisfério Norte.

O relatório faz previsões de que a temperatura no planeta pode aumentar entre 0,3º C e 1,7º C (no cenário mais brando, com menos emissões e mais políticas climáticas proativas por parte dos governos e da sociedade civil) e entre 2,6º C 4,8º C, considerado o pior cenário, aquele em que não há controle do lançamento de gases-estufa. A temperatura da superfície do oceano teve aumento de 0,11º C por década entre 1971 e 2010, havendo acidificação das águas oceânicas, fator que pode provoca a redução do estoque de peixes e da biodiversidade.

Ou seja, segundo o novo relatório do IPCC:

– a temperatura global do Planeta aumentou 0,85º C entre 1880 e 2012;

– há 95% de chance de que o ser humano seja o principal agente causador do aquecimento;

– no pior cenário de emissões de GEE, a temperatura pode subir 4,8º C até 2100;

– neste cenário mais dramático, o nível do mar pode aumentar 82 cm até 2100;

– gelo do Ártico pode retroceder 94% até 2100 durante o verão;

– O degelo da Antártica e do alto das montanhas deve aumentar, reduzindo os fluxos de água potável;

– aumento dos eventos climáticos extremos , incluindo ondas de calor, seca e tempestades.

Desta forma, o IPCC lançou uma dura advertência sobre a realidade do aquecimento global e, consequentemente, uma dura advertência contra o estilo de desenvolvimento baseado na queima de combustíveis fósseis e na continuidade de um modelo de produção e consumo que, além de ser injusto socialmente, é incompatível com a saúde dos ecossistemas e a continuidade da rica diversidade da vida na Terra.

*José Eustáquio Diniz Alves é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

Fonte: EcoDebate