Desmatamento autorizado
*Maria Dalce Ricas
Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais acatou ação do Ministério Público e suspendeu todos os atos autorizativos da Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad), para supressão de Mata Atlântica e plantio, no município de Jequitinhonha, concedidos à empresa Fazendas Reunidas Viena. Segundo a ação, entre 2009 e 2013, ela desmatou 3.078 hectares (ha) de Mata Atlântica, em estágios médio e avançado de regeneração para plantio de eucalipto.
As autorizações são duplamente ilegais, porque nos estágios de recuperação mencionados só pode haver supressão em situações de utilidade pública ou de interesse social, que não é o caso, e mediante licenciamento. O desmatamento foi autorizado por propriedade e não pelo empreendimento como um todo, caracterizando prática de fragmentar o licenciamento. Esse tipo de ação vem sendo denunciada há tempos pela Associação Mineira de Defesa do Ambiente (Amda) e outras entidades.
O primeiro grande caso foi o da Fazenda Vitória, com cerca de 4.000 ha, na qual o Instituto Estadual de Florestas (IEF) autorizou plantio de eucalipto na zona de amortecimento do Parque Estadual Serra do Cabral em 2007. Graças à ação do Ministério Público, o plantio foi paralisado, mas a prática permaneceu.
O caso da Fazendas Reunidas Viena compõe o quadro que levou a Fundação SOS Mata Atlântica e o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais a apontarem Minas, pela quarta vez consecutiva, como o estado campeão da derrubada do bioma no país, seguido pela Bahia e o Piauí. Nos últimos três anos, segundo dados do Instituto Estadual de Florestas, entraram em Minas cerca de 740.000 m³ de carvão provenientes da derrubada da Mata Atlântica da Serra Vermelha do estado. O pior disso tudo é perceber que o Governo de Minas parece não se importar com o desonroso título, já que nesse período nada fez para mudar a situação.
Nesse cenário, a Semad aparece frente à sociedade como responsável, o que em parte é verdade, já que cabe a ela a responsabilidade direta pela proteção da Mata Atlântica em Minas.
Mas é preciso ainda olhar além. Proteger a Mata Atlântica e paralisar o desmatamento, diante de tanta área já desmatada, são ações previstas na política do Governo de Minas, ou a postura da Semad reflete orientação ou, no mínimo, descaso do Palácio Tiradentes? No jogo de cartas do poder, quem tem "ases e reis", a Semad ou a Secretaria de Estado de Agricultura, Pecuária e Abastecimento?
*Maria Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda
Fonte: Revista Ecológico