Opinião

Visitar para conservar

*Diego Igawa Martinez

**Kevin Amedick

Muita atenção tem sido dada à importância das áreas protegidas para a conservação da biodiversidade, proteção dos serviços ecossistêmicos e mitigação das mudanças climáticas. No entanto, além do número de áreas protegidas e das áreas que elas cobrem, é importante considerar a relação delas com a sociedade, e o número de visitantes que essas áreas protegidas recebem é um dado importante que pode contribuir com o apoio às ações de conservação e restauração das nossas florestas.

A contribuição direta desses espaços protegidos para o desenvolvimento da bioeconomia é bastante clara. No Brasil, um estudo coordenado por pesquisadores da UFRJ e UFRRJ apontou que as 7 milhões de visitas registradas em parques nacionais em 2016 contribuíram com valores entre 1,2 bilhão e 2,9 bilhões de reais para a economia brasileira. No total, os pesquisadores estimam que as cerca de 16,8 milhões de pessoas que passaram naquele ano por todas as Unidades de Conservação do país geraram entre 76 mil e 133 mil empregos.

Um estudo de 2015 na revista PLOS Biology quantificou pela primeira vez o número de visitas às áreas protegidas no mundo para estimar seu valor econômico através do turismo. Usando dados de 550 locais, os pesquisadores projetaram taxas de visitação para mais 140 mil lugares, considerando fatores como tamanho da população local, área protegida, renda nacional, isolamento e atratividade natural. Foi estimado que áreas protegidas globalmente recebem cerca de 8 bilhões de visitantes por ano, gerando um gasto anual de 600 bilhões de dólares em turismo – muito mais do que os cerca de 10 bilhões de dólares gastos na conservação dessas áreas.

O estudo revelou também grandes diferenças regionais no número de visitantes anuais às áreas protegidas no mundo: 3,8 bilhões na Europa, 3,3 bilhões na América do Norte, 148 milhões na América Latina e 69 milhões na África. No Brasil, 137 unidades de conservação registraram aproximadamente 23,7 milhões de visitas em 2023, sendo 11,8 milhões em parques nacionais. O mais visitado, o Parque Nacional da Tijuca, teve 4,4 milhões dessas visitas (ICMBio).

Embora as visitas aos parques nacionais do Brasil tenham aumentado gradualmente na última década, o número de visitas é muito menor do que nos Estados Unidos e Canadá, por exemplo. Enquanto nossas áreas protegidas e parques nacionais registraram mais visitas em 2019 do que as da Argentina, Chile e Costa Rica em termos absolutos, as cifras do Brasil ficaram menores quando avaliadas em uma base per capita, ou seja, de acordo com o tamanho da nossa população.

No Brasil, ainda temos muito espaço para o desenvolvimento dessa economia baseada na conservação, especialmente considerando que as metas do novo Marco Global da Convenção das Nações Unidas sobre Diversidade Biológica, da qual o país é signatário, demandam uma expansão das áreas protegidas em todos os ecossistemas até o ano 2030. Para isso, é preciso incentivar o acesso às áreas protegidas, um passo fundamental para promover a valorização dessas áreas e um uma grande mudança cultural na relação ser humano-natureza.

Também é relevante notar o valor dessas áreas frente às questões contemporâneas como a ansiedade climática e a degradação da saúde mental. Em um artigo publicado na revista Nature, pesquisadores encontraram uma ligação direta significativa entre visitas a áreas protegidas e melhor saúde mental e bem-estar, que por sua vez se traduzem em um valor econômico considerável.

Além da contribuição econômica, estudos recentes destacam o valor das visitas às áreas protegidas para gerar um apoio societal mais amplo à conservação por parte do público e de atores políticos. Um estudo de 2018 publicado na revista Frontiers in Ecology and the Environment reuniu uma série de dados em estudos de caso em diferentes países para suportar de forma empírica o que os autores chamaram de Síndrome da Mudança de Linha de Base, ou seja, o fenômeno de que as atuais gerações e pessoas com menos contato com a natureza tendem a perceber menos o impacto das crises de clima e biodiversidade e, portanto, tendem também a apoiar menos ações de conservação.

Em um mundo de natureza mais empobrecida, perdemos gradativamente as nossas referências. Para prevenir e reverter essa síndrome, é preciso agir sobre a perda de interação e de familiaridade das pessoas com os ambientes naturais, promover a restauração dos ecossistemas e reduzir o que os autores chamam de extinção das experiências na natureza.

Iniciativas como a campanha anual “Um Dia no Parque” são essenciais para aumentar esse relacionamento e engajamento com a natureza ainda bem conservada, que tendem a se concentrar em Unidades de Conservação. A campanha de 2024, apoiada por uma série de organizações da sociedade civil, órgãos públicos e grupos independentes, contabilizou o envolvimento de cerca de 400 iniciativas para aproximar a sociedade das suas áreas protegidas.

Cada visita a uma área protegida no Brasil é um pequeno passo na conservação do nosso patrimônio natural. E elas estão, vale reforçar, muito mais próximas do que costumamos imaginar. Não por acaso, as cinco UCs mais visitadas do país ficam na Mata Atlântica, bioma onde vivem mais de 70% da população brasileira: Parque Nacional da Tijuca (que abriga o Cristo Redentor), Parque Nacional do Iguaçu (onde ficam as Cataratas), Parque Nacional de Jericoacoara, Parque Nacional da Serra da Bocaina e Parque Nacional Marinho de Fernando de Noronha. Mesmo assim, ainda há um enorme potencial a ser explorado.

Frente aos compromissos ambientais do país, precisamos ir além – e a mobilização de cada pessoa é relevante para trilharmos esse caminho.

*Diego Igawa Martinez é coordenador de projetos na Fundação SOS Mata Atlântica.

**Kevin Amedick é estudante de Geografia da Universidade de Oxford.

Fonte: O Eco