Opinião

O fogo atingiu o agro e doeu no bolso

Talvez agora, quem sabe a população e os governantes passem a tratar do assunto com seriedade e responsabilidade.

*Dalce Ricas

Enquanto os incêndios “só” destruíam florestas e torravam animais, causavam acidentes nas rodovias, poluíam o ar e a água, a preocupação dos governos ficava restrita aos órgãos ambientais. As vezes somente aos técnicos comprometidos com a proteção do meio ambiente.

Mas agora a situação mudou. Por algum motivo os incendiários resolveram queimar plantios. E aí, os prejuízos foram estimados, o agronegócio se revoltou, com razão. Mas se não fossem os prejuízos, manteria silêncio como sempre fez. Governadores e até o presidente disseram estar preocupados. Até incendiários foram presos! E soltos. 

A imprensa tem desempenhado papel fundamental na divulgação dos incêndios que assolam o país. Mas o foco tem sido no combate e pouco na prevenção, refletindo fala das “autoridades”. Algumas chegam a aproveitar a tragédia para fazer propaganda eleitoreira.

Considerando a probabilidade que a seca volte a se repetir, pois as alterações climáticas continuam se agravando, se o país não tiver política de prevenção como política de Estado (como saúde, segurança, educação), será necessário contratar alguns milhões de brigadistas para apagar fogo. O combate é atividade de alto risco, tem custos altíssimos com aviões, combustível fóssil (que se alia ao fogo como fonte emissora de gases) e equipamentos diversos.

Se fossem calculados custos com saúde pública devido à fumaça e fuligem que cobrem as cidades e levam milhares de pessoas aos hospitais (a indústria farmacêutica agradece), perda de biodiversidade, destruição de pastagens e plantios, acidentes nas rodovias pela pouca visibilidade devido à fumaça, poluição de rios e danos ao solo, chegaríamos a custos absurdos. Será que a prevenção não sai mais barata?

Em resumo, a política de prevenção seria: inclusão de toda a máquina pública que tem atividade ligada direta ou indiretamente ao uso de recursos naturais: instituições de ensino públicas e privadas; Denit e DERs (roçagem do capim em beira de rodovias); concessionárias de energia; Ministério da Agricultura e Pecuária, Emater nos Estados; instituições estaduais que fiscalizam saúde animal (em MG, o IMA), bombeiros, polícias civil, federal e militar. Envolvimento obrigatório das prefeituras obviamente.

Apoio e estímulo à formação de brigadas voluntárias com fornecimento de equipamentos pessoais, de combate e transporte para os locais de combate; exigência de formação de brigadas profissionais para grandes empreendimentos que exerçam suas atividades em áreas rurais e para as concessionárias de energia e rodovias.

Punição

Apesar da Lei Federal 9.605/98 (Lei de Crimes Ambientais) ser ridícula, há brecha para manter incendiários na cadeia até por cinco anos. Mas eles não são punidos, porque a sociedade tolera e os governos refletem isto. 

Desde que o Pantanal começou a queimar, o MP e Polícia Federal anunciam que haverá investigações. Com a tecnologia disponível, é fácil localizar os incêndios começaram. Mas até agora nada.

Poucos crimes foram mais aterrorizantes que o “dia do fogo”, anunciado abertamente por fazendeiros e desmatadores na Amazônia em 2019. Segundo o Greenpeace, mesmo sendo possível identificar um grande número de responsáveis, apenas 5% dos envolvidos na queima de florestas tiveram áreas embargadas. O restante virou pasto.

Obviamente o governo de Bolsonaro não puniria. Mas o governo de Lula nem toca no assunto. Na área ambiental o crime compensa. E muito! Nada mais confortável para um criminoso é saber que não será punido. Mas agora, que o fogo causou prejuízo ao agro, quem sabe alguma coisa melhora? 

*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda.