Entrevistas

“A Lei da Água” explica a relação entre o novo Código Florestal e o problema de água no Brasil

“A Lei da Água” explica a relação entre o novo Código Florestal e o problema de água no Brasil

“A Lei da Água” é um documentário que explica a relação entre o novo Código Florestal e o problema de água no Brasil. O filme mostra a importância das florestas para a conservação dos recursos hídricos, e problematiza o impacto do novo Código Florestal, aprovado pelo no Congresso em 2012, nesse ecossistema e na vida dos brasileiros. André D’Elia, diretor da obra, conversou com a Amda e contou um pouco mais sobre a produção do documentário. Confira a entrevista:

Amda – Qual foi sua motivação para a produção do documentário sobre o Código Florestal e água?

André D’Elia – Eu sempre tive essa vontade de fazer um documentário sobre o Código Florestal, mas na época da aprovação na Câmara, a gente não tinha dinheiro e muitas pessoas no movimento social consideravam que era uma causa perdida, e não adiava fazer um filme naquela hora.

Eu segurei a ideia, mas continuei juntando recortes de jornal e fazendo pesquisas sobre o tema. Então o Raul Teles do Vale, advogado do Instituto Socioambiental (ISA) na época, fez o pedido pra fazer um filme que registrasse todo este processo e consultasse a opinião de cientistas. Primeiro ele fez este pedido para o Fernando Meireles, que me indicou para dirigir o filme.

Aí foi o trabalho de ir juntando os parceiros, a WWF Brasil, SOS Mata Atlântica, Associação Bem-Te-Vi Diversidade e Instituto Democrático de Sustentabilidade (IDS), para poder financiar e produzir o filme.

A motivação veio de perceber que essa modificação da Lei Florestal Federal não é condizente com as necessidades da comunidade brasileira e com os problemas enfrentados pelos agricultores no campo. É uma legislação que foi alterada para atender a interesses corporativos. A motivação foi mostrar que a ciência tem muito a contribuir neste processo, embora ela tenha sido ignorada e ficado de fira das discussões.

Amda – Qual foi o maior desafio enfrentado na gravação do filme?

A.D – O maior desafio foi trabalhar com pouco dinheiro. Trabalhamos no limite do orçamento, até porque nós não conseguimos juntar o dinheiro total para produção do filme. Nós fizemos o documentário com menos dinheiro que foi previsto.

Outro desafio foi marcar entrevistas com os parlamentares que eram favoráveis às mudanças do Código. Como, por exemplo, a Kátia Abreu e o Aldo Rebelo, que foram duas pessoas muito importantes neste processo, e acabaram ficando de fora do documentário, e não foi por falta de tentativas, porque tentamos marcar entrevistas com eles por diversas vezes, mas eles sempre colocavam um imprevisto para o agendamento. E fizeram isso até nós desistirmos da entrevista.

Amda – Quanto tempo foi preciso para produção do documentário e quantas pessoas foram ouvidas durante o processo?

A.D – Da pré-produção até lançamento foram dois anos, e foram ouvidas mais ou menos 37 pessoas.

Amda – No documentário é retratado como a mídia noticiou as discussões acerca das modificações do Código Florestal. Em sua opinião, a mídia poderia ter contribuído mais fortemente para uma lei melhor, investindo, por exemplo, em notícias sobre a exclusão da sociedade e da comunidade científica do processo de discussão?

A.D – Eu acho que sim. Na verdade teve muita mídia e muita notícia. Os jornalistas trabalharam bem e fizeram um bom trabalho com relação às notícias referentes à aprovação, tanto na Câmara quanto no Senado. O problema da mídia foi que no finalzinho, na época da campanha do Veta Dilma. Quando a presidente vetou alguns pontos, a mídia se enganou e comprou essa ideia de que os vetos tinham resolvido o problema, sendo que a legislação continuou sendo muito ruim e os retrocessos foram enormes. Neste momento parece que os jornalistas não estavam atentos ao que os resultados destes vetos realmente significavam para a sociedade. Houve várias reportagens sobre a opinião da sociedade científica e sociedade civil, mas faltou relacionar, por exemplo, o código com a crise hídrica.

A mídia comprou a ideia de que problema de falta de água se resolve com obra, sendo que não é. O grande problema hídrico de Minas Gerais, Rio de Janeiro e São Paulo é a degradação histórica dos mananciais. Ao invés de pensar na restauração, pensa-se em trazer água de outro lugar, e isso é “tampar o sol com a peneira”. Acho que a mídia está muito focada na questão das obras emergenciais e se esquece de falar desta solução tão importante, a médio prazo, de nove a 15 anos, que é a restauração florestal.

Amda – O filme mostra trechos de entrevistas de parlamentares da bancada ruralista, que votaram a favor da modificação do código, que chegam a provocar risos e indignação nas plateias por conter afirmações absurdas, que ignoram todo conhecimento científico sobre a proteção ambiental, privilegiando exclusivamente os lucros do agronegócio. Houve alguma reação por parte deles depois do lançamento do filme?

A.D – Não. Eles não falaram nada. Nem disseram se gostaram ou não do filme.

Amda – Futuramente, você tem planos de montar novos projetos, para explicar políticas ambientais com vocabulário mais acessível, assim como a Lei da Água?

A.D – Estamos fazendo um trabalho sobre a importância do Cerrado e sobre o plano de manejo da Área de Preservação Ambiental (APA) do Pouso Alto, em Goiás.

Outra ideia que surgiu no evento de lançamento do filme em Minas, organizado pela Amda, foi a de fazer um trabalho/filme sobre as veredas, sobre o rio São Francisco, e de como se pode gastar milhões de reais em uma obra de transposição sem investir e sem dar atenção para a restauração florestal das cabeceiras destes mesmos rios. Hoje nós vemos vários canais já prontos, alguns trechos que já foram entregues, mas que não tem água, porque investiram em infraestrutura, mas não investiram em restauração florestal.