Opinião

Vice-presidente da Natura foi incoerente ao dizer que não acredita em “florestas intactas” .

*Dalce Ricas

Sou cliente da Natura, justamente por sua postura ambiental de não fazer testes em animais e por seus projetos com comunidades da Amazônia. Fiquei muito surpresa com a declaração de seu vice-presidente Agenor Leão, vice-presidente de negócios no Brasil, em entrevista ao site UOL, quando disse que a empresa não acredita na “floresta intacta”. Que elas têm de gerar renda para as pessoas.

Para mim, sua fala é 100% antropocentrista, como se tivéssemos “direito divino” de usar todas as florestas. Na Amazônia, por exemplo, entendo que a fala embute o “direito” de “civilizar” indígenas que ainda não tiveram a infelicidade de contato com os “civilizados”. Como são pessoas (e assim se incluem na declaração dele), será que querem ganhar dinheiro ou serem respeitados em seu modo de vida?

E quanto aos animais? Porque não podemos (e deveríamos) deixá-los totalmente em paz? Eles são moradores da floresta. Se falassem conosco, será que diriam o mesmo? “Não acreditamos em cidades intactas. Elas têm que gerar “renda” para nós”. Já viram algum indígena invadir nossas cidades? Alguns animais sim, porque têm de buscar sobrevivência tendo seus habitats destruídos pelos humanos.

Uma coisa é aceitar a realidade da existência de populações não indígenas na Amazônia e implantar políticas públicas e privadas (com faz a Natura) para ajudá-las e indiretamente talvez contribuir para que respeitem a floresta e seus habitantes originais: indígenas e animais. Outra é continuar avançando na ocupação das áreas ainda intactas, mesmo com projetos “sustentáveis”.

Animais não são “coisas” criadas para nos servir. Já passou do tempo, e muito de nos colocarmos e aceitarmos que somos apenas parte da natureza, não dono dela. De abandonarmos a arrogância da supremacia sobre ela, embutida no ridículo princípio de que fomos “criados à imagem e semelhança de Deus”.

Acho que o vice-presidente da Natura não foi coerente com o que prega sua empresa, e perdeu uma boa oportunidade de ficar calado.

*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda.