"Nobreza" insustentável
*Dalce Ricas
Eles não desistem. O deputado Toninho Pinheiro-PP/MG (o mesmo que tentou modificar a legislação de zona de amortecimento de parques e reservas para facilitar loteamentos) apresentou à Câmara dos Deputados o PL 3.571/2015. O projeto "dispõe sobre a desapropriação e indenização de propriedades privadas em unidades de conservação de domínio público". Se for aprovado, podemos dizer "adeus" à proteção legal de ambientes naturais preciosos para o país e o planeta.
O PL prevê que o poder público não mais poderá criar Unidades de Conservação (UCs), a não ser que disponha no ato a dotação orçamentária para regularização fundiária. O propósito parece nobre, porque sem dúvida há muitos casos de proprietários rurais que ficam prejudicados pela restrição de algumas atividades econômicas (como desmatamento, loteamento, mineração).
Mas a "nobreza" considera somente a defesa da propriedade privada, independentemente de pertencer a empresas, latifúndios; da preservação dos atributos ambientais e de aquíferos que têm de ser preservados; do mau uso do solo e outras práticas predatórias; de conflitos sociais e do valor real das terras.
Em Minas Gerais, por exemplo, boa parte das poucas unidades de conservação que existem foi criada em áreas onde o solo é de pobreza extrema, como na Serra do Espinhaço. Ou seja: são terras inviáveis para quase toda atividade econômica.
É o caso do Parque Estadual do Rio Preto, que rende mensalmente à prefeitura de São Gonçalo do Rio Preto mais de R$ 50 mil pelo ICMS ecológico, valor que deve ser infinitamente maior do que renderia qualquer atividade. Ou da prefeitura de Ibirité – município em que a família do deputado se mantém na prefeitura há mais de 16 anos -, que recebe cerca de R$ 25 mil/mês pelo Parque Estadual do Rola Moça. Aliás, é bom registrar que o repasse do ICMS independe da regularização fundiária.
Está comprovado que a criação de UCs, mesmo sem regularização, aumenta a proteção ambiental, justamente pelas restrições a atividades degradantes. Os parques que já estão abertos ao uso público propiciam lazer e contato com a natureza principalmente para segmentos da sociedade que não têm condição econômica de frequentar áreas privadas.
O Brasil tem percentual irrisório de parques e estações ecológicas, sendo que grande parte, como na Amazônia, está invadida e sendo depredada. Mesmo sendo terras públicas.
A privatização (ou entrega) de terras públicas no país continua sendo feita, em detrimento de serem destinadas à criação de unidades de conservação. Parecer da assessoria técnica da Câmara informou aos deputados que a aprovação levará a um "engessamento" do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), dificultando ou impossibilitando a criação de novas unidades, inviabilizando este importante instrumento de proteção e gestão ambiental.
Se o deputado e seus pares lutassem pela aplicação dos recursos da compensação ambiental que estão parados ou sequestrados no ICMBio e em órgãos estaduais e pela dotação orçamentária, nossos parques já estariam regularizados.
Nós, também, não desistiremos!
*Dalce Ricas é superintendente executiva da Amda
Fonte: Revista Ecológico