Opinião

Foi-se o fogo. E agora?

*Maria Dalce Ricas

Parece que, para 2014, acabou a "temporada de fogo". Mas não seu rastro de destruição. Não haverá contabilização dos prejuízos. Não existe metodologia nem a intenção de desenvolver uma. E realmente é difícil. Como expressar economicamente os danos aos rios causados pelas toneladas de cinza que serão levadas pela chuva aos cursos d´água? E quanto vale a vida dos passarinhos, cobras, lagartos, lobos, jaguatiricas, roedores e árvores que foram queimados vivos, tal como se fazia com os hereges na época da inquisição? Os danos sobre o solo exposto ao sol e à erosão? Só é fácil quantificar o lucro das empresas farmacêuticas pelo aumento da venda de remédios antialérgicos contra a fumaça que tornou cinza o azul do céu em Minas.

A luta foi dura, de "amanhecer o dia" no combate ao fogo. De fazer lifting de graça no rosto com o calor das chamas. Mas os danos seriam maiores se não houvesse resistência. As brigadas profissionais mantidas por empresas em parceria com a Amda e a Terra Brasilis (Vale, Gerdau, Usiminas, AngloGold, Ferrous e Vallourec) foram fundamentais na região central do estado. E mais do que nunca, as brigadas voluntárias e os voluntários que "aparecem do nada" perguntando o que podem fazer. Em Carrancas, perto de São João del-Rei, morreram dois brigadistas.

O governo atuou por meio do PrevIncêndio, que apesar dos esforços, mostrou-se insuficiente para enfrentar a situação. Se tivéssemos caminhões pipas disponíveis, o incêndio que consumiu grande parte do Parque Estadual do Rola Moça, nos dias 11 e 12 de outubro, teria sido muito menor.

Logo que os campos queimados forem cobertos pelo verde do capim que substituirá grande parte das florestas destruídas, muita gente se esquecerá dos incêndios. Mas, considerando a concentração das chuvas em períodos mais curtos e o alongamento dos meses de seca, consequências das alterações climáticas já anunciadas há tempos pelo Painel de Mudanças Climáticas da ONU e os incendiários de plantão, a lembrança será reavivada em 2015. Talvez ainda pior. O que fazer? É a pergunta feita por todos.

É impossível acabar com os incêndios. Mas é possível diminuir a quantidade e seus danos. Prevenção, vigilância e combate são as três linhas de ação para que isso aconteça. Prevenção se faz com informação/educação pelo poder público, igrejas, escolas, empresas, clubes, associações e imprensa formando uma gigantesca corrente de intolerância social ao fogo. Emater, IMA, polícias rodoviárias, prefeituras, todos deveriam se unir. Belo Horizonte e Nova Lima recebem ICMS ecológico pelo Rola Moça e Estação Ecológica de Fechos. Mas não ajudam em nada.

É preciso vigilância e combate com planejamento, muita melhoria do PrevIncêndio, formação e estruturação de brigadas voluntárias, aumento das profissionais e criação de batalhão especializado no Corpo de Bombeiros.

A Região Metropolitana de Belo Horizonte bebe da água que brota das nascentes nas Unidades de Conservação e fora delas. São mais de quatro milhões de pessoas, das quais, grande parte acredita que incêndios são "naturais" e nem imaginam que danos eles causam e causarão às suas vidas. Elas estão blindadas pelo desconhecimento. O mesmo não se pode dizer daqueles que tomam decisões, propõem leis, gerenciam a educação, gastam dinheiro público e influenciam comportamentos da sociedade. Eles podem mudar isso.

*Maria Dalce Ricas é superintendente-executiva da Associação Mineira de Defesa dos Animais

Fonte: Revista Ecológico