Artigo de Repulsa – Exterminar Tubarões em Recife para Evitar Ataques
*Marcelo Szpilman
Nos dias de hoje ainda cabem atitudes insanas e criminosas como essa?
Ao ver o vídeo da matéria "Grupo de surfistas quer extermínio de tubarões em PE: ’tubarão na panela’" (veja no link abaixo), veiculada no site do Fantástico na semana passada (dia 18 de setembro), fiquei estarrecido com a ignorância e a insensatez que algumas pessoas insistentemente decidem pautar suas ações e opiniões.
Pichações com os dizeres "tubarão na panela", declarações comparando os tubarões a "ratos invasores que devem ser exterminados" e operações de pesca que tratam os tubarões como "inimigos" da população, são atitudes ineptas que devem ser combatidas por todos. Não há mais espaço para se admitir que cidadãos se reúnam para incentivar e perpetrar condutas insanas e criminosas, como a matança inconsequente de seres vivos na Natureza.
Em benefício do esclarecimento, pontuo abaixo, mais uma vez, o que eu penso sobre o assunto.
1 – Incentivar a captura dos tubarões para evitar ataques
Achar que exterminando os tubarões os ataques serão interrompidos é um pensamento lógico, mas completamente disparatado e antiecológico. É tão óbvio e absurdo quanto dizer que eliminando os leões na África cessarão os ataques desses animais. E é antiecológico porque os tubarões exercem um papel crucial na manutenção da saúde e do equilíbrio dos ecossistemas marinhos, incluindo o litoral pernambucano, e, sem a presença deles, as consequências serão incontroláveis – diferente dos ataques, que podem ser evitados com o simples respeito às placas de sinalização nas praias de Recife.
2 – Contribuir para a imagem sensacionalista e irreal dos tubarões
Ao acreditar que a solução para dar segurança nas praias passa por "limpar as águas infestadas por essas feras", essas pessoas contribuem para fortalecer a distorcida imagem do tubarão como um animal perverso e sanguinário e para estimular a fobia coletiva.
3 – Tratar a questão dos ataques de forma leviana
Os incidentes com os tubarões na Grande Recife começaram após um desequilíbrio ambiental provocado pelo homem, com a construção do Porto de Suape no início da década de 1990, que conjugou fatores locais específicos que aumentaram tremendamente a interação entre o homem e o tubarão e, consequentemente, os riscos de ataque. E, desde então, ataques de tubarão, com mutilações e mortes, passaram a ser um problema real que exigia soluções (foram 15 ataques somente em 1994). E para tratar do problema, pode-se atuar sobre duas pontas: os tubarões ou as pessoas.
O Comitê Estadual de Monitoramento de Incidentes com Tubarões (Cemit) fez a escolha certa e de bom-senso – atuar principalmente sobre as pessoas. Composto por representantes dos mais diversos segmentos da sociedade, o Cemit foi criado pelo Governo do Estado de Pernambuco, em maio de 2004, com o objetivo de discutir, deliberar e implantar ações recomendadas pelos workshops realizados em 1995 e 2004 (do qual participei). Desta forma, o Cemit realizou campanhas educativas, estabeleceu fiscalização, orientação e segurança nas praias e promoveu a pesquisa e o monitoramento dos tubarões.
Apesar dos interesses conflitantes dos diversos setores da sociedade pernambucana, não obstante o respeito devido aos atacados e seus familiares, os números comprovam que o Cemit fez e continua fazendo um excelente trabalho de esclarecimento e de educação dos surfistas e banhistas, com visíveis resultados na prevenção e queda dos ataques. De 1990 a 2004, foram 46 ataques com 18 fatalidades, o que dá uma média de 3,3 ataques por ano. Depois da criação do Cemit, de 2005 a 2012, houve apenas 9 ataques com 3 fatalidades, configurando uma média de 1,3 ataque por ano.
Espero que eu tenha sido capaz de me fazer entender e almejo que os órgãos competentes cumpram suas atribuições para coibir tais práticas insustentáveis.
Veja a matéria nesse link.
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*Marcelo Szpilman, biólogo marinho formado pela UFRJ, com Pós-graduação Executiva em Meio Ambiente (MBE) pela COPPE/UFRJ, é autor dos livros Guia Aqualung de Peixes (1991) e de sua versão ampliada em inglês Aqualung Guide to Fishes (1992), Seres Marinhos Perigosos (1998), Peixes Marinhos do Brasil (2000) e Tubarões no Brasil (2004). Por ser um dos maiores especialistas em peixes e tubarões e escritor de várias matérias e artigos sobre natureza, ecologia, evolução e fauna marinha publicados nos últimos anos em diversas revistas, jornais, blogs e sites, Marcelo Szpilman é muito requisitado para ministrar palestras, conceder entrevistas e dar consultoria técnica para diversos canais de TV. Atualmente, é diretor do Instituto Ecológico Aqualung, diretor do Projeto Tubarões no Brasil, membro do Conselho da Cidade do Rio de Janeiro (área de Meio Ambiente e Sustentabilidade), membro e diretor do Sub Comitê do Sistema Lagunar da Lagoa Rodrigo de Freitas e colunista da Rádio SulAmérica Paradiso FM 95,7 com o boletim ECO PARADISO, em duas edições diárias sobre meio ambiente e sustentabilidade.
Fonte: EcoDebate