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Representante da Faemg questiona importância ambiental do Cerrado

A Lei Florestal de Minas, aprovada em outubro de 2013, retirou proteção legal das áreas consideradas prioritárias para preservação da biodiversidade, que em grande maioria localizam-se no bioma Cerrado. Diante da revolta dos ambientalistas frente à posição do governo do estado que se manteve omisso quanto à mudança da lei, foi criado um Grupo de Trabalho para discutir estágios sucessionais do mesmo, já que este foi um dos argumentos utilizados para retirar a proteção legal. Representantes da Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) e parlamentares diziam que não existem parâmetros técnicos para definir o que é, por exemplo, estágio inicial de recuperação, ao contrário do que já foi definido para a Mata Atlântica.

Na primeira reunião do grupo, ocorrida em dezembro de 2013, o representante da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de Minas Gerais (Faemg), Carlos Alberto Santos Oliveira, causou surpresa ao dizer que se o Cerrado não foi contemplado como patrimônio nacional na Constituição Federal é porque sua importância é limitada.

Conforme ata da reunião disponibilizada hoje (09) pela Semad, suas palavras foram: “Eu nem me atrevo, mas também acho que temos que dar um choque de cultura neste grupo. Se não existe legislação, se não entrou na Constituição e se pouca gente se movimenta para dar essa importância ao Cerrado, é porque ele tem uma importância ambiental possivelmente limitada. Não estou contra a proteção do Cerrado, o que estou querendo chamar a atenção, com veemência, é que a importância ambiental do Cerrado tem uma limitação.”

Para Lígia Vial, assessora jurídica da Amda, a fala do representante da Faemg não causou tanta surpresa por ser coerente com a postura arcaica da instituição. “A Faemg sempre vota a favor do desmatamento, seja de Cerrado, Mata Atlântica ou qualquer outro ambiente, independente de sua importância para proteção da água, solo e biodiversidade”, disse.

Mas a declaração do representante aponta para conflito dentro do GT. Para Lígia, não há como se discutir uma norma que vai subsidiar tecnicamente a decisão do órgão ambiental nos processos de supressão de vegetação nativa pertencente ao Cerrado, sem que antes se reconheça a extrema importância de conservação do bioma.

Segundo o Ministério do Meio Ambiente, o Cerrado é considerado como um dos hotspots mundiais de biodiversidade, pela extrema abundância de espécies endêmicas e sofre uma excepcional perda de habitat. O Cerrado brasileiro é reconhecido como a savana mais rica do mundo em biodiversidade, abrigando 11.627 espécies de plantas nativas já catalogadas. Existe uma grande diversidade de habitats, que determinam uma notável alternância de espécies entre diferentes fitofisionomias. Cerca de 199 espécies de mamíferos são conhecidas e a rica avifauna compreende cerca de 837 espécies. Os números de peixes (1.200 espécies), répteis (180 espécies) e anfíbios (150 espécies) são elevados. A quantidade de peixes endêmicos não é conhecida, porém os valores são bastante altos para anfíbios e répteis: 28% e 17%, respectivamente. De acordo com estimativas recentes, o Cerrado é o refúgio de 13% das borboletas, 35% das abelhas e 23% dos cupins dos trópicos.

Além dos aspectos ambientais, o Cerrado tem grande importância social. Diversas populações sobrevivem de seus recursos naturais, incluindo etnias indígenas, quilombolas, geraizeiros, ribeirinhos, babaçueiras, vazanteiros e comunidades quilombolas que, juntas, fazem parte do patrimônio histórico e cultural brasileiro e detêm um conhecimento tradicional de sua biodiversidade. Mais de 220 espécies têm uso medicinal e mais 416 podem ser usadas na recuperação de solos degradados, como barreiras contra o vento, proteção contra erosão ou para criar habitats de predadores naturais de pragas. Mais de 10 tipos de frutos comestíveis são regularmente consumidos pela população local e vendidos nos centros urbanos, como os frutos do pequi (Caryocar brasiliense), buriti (Mauritia flexuosa), mangaba (Hancornia speciosa), cagaita (Eugenia dysenterica), bacupari (Salacia crassifolia), cajuzinho do cerrado (Anacardium humile), araticum (Annona crassifolia) e as sementes do barú (Dipteryx alata).