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Opinião

Estudo revela que o atum está prestes a ser extinto

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*Amelia Gonzalez

Estudo recente, publicado pela revista Fisheries Research, o primeiro a estimar o volume de atum retirado dos oceanos, revelou que cerca de seis milhões de toneladas deste peixe são capturadas anualmente. Tal demanda, que vem sofrendo um aumento contínuo desde o fim da II Guerra, quando o uso da tecnologia permitiu à indústria alimentícia servir atum enlatado e, com isso, caiu nas graças dos cidadãos, corre o risco de levar as populações de atum a níveis insustentáveis e possível extinção. A facilidade para estocar em compartimentos refrigerados também contribuiu para o que, segundo se constata hoje, tem sido o colapso deste peixe em todo o mundo.

A pesca de atum existe há mais de 40 mil anos, segundo o estudo, e o Japão foi o primeiro país a fazer pesca industrial de atum, na década de 1920, investindo em operações de barcos de isca nas Ilhas do Pacífico. Atualmente, segundo relatório da Food and Agriculture Organization (FAO), agência das Nações Unidas que lida com os esforços para administrar a alimentação no mundo, a pesca de atum está em seu nível mais alto: em 2014 foram 7,7 milhões de toneladas desta espécie retiradas do oceano.

É uma atividade bastante lucrativa. E os pesquisadores descobriram também que 67% das capturas de atum do mundo são feitas no Oceano Pacífico por frotas japonesas e americanas, 12% no Oceano Índico e 12% no Atlântico.

Em entrevista ao britânico “The Guardian”, a pesquisadora Angie Coulter, da iniciativa Sea Around Us da Universidade da Colúmbia Britânica, o declínio das populações de atum não vão impactar apenas os humanos, que perderão este sabor à mesa. A falta deste peixe nos oceanos pode ameaçar a cadeia alimentar subaquática, e isto é um problema ainda maior, que dá conta da nossa perda de biodiversidade.

“Se perdermos atum devido à superexploração, romperemos esses links na cadeia alimentar e atrapalharemos a função do ecossistema. Isso significa que a sobrevivência de outras espécies no ecossistema também está ameaçada”, disse ela.

A questão maior é que o atum é pescado de uma forma que acaba impactando outros peixes, que são levados inadvertidamente pelas redes. Entre eles está o tubarão azul, que leva muitos anos para amadurecer e não produz muitos filhotes. A pior parte é que os tubarões não servem de alimento para ninguém: apenas se retiram suas barbatanas para vendê-las nos mercados.

Se este tipo de atividade completamente predatória não nos serve para refletir sobre o tipo de civilização que estamos construindo, não sei o que mais servirá. O freio de emergência precisa ser puxado já, como lembra Luiz Marques do “Capitalismo e Colapso Ambiental”, livro que já está na segunda edição (Ed. Unicamp).

Marques elenca outros tantos números que confirmam o colapso da biodiversidade do meio aquático. Desde o início do século esta preocupação vem aumentando com a proliferação das fazendas aquáticas, que produziram, só em 2012, 90,4 milhões de toneladas de peixes. Tais lugares surgiram nos anos 70, justamente na década da primeira Conferência Mundial sobre Meio Ambiente realizada em 72 em Estocolmo. Foi quando se ouviram, publicamente ao menos, os primeiros sinais de que a natureza estava perdendo a capacidade de se recuperar de tanto extrativismo.

A resposta aos sinais da natureza, no setor pesqueiro, foi criar tais cativeiros, alimentar os peixes com rações feitas quimicamente, o que também contribui para uma insustentável produção agrícola. Além disso, criados em cativeiro, tal como galinhas, porcos ou bois, os peixes também se estressam, não têm espaço para nadar, a vida fica sem sentido. E há ainda uma perigosa interação, sobretudo na China, entre os esgotos, os dejetos de origem industrial ou agrícola e a poluição causada pelas próprias fazendas. No país asiático, onde se come mais peixes criados em cativeiro do que pescados naturalmente, tal poluição devastou os habitats marinhos.

A sobrepesca é outro fator que colabora, em escala global, para o declínio dos peixes.

“Em 1950, 2,5 bilhões de pessoas consumiram 19 milhões de toneladas de peixes. Em 2012, sete bilhões de pessoas consumiram 158 milhões de toneladas de peixes. Em 63 anos, portanto, o consumo de peixe multiplicou-se por 8,3, sendo que o consumo per capita triplicou. Segundo algumas estimativas, o mercado global de alimentação marinha deve crescer outros 50 milhões de toneladas em 2025. Tais estimativas são, evidentemente, irrealistas em face da rápida e bem documentada exaustão desses recursos”, escreve Queiroz.

Segundo o autor, em 2012, os lagos, rios e mares eram vasculhados por 4,7 milhões de barcos e navios pesqueiros em busca dos cardumes declinantes de peixes. Lançado em 2015, o relatório Living Blue Planet, da ONG WWF, mostrou um declínio de 49% nas populações marinhas em escala global no curso de uma única geração. Há cotas, fixadas em acordos internacionais, que são recorrentemente desrespeitadas, segundo a comissária europeia para a pesca, Maria Damanaki, citada por Luiz Marques.

O que se quer, com este alerta, não é, senão, sugerir que se troque, na dieta, os peixes mais usados por tantos outros, também comestíveis e que não estão na lista vermelha de extinção. O que se quer, ao fim e ao cabo, é promover a mudança necessária para promover melhor qualidade de vida. Especificamente com relação à perda das espécies marinhas, em parte esta mudança dependerá de nós, cidadãos comuns, na hora de fazermos escolhas para comprar. Em parte, porém, a mudança também exigirá que a indústria alimentícia deixe seu lugar confortável, de lucro fácil e garantido, para investir em outras possibilidades que, talvez, num primeiro momento, não deem respostas tão eficazes.

Sem pensar em vilanizar os esforços cometidos, legitimamente, em prol de alimentar os humanos, é possível tecer uma outra rede. Sem culpas ou culpados, é possível sair da esfera política/econômica e partir, verdadeiramente, para conseguir soluções que possam ajudar a manter por mais tempo a humanidade no planeta. E em condições de se alimentar e viver dignamente.

*Amelia Gonzalez é jornalista

Fonte: G1