Opinião

Fundação Parques e Jardins tem quatro mil mudas para plantar no Rio

*Amélia Gonzalez

A comoção que causa o corte de uma árvore só é comparada à de quando se vê bicho sendo maltratado na rua. E assim, ontem, fui recebendo mensagens de pessoas aqui do bairro onde moro (Laranjeiras) indignadas com a retirada simultânea de duas espécies muito frondosas.

“Deixaram só o toco! Eu fui lá, reclamei, um vizinho veio me dizer que eu estava errada, me xingou. Foi uma confusão danada. Mas é um absurdo o que estão fazendo! Retirando nossa respiração, nosso verde, nossas sombras. Quando chegar o verão é que vão ver no que vai dar”, desabafou uma vizinha.

Passei pelo local. De fato, há três tocos muito próximos uns dos outros, como a repórter Alba Valéria, aqui do G1, já registrou. Além de enfear bastante o cenário, causa uma legítima preocupação.

Fiz as fotos e segui adiante, refletindo sobre o que já sabemos, depois de ouvir vários especialistas, que esta é uma das grandes encrencas no cenário urbano. Lembro-me bem de um texto que escrevi com ajuda de vários autores, em que um deles me desenhou o que parece óbvio mas que fica nublado diante da emoção de ver um ser vivo sendo decepado: “Árvores nascem, crescem e morrem. Quando morrem, precisam ser retiradas. É difícil as pessoas entenderem isso”.

Sim, é difícil. Eu mesma já estava indignada demais com os três tocos de árvore tão próximos que havia visto. Conversei com os funcionários da Comlurb, e eles me disseram o que dizem sempre: são árvores que trazem algum tipo de risco até à vida das pessoas e precisam ser cortadas. A minha indignação, no entanto, foi bastante arrefecida quando, passando de ônibus em frente ao Palácio Guanabara, que fica na rua Pinheiro Machado, o motorista estancou e saiu correndo do veículo para ajudar porque um pouco mais adiante uma árvore tinha caído sobre um táxi.

Fiz a foto da confusão. Não estava nem ventando, para culpar o evento pela queda da árvore. Felizmente nada de grave aconteceu à família que estava dentro do táxi. O carro teve perda total, mas o seguro deve pagar. Seguimos, o motorista deu marcha-à-ré, pegou a outra pista, fez um caminho alternativo. Deixamos para trás, como não podia deixar de ser, um nó no trânsito. Ainda bem que era um domingo, dia de menos movimento.

A indignação, portanto, precisa contemplar todos os fatos que envolvem a questão.

Hoje pela manhã, ainda com a cena da árvore sobre o carro, consegui conversar com o novo presidente da Fundação Parques e Jardins, Fernando Gonzalez. Ele estava em Campo Grande, participando de um evento de plantação de mudas, e me contou que o Rio está com este problema, em grande parte, porque houve há cerca de trinta, quarenta anos, fícus e amendoeiras, os grandes inimigos de calçadas e fiações, foram plantados por cidadãos, sem nenhum estudo.

“Hoje mesmo estamos aqui, numa pracinha em Campo Grande, e um senhor acabou de plantar três amendoeiras. Tivemos que retirá-las, ele até chorou. Mas não podemos deixar porque elas foram plantadas do lado de um alambrado. Vamos plantá-las em outro lugar. Amendoeiras são árvores imensas e causam muito estrago quando caem”, disse Gonzalez.

Já a história do fícus passa pelo modismo. Na década de oitenta as pessoas o plantavam em casa, em vasos, achavam bonito. Quando viam que ele crescia demais, o levavam para enfeitar a rua. A intenção era das melhores, claro, mas ninguém calculou o estrago.

“Hoje temos um grande problema na Avenida Visconde de Albuquerque, aqueles fícus são árvores frondosas, suculentas, que retém muito líquido. Há estudos que dizem que uma árvore dessas pode cair com ventos de até 40km/hora. Temos um estudo, feito pela Comlurb, para retirá-los todos dali e plantarmos árvores novas. A população não vai gostar”, disse-me ele.

Não sei se a população vai reclamar tanto se a operação for casada, como o próprio Fernando Gonzalez recomenda. Atualmente, quem faz a poda e retirada é a Comlurb: a empresa manda um engenheiro para a avaliação e ele é quem coordena a operação. O ideal seria que a Fundação Parques e Jardins entrasse imediatamente, no dia seguinte, trazendo suas mudas. Segundo Gonzalez, há cerca de quatro mil mudas no Horto da instituição, na Taquara, esperando espaço para serem plantadas.

“O problema é que para tirar o tronco é difícil. São três passos: primeiro faz o corte, deixa o tronco, mas para retirar o tronco destrói a calçada. A calçada precisa ser recomposta pela Secretaria Municipal de Conservação e Meio Ambiente e só depois é feito o plantio. Assumi há 15 dias a Fundação, vamos começar a fazer isso porque tem muito toco mesmo pela cidade”, disse Gonzalez.

O presidente recém-eleito gosta de lembrar que serão plantadas 790 mudas na Avenida Marthin Luther King (antiga Automóvel Clube, em Irajá) que servirão, depois de adultas, como uma boa sombra, sobretudo para quem usa o corredor para fazer corridas e caminhadas. É uma ótima iniciativa, não há dúvida. Mas, e os tocos que andam perturbando a população?

Tentei contato com a Comlurb, mas não conseguimos sincronizar nossos horários. Hoje o órgão está mudando a diretoria, e deve estar meio confuso por lá. Seja como for, Paulo Gustavo Moraes Mangueira, o novo presidente, já vai entrar com a tarefa de fazer parceria com a Fundação Parques e Jardins, com a Secretaria de Conservação, e livrar a cidade dos tocos, além de ajudar a plantar as quatro mil mudas. Vamos precisar delas. O verão chega daqui a pouco mais de três meses, e a cidade não pode ficar ainda mais quente e acalorada do que já é normalmente.

E a cobrança vai ser grande. Aqui em Laranjeiras, alguns moradores estão se reunindo para oficializar o protesto contra a retirada das árvores, entendendo que são fontes de oxigênio e saúde.

Não dá para não registrar que na capital baiana começa hoje a Semana Latino-americana e Caribenha sobre Mudança do Clima. Discute-se ali, de maneira macro, o que aqui em Laranjeiras está tentando se resolver de maneira local. Se aqui o corte de algumas árvores está gerando, legitimamente, uma comoção tamanha, imaginemos se as pessoas se dessem conta de quantas árvores são mortas no mundo em nome do desenvolvimento e do progresso?

Pode não ser rápido, mas é um processo de contágio, este da consciência ambiental. E essas pequenas manifestações vão me deixando mais animada, com esperança de que se consiga mudar paradigmas para uma melhor qualidade de vida.

*Amélia Gonzalez é jornalista

Fonte: G1