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Opinião

Ativistas conseguem alguns avanços na política climática mundial

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*Amélia Gonzalez

Se aqui no Brasil está difícil convencer os donos do poder de que é preciso manter a floresta em pé e batalhar por uma economia de baixo carbono; que os bens naturais não são infinitos, portanto não se pode permitir que empresas se sintam à vontade para extraí-los; e que os povos indígenas devem ser tratados com respeito por conta de sua relação respeitosa com o meio ambiente, lá fora os ambientalistas andam tendo vitórias interessantes no setor. E nesta sexta-feira (2), especificamente, decidi dar espaço para tais comemorações. Quem sabe estes exemplos que vou listar a seguir possam inspirar ou, ao menos, sirvam como conteúdo para boas reflexões.

Na Polônia

Uma empresa de advogados ambientalistas, chamada Client Earth obteve uma grande vitória ao conseguir embargar a obra de mais uma usina de carvão no país, a Ostroleka C. O projeto é de 1 bilhão de euros, mas tanto especialistas em energia, quanto pessoas ligadas ao mercado financeiro polonês estavam preocupados, achando que seria um investimento pesado em um empreendimento que já nasceria criando problemas ao meio ambiente.

O que leva à preocupação dos financistas é que o custo das energias renováveis naquele país está despencando e, consequentemente, o preço do carvão está indo para as alturas.

“Desde o final de 2016, quando os planos para a construção da usina foram retomados, os preços do carbono da União Europeia subiram quatro vezes, de menos de 6 euros para quase 30 euros por tonelada. A planta está altamente exposta a esses riscos”, escrevem os advogados no texto em que detalham o processo que ganharam.

Ocorre que a pressão internacional, que tem avançado sobretudo depois da assinatura do Acordo de Paris em 2015 – quando os países das Nações Unidas se comprometeram a manter o aquecimento do planeta em 1,5 a 2 graus em relação aos níveis pré-industriais – faz com que as principais empresas de energia da Polônia estejam investindo em renováveis, como a eólica. Com isso, inclusive, está aumentando a oferta de empregos neste setor.

Apesar de se poder comemorar este passo polonês em busca de energia mais limpa, não dá para fechar os olhos à realidade, que torna complexo o caminho até a meta combinada em Paris. Das 30 centrais termelétricas movidas a carvão mais sujas da Europa, o Reino Unido e a Alemanha possuem 20 e a Polônia, quatro. Se o carvão é desvantajoso em relação ao petróleo e ao gás em termos energéticos, também é tanto ou mais ainda em termos ambientais.

“O carvão polui o ar, as águas e os solos em todas as fases de seu ciclo industrial, da extração ao transporte, à lavagem, à queima, aos rejeitos após a queima e aos impactos ambientais das minas abandonadas”, lembra Luiz Marques em “Capitalismo e Colapso Ambiental” (Ed. Unicamp).

Na Turquia

Em março deste ano, a mais alta corte administrativa do país bloqueou uma importante usina a carvão em Bartin, na costa do Mar Negro. Foi uma vitória dos ativistas, documentada pelo site Climate Home News. Mais de duas mil pessoas, número recorde de demandantes individuais para um caso de tribunal ambiental no país, assinaram a petição.

A preocupação de todos era o impacto da usina sobre a saúde das pessoas, sobre o impacto no meio ambiente e sobre o turismo. E o mais interessante é que Bartin é uma região carbonífera, ou seja, abre empregos a cada usina instalada. Ozlem Katisoz, da Fundação Turca para o Combate à Erosão do Solo, disse para a reportagem do site que o carvão é até motivo de orgulho da maioria das pessoas.

“Mas isso foi superado pelas preocupações sobre os impactos do projeto – e os rumores de que precisariam de combustível importado, bem como doméstico, não ajudaram na opinião pública”, disse ela.

Na França

O Aeroporto de Marseille-Provence foi forçado a rever seus planos de expansão, depois que as autoridades ambientais questionaram as obras porque elas não se encaixam com as metas climáticas da França assumidas em junho. Caso o aeroporto seja aumentado, os impactos ambientais serão muito fortes: serão até 7,5 milhões de passageiros extras por ano a partir de 2027.

Isto não combina, de forma alguma, com o objetivo de zerar as emissões de carbono no país até 2050. Um caso, entre muitos que se vê nos discursos de alguns dirigentes, de distância entre intenção e gesto. Segundo o site Climate News Change, apesar de a aviação ser uma das fontes de emissões de carbono que mais cresce no mundo, ela tem sido excluída dos planos climáticos nacionais pelo fato de operar além das fronteiras.

“No entanto, tanto a França quanto o Reino Unido, ao legislar metas de neutralidade de carbono, foram aconselhados por especialistas independentes a assumir a responsabilidade pela pegada de carbono dos voos de e para seu território”.

Como não podia deixar de ser, os aeroportos nacionais da França se preocuparam. Em declaração que assinaram em conjunto, afirmam que “Qualquer aumento nas emissões de carbono não é motivo para recusar o consentimento do desenvolvimento, a menos que o aumento das emissões de carbono resultante do projeto seja tão significativo que tenha um impacto material na capacidade do governo para cumprir suas metas de redução de carbono, incluindo orçamentos de carbono”. Faltou especificar o que, para eles, é “significativo”.

Na Austrália

Bem, caros leitores, minha ideia era manter em alta nossa esperança de que é possível crer em mudanças de paradigma a partir destes pequenos casos que descrevi acima. No entanto, a notícia que chega dos países que estão participando do Fórum de Desenvolvimento das Ilhas do Pacífico em Fiji não nos deixa com tanta margem de esperança. É que a Austrália é um dos países que tem se negado a levar a sério as metas de baixo carbono necessárias para manter o aquecimento do planeta abaixo de um nível catastrófico, sobretudo, para as nações-ilha.

Eis que aquele país está usando uma estratégia que seus pares não consideram correta, talvez nem mesmo ética, ao usar créditos de transferência antigos, do Tratado de Kyoto, como um atalho para cumprir suas metas em 2030. Trata-se de manipulação de dados, o que é uma atitude quase infantil e, certamente irresponsável, se considerarmos que a necessidade de baixar emissões não é imperativa apenas para um país, mas para o planeta inteiro.

*Amélia Gonzalez é jornalista
Fonte: G1