Opinião

Reflexões sobre o colapso ambiental e como evitá-lo

*Amelia Gonzalez

Nesta sexta-feira (21) começa o inverno no Hemisfério Sul. Estação com temperaturas mais amenas, que podem ser um convite à reflexão. Assim esperamos nós, que cuidamos do tema meio ambiente, que pesquisamos e divulgamos notícias que possam provocar uma nova ética, um decrescimento consciente, uma recolocação das corporações. Não dá mais para fazer negócio como sempre (“business as usual”) sem levar em conta o fato, mais do que comprovado pelos cientistas, que a humanidade está acelerando, com o uso excessivo de combustíveis fósseis, o aquecimento da Terra.

Para ajudar neste momento mais reflexivo, não faltam informações. Cientistas em todo o mundo estão trabalhando dobrado, muitas vezes de maneira voluntária, para atualizar os dados. E as revistas científicas não poupam espaço para divulgá-los. Ato contínuo, jornalistas de todo o mundo os repercutem. Só nesta semana, um estudo publicado pela revista “Science Advances” mostrou que as geleiras do Himalaia estão derretendo duas vezes mais rápido.

A mesma revista, no mesmo estudo, provou também que a manta de gelo da Groenlândia também está baixando numa velocidade espantosa. A ponto de os cientistas afirmarem que o fenômeno pode contribuir para que o mar aumente de cinco a 33 centímetros até o fim do século. Não é pouca coisa. Trocando em miúdos, estamos falando de vidas humanas que vão se perder a rodo, não só nas cidades litorâneas – só aqui no Brasil, 60% da população vivem nesses locais – como nas nações-ilha do Pacífico, que estão condenadas a desaparecer.

Mas, mesmo com tanta informação circulando, ainda há os negacionistas. E, mesmo com tanta informação circulando, os cidadãos comuns ficam, muitas vezes, sem saber o que fazer, como agir, para ajudar a diminuir tanto impacto. Há várias coisas para se fazer singularmente, em família, a fim de levar uma vida com uma pegada ecológica menor. Diminuir o consumo de carne, de automóvel, de plástico, reciclar seu lixo, fazer uma composteira em casa, ir menos às compras e olhar mais o que está sobrando na geladeira, consumir menos. Pode soar para muitos como um comportamento extremamente reducionista. O convite é descobrir outros valores.

E vamos também olhar para os lados, pressionar aqueles que fazem leis a se posicionarem de forma a colaborar com a empreitada por uma melhor qualidade de vida, respeitando outros valores que não apenas o econômico. Num livro muito importante, que não deve faltar na estante de quem quer refletir a respeito – “Capitalismo e Colapso Ambiental” (Ed. Unicamp) – o professor de Historia e escritor Luiz Marques fala sobre o sistema representativo clássico e lembra que os representantes devem “retornar regularmente a seus eleitores para se assegurar do bem-fundado de suas políticas”.

Estamos em tempos, segundo Marques, da “maior emancipação da história das conquistas da cidadania”: “O direito inalienável e o dever que nos incumbe agora de integrar em nosso juízo político a informação científica básica acerca dos impactos humanos sobre o estado da biosfera”.

Sendo assim, não custa lembrar, por exemplo, que o atual governo federal se coloca como negacionista das mudanças climáticas. E que só nestes primeiros seis meses da gestão Bolsonaro, 169 pesticidas foram liberados, com registros aprovados e publicados no Diário Oficial. Segundo informações do site da ONG Repórter Brasil, somente 5% deles são totalmente produzidos no Brasil.

Os ambientalistas estão preocupados. E parte da população também. O que vem ocorrendo cada vez mais, no entanto, diante da crise que se instalou no país, é que a escolha, na hora da compra, é pelo preço. E os produtos mais baratos, em geral, são aqueles produzidos em massa, que vêm embalados e cheios de substâncias que não ajudam em nada a qualidade de vida do cidadão.

Vale pensar duas vezes, no entanto. E pôr na balança o sentido da vida, bem maior do que qualquer outro.

Voltando ao livro de Luiz Marques, extenso, intenso, bom de se ler em partes para ruminar e absorver as informações, na conclusão de suas reflexões o ator descreve a diferença crucial entre a situação do homem e de suas aspirações sociais no século XX e no século XXI.

“O século XX nos ensinou, e o fez à maneira dura, a não mais aceitar a vanidade e a arrogância de quem se julga no direito de tirar da cartola a receita do que é ‘melhor’ para a sociedade, seja ele o filósofo, o cientista, o economista, o líder religioso, o líder liberar ou o partido ‘de vanguarda’ de Lênin…. Não é mais ponto da pauta de hoje debater sobre a ‘melhor’ sociedade. O que hoje está em pauta é apenas como evitar o colapso ambiental que nos ameaça e que põe em risco a sobrevivência de qualquer sociedade complexa”, escreve ele.

É sobre vida que estamos falando e refletindo neste início de inverno que, segundo todas as previsões, não vai nos proporcionar, pelo menos aqui pela Região Sudeste, mais do que apenas poucos dias frios. E já que a proposta é se aquietar um pouco mais, convido os leitores a fazerem silêncio por 40 segundos a fim de ouvir este cântico sereno de uma das baleias mais raras do planeta. Hoje elas são em apenas 30, no Oceano Pacífico, deram-lhes o nome de Franca, e alguns biólogos marinhos, pesquisadores da Administração Nacional Oceânica e Atmosférica (Noaa) capturaram o som usando gravadores acústicos ao longo de oito anos.

A reportagem do jornal “The Guardian” descreve a experiência, reproduz o som e, é claro, como foi acontecer, conta que a origem da história que explica o fato de serem apenas 30 baleias Franca no mundo é o homem. Baleeiros quase acabaram com todas. Portanto, é quase uma dádiva poder ouvi-las cantando (é um macho que está emitindo os sons que vocês vão ouvir). Uma homenagem à vida.

*Amelia Gonzalez é jornalista

Fonte: G1