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Opinião

Gestão Bolsonaro não piorou a transparência ambiental… Mas vai melhorar?

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*Gustavo Faleiros

Nos últimos dez anos, tomou corpo a ideia de que, graças às tecnologias de informação, os governos se tornariam mais ‘transparentes’. Por ora, no entanto, essa é uma verdade parcial ou, talvez, um desejo não realizado.

Parece trivial pedir aos representantes públicos que prestem contas de seus gastos e ações através da internet, mas a resistência demonstra que esta abertura atemoriza os poderosos.

Na Câmara e no Senado, por exemplo, a livre consulta dos salários de servidores públicos foi uma batalha. Especialmente na nossa ‘câmara dos lords’, em anos de José Sarney e Renan Calheiros, dificultou-se a transparência.

No campo ambiental, entretanto, há uma cultura de dados abertos. Basta lembrar que antes mesmo da Lei de Acesso à Informação, já existia uma lei de acesso à informação ambiental (Lei nº 10.650/2003).

Foi através desta lei, por exemplo, que o presidente do Ibama em 2007 concedeu acesso a este mesmo O Eco ao parecer dos técnicos do órgão que recomendava a não concessão das licenças às hidrelétricas do rio Madeira. O acesso esclareceu a sociedade sobre os problemas daquelas obras. Mas não mudou nada. O parecer contrariou Lula e hoje as usinas estão funcionando bem ali em Porto Velho.

Ainda sobre os bons precedentes na transparência ambiental, vale dizer que as políticas públicas de combate ao desmatamento deram provas ao longo dos anos de uma cultura de livre circulação de conhecimento .

Hoje as metodologias, softwares e dados dos programas de monitoramento por satélite da Amazônia (Prodes e Deter) inspiram ações de transparência em outros países da bacia amazônica e também na África.

Passados 100 dias do governo Bolsonaro, algo com relação a esta situação mudou? Melhorou ou piorou? Ficou na mesma?

Bem, apesar das notícias sobre a ‘circular’ do ministro Ricardo Salles que proíbe os servidores ambientais a manifestarem-se sem a prévia anuência, não foi possível identificar ações diretas para coibir o acesso a dados e informações.

O que salta aos olhos logo nestes três primeiro meses é a perda da consistência na informação.

Por exemplo, não se encontra mais menção às áreas prioritárias para conservação da biodiversidade. Os mapas e bases de dados que estavam no ar sumiram do site do Ministério do Meio Ambiente.

Na gestão de Bolsonaro a informação ambiental pode ter tratamento similar ao que ocorreu no EUA de Trump. Lá, páginas do governo e bases de dados que não são do interesse (ou ideologia) vigente vão lentamente desaparecendo.

Alguns exemplos: página de download de dados do Ministério do Meio Ambiente está parada, não há atualização. O Centro de Sensoriamento Remoto do Ibama até poucos dias estava fora do ar. Parecia que alguém havia esquecido de pagar a conta da hospedagem do site. Voltou ao ar, mas os dados que estão ali são bem antigos.

Por ora, as bases de dados sobre embargos e autuações do Ibama seguem acessíveis. Os registros voltam a 1980 e permitem ver muito bem quem já pagou ou deixou de pagar as multas por infração ambiental. Os dados referentes às emissões de Documentos de Origem Florestal (DOF) que por anos ficaram guardados continuam completos e prontinhos para uma análise cuidadosa . O site de dados abertos do Ibama continua de pé

Mas obviamente existem caixas-pretas. E não são poucas. Menciono aqui aquela que no momento mais consternação me causa: os planos de manejo florestal aprovados pelos Estados.

Recentemente em uma viagem à Rondônia, foi simplesmente impossível obter estas informações juntos aos servidores da Secretaria de Desenvolvimento Ambiental (SEDAM). O cenário não é diferente no Pará e no Mato Grosso, os estados com maior desmatamento da Amazônia.

Esse cenário não foi causado por Bolsonaro ou Ricardo Salles, mas sim por governos anteriores que resolveram descentralizar a gestão florestal sem estruturar o Sistema Nacional de Meio Ambiente (Sisnama). Mas quem sabe não sejam eles, os novos governantes, quem consigam mais transparência dos estados na gestão de nossas florestas.

* Gustavo Faleiros é Jornalista com mestrado em Política Ambiental.Atualmente é editor do InfoAmazônia.

Fonte: O Eco