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Agropecuária reduz território de animais ameaçados na Amazônia e Cerrado

Agropecuária reduz território de animais ameaçados na Amazônia e Cerrado
Tatu-bola perdeu mais da metade de sua área de ocorrência. Crédito: © Adriano Gambarini / WWF-Brasi

A conversão da vegetação nativa em cultivos de soja e pasto para gado já é a principal ameaça à biodiversidade na Amazônia e Cerrado, revelou novo estudo do WWW-Brasil. A maior parte das espécies analisadas perdeu entre 25% e 65% da área original de distribuição, sobretudo no Cerrado, onde as plantações e pastagens já ocupavam, em 2021, 40% do bioma.

O estudo avaliou 486 espécies, sendo 183 aves, 101 anfíbios, 118 mamíferos e 84 lagartos e serpentes. O levantamento mostra que mais de 99% sofrem com a perda de habitat, incluindo espécies emblemáticas, como o lobo-guará (Chrysocyon brachyurus) e o tatu-canastra (Priodontes maximus), que tiveram mais da metade de sua área de ocorrência destruída.

Entre as espécies que perderam mais de 80% de sua área até 2019 estão a perereca Dendropsophus cerradensis, endêmica do Cerrado, e a rãnzinha Elachistocleis carvalhoi, restrita à Amazônia brasileira. Ambas ocorrem em territórios com menos de 50 quilômetros quadrados, por isso qualquer alteração no ambiente exerce grande pressão sobre elas.

De acordo com a pesquisa, as perdas aumentaram em até 20 vezes entre 2014 e 2019, concentrando-se no sul da floresta amazônica e no nordeste do Cerrado, no Matopiba, que abrange parte do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia. A região abriga 44% do que ainda está preservado no bioma, e se tornou uma das regiões mais ameaçadas do país.

Enquanto, na Amazônia, grande parte das espécies perdeu até 20% de sua área, no Cerrado, a maioria sofreu com perdas de 30% a 70%. Considerado berço das águas e a caixa d’água do país, a savana brasileira é o lar de inúmeras espécies únicas, que não ocorrem em nenhum outro lugar no mundo, e criticamente ameaçadas.

“O setor privado brasileiro já tem bons exemplos de como ampliar a produção, sem desmatar, e um deles é a Moratória da Soja na Amazônia, acordo multissetorial que desde a sua assinatura promoveu drástica redução da destruição causada pela soja”, afirmou Frederico Machado, Líder de Conversão Zero do WWF-Brasil. Para ele, é necessário igual comprometimento do setor de soja com o Cerrado, assim como do maior esforço do setor pecuário em não desmatar.

Perda de biodiversidade prejudica economia

As perdas servem para alertar que partes importantes dos ecossistemas estão desaparecendo, junto dos serviços prestados por eles. O estudo aponta que destruir o habitat de espécies como o pato-mergulhão, associado a rios e nascentes, atinge diretamente outros recursos naturais, um alerta adicional em tempos de escassez hídrica.

O levantamento também cita a cuíca como exemplo do impacto socioeconômico da perda de espécies. Este marsupial, que é predador da principal praga da soja, o percevejo marrom, já perdeu cerca de 67% de seu habitat no Cerrado, o que impacta diretamente a produção agrícola.

“É essencial a mudança de mentalidade das empresas e do governo: a destruição do ecossistema é desnecessária, pois já existem áreas suficientes para a expansão do agronegócio – que inclusive, já está sendo prejudicado com quebras de safras constantes por conta da degradação ambiental”, destacou Mariana Napolitano, gerente de Ciências do WWF-Brasil.

O levantamento aponta a criação de áreas protegidas como uma das formas de proteger o pouco que restou. Na região Centro-Sul do Cerrado, as unidades de conservação (UCs) são o último refúgio para várias espécies, como a codorna-mineira (Nothura minor), que já perdeu mais de 72% de sua área e ocorre quase exclusivamente em UCs, como os parques nacionais de Emas, de Brasília e da Serra da Canastra.

“Estas populações dependem dramaticamente da manutenção e consolidação das unidades já criadas, mas também de ações de restauração planejadas para maximizar a conexão entre áreas isoladas”, indicou o relatório.