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Salles passa “boiada” no Conama e acaba com proteção de mangues e restingas

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Após enfraquecer a participação da sociedade civil no Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama), o caminho ficou livre para o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, passar a “boiada” sobre a legislação ambiental. Nesta segunda-feira (28), o colegiado revogou resoluções que protegiam restingas, dunas e mangues, previam licenciamento para projetos de irrigação e controle de poluição atmosférica.

Uma delas foi a 284/2001, que determinava licenciamento ambiental de empreendimentos de irrigação. A dispensa do licenciamento pode ser considerada precursora de verdadeira tragédia socioambiental, já que a disponibilidade de água em grande parte do país reduz-se a cada dia em função da demanda, desmatamento e alterações climáticas. Segundo a Agência Nacional de Águas (ANA), o setor agropecuário consome 72% da água disponível.

O licenciamento prevê, por exemplo, que a disponibilidade de água seja avaliada, sob parâmetros ambientais e sociais, considerando que, legalmente, a primeira prioridade é abastecimento humano. Sem ele, os inúmeros conflitos por uso da água instalados no país, tendem a explodir.

Para Dalce Ricas, superintendente da Amda, Minas Gerais é um dos estados que mais sofrerá, pois segundo o Instituto Mineiro de Gestão das Águas (Igam), Minas já enfrenta dezenas de conflitos pelo uso da água. A maioria, em regiões de grande demanda de irrigação.

Dalce cita exemplos como o rio Verde Grande, seco em vários pontos pela retirada de água pelo agronegócio. A revogação atende demanda da Confederação Nacional da Agricultura (CNA) que alega não haver embasamento técnico/legal para a mesma. Ironicamente, o Ministério do Meio Ambiente (MMA) não apresentou estudos que confirmem a afirmativa.

A Resolução 302, também revogada, versa sobre a proteção de margens de reservatórios e barragens. Sua revogação significa que as concessionárias de energia, água e irrigantes estão liberadas. Não precisarão compensar os gigantescos impactos sobre rios, florestas, fauna e paisagens, preservando ou reflorestando suas margens e observando aspectos sociais.

A licença ambiental, hoje, exige apresentação de Plano Ambiental de Conservação e Uso do Entorno de Reservatório Artificial, “conjunto de diretrizes e proposições com o objetivo de disciplinar a conservação, recuperação, o uso e ocupação do entorno do reservatório”. O Plano deve conter, inclusive, medidas para proteção das margens contra ocupação urbana, visando proteger a quantidade e qualidade da água.

A Resolução 303/2002, que protegia áreas de mangues e restingas do litoral brasileiro foi também revogada, o que coloca em risco cerca de 1,6 milhão de hectares desses ecossistemas. Se for mantida, os setores imobiliários e de carcinicultura (criação de camarão), estarão livres para avançar na sua destruição.

As restingas, depósitos arenosos em paralelo à linha da costa, são barreiras naturais para conter o avanço das marés e consequente erosão costeira, aguçada pela elevação do nível dos mares devido às alterações climáticas. São também cruciais para proteção da biodiversidade e conexão de ambientes, bem como habitats para espécies ameaçadas de extinção.

Nem mesmo a sobrevivência de inúmeras comunidades que dependem da pesca nos mangues, foi considerada pelo ministro e por conselheiros como a CNA e Confederação Nacional da Indústria (CNI).

Ainda foi aprovada a queima de embalagens e restos de agrotóxicos em fornos industriais usados para a produção de cimento, acabando com a obrigação de destinar corretamente os resíduos.

O governo federal alega que o conjunto de resoluções foi revogado, pois há leis mais novas que dispõe sobre os temas, como o Código Florestal. Especialistas, no entanto, destacam que o argumento é totalmente equivocado, visto que estas normas são os únicos instrumentos legais que protegem essas áreas.