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Expansão das lavouras de cana-de-açúcar pode extinguir mamíferos do Cerrado

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Expansão das lavouras de cana-de-açúcar pode extinguir mamíferos do Cerrado
O lobo-guará é uma das espécies ameaçadas pelo avanço das fronteiras agrícolas

Com a crescente demanda por biocombustíveis, a produção brasileira de etanol deve passar dos atuais 34 bilhões de litros por ano para 54 bilhões até 2030. O aumento do consumo implicará na abertura de ao menos 35 mil km² de lavouras, exercendo pressão sobre o Cerrado e Mata Atlântica, biomas com alto potencial para produção de cana-de-açúcar e com grande número de espécies ameaçadas.

A tendência foi apontada por cientistas de instituições europeias, em estudo publicado na revista científica Land. Para chegar aos resultados, eles compilaram informações sobre o plantio de cana no país e cruzaram com dados de ocorrência dos mamíferos no território brasileiro.
Os mamíferos foram escolhidos para avaliar o impacto da produção de etanol sobre a biodiversidade, pois eles são um dos mais vulneráveis à perda de habitat. “O Brasil ainda foi identificado como um dos dez principais países com um alto declínio de mamíferos projetado até 2050”, explicaram os pesquisadores.
O levantamento mostrou que o Cerrado é a região mais ameaçada. Estima-se que, até a próxima década, 19 mil km² do bioma terão drástica redução na diversidade de espécies, enquanto a Mata Atlântica sofrerá perda de biodiversidade em 17 mil km² devido ao conflito com áreas agrícolas.
Os pesquisadores previram o impacto sobre 610 espécies de mamíferos, dos quais 107 estão ameaçados de extinção e 93 são endêmicos do Brasil. Acredita-se que em algumas regiões do Cerrado, a perda de táxons pode ser total, pois sobrepõe habitats de animais em perigo com áreas propícias ao cultivo de cana-de-açúcar.
Embora a Mata Atlântica esteja em situação semelhante à do Cerrado, o segundo bioma é mais vulnerável por já ter 40% de seu território tomado pela agricultura. Além disso, de todos os hotspots mundiais, ele é o que possui a menor porcentagem de áreas sob proteção integral, menos de 3%.
Para mitigar os efeitos da expansão dos canaviais, poderiam ser reaproveitadas áreas já utilizadas pela agricultura, mas, mesmo assim, haveria impacto, já que os cultivos substituídos pela cana precisariam de novos locais para se estabelecer. Também é difícil impedir que os cultivos avancem sobre a vegetação nativa e habitats de espécies em vias de extinção, como lobo-guará, tamanduá-bandeira e anta.
“A conversão da vegetação nativa em agricultura é um dos principais fatores de perda de habitat nos trópicos. A expansão da cana-de-açúcar leva direta ou indiretamente a perda de habitat, portanto, tem sido associada aos impactos à biodiversidade” indicou o estudo.

Produção sustentável

Hoje, o Brasil já possui a maior área de cultivo de cana do mundo e, neste ano, alcançou a maior produção de etanol da história, 35,6 bilhões de litros, de acordo com a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Os dados também incluem o volume gerado a partir do milho, mas aproximadamente 99% é referente à plantação de cana-de-açúcar.

Com grande importância para a economia brasileira, além de ser alternativa aos combustíveis fósseis, o etanol pode ser produzido de forma sustentável, desde que sejam adotadas estratégias para conter a perda de vegetação natural, indicou o estudo. Uma das formas de mitigar os impactos da expansão da cana-de-açúcar é adotar a agrossilvicultura, que une o cultivo de árvores com culturas agrícolas.

A criação de áreas protegidas em pontos importantes para a biodiversidade também é uma sugestão dos especialistas. “Pesquisas futuras devem se concentrar na avaliação de opções de mitigação para conter os impactos da expansão da cana-de-açúcar. A identificação dos locais de impacto à biodiversidade, fornecidos neste estudo, são úteis para os formuladores de políticas e para os produtores de etanol”, pontuou o levantamento.