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Vírus devasta populações do boto-cinza

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Vírus devasta populações do boto-cinza
Crédito: Instituto Boto Cinza

O mesmo vírus que dizimou 250 botos-cinza (Sotalia guianensis) nas baías de Ilha Grande e de Sepetiba, no Rio de Janeiro, desde o final de novembro, agora está afetando as populações da espécie no litoral norte de São Paulo. Só entre outubro e janeiro, 53 animais morreram, representando quase 10% da população de botos da região.

Chamada de morbilivirose dos cetáceos, a doença provocada pelo morbilivírus também já causou mortes de golfinhos nos Estados Unidos, Austrália e Europa. Algumas subespécies do vírus já foram apontadas como causadoras de sarampo em humanos; cinomose em cães e focas; peste em cabras e ovelhas; e doença renal em gatos. Nos cetáceos, o vírus atinge botos, golfinhos e baleias. Não há indícios de contaminação de humanos pelo morbilivírus.

Segundo o pesquisador e veterinário do Laboratório de Mamíferos Aquáticos e Bioindicadores, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Maqua/Uerj), Elitieri Neto, o vírus pode ter sido introduzido por outra espécie de cetáceo que também vive na região. “A Baía de Ilha Grande recebe muitas espécies oceânicas de hábitos costeiros e com isso a interação entre cetáceos de diferentes espécies ocorre bastante. Então é uma hipótese para a introdução desse vírus”, disse Neto.

Um dos locais com maior população do boto-cinza do mundo é a baía de Sepetiba. Os animais lutam para sobreviver em meio ao desenvolvimento portuário, industrial e urbano e a pesca predatória, que avança e acaba com os peixes dos quais eles se alimentam.

Como não têm o hábito de migrar, os botos dependem, exclusivamente, do equilíbrio do local onde vivem, e um dos grandes riscos para sua sobrevivência é a poluição. Com a chegada de grandes indústrias na região portuária da baía, os animais sofrem com concentrações de metais pesados, que afetam seus sistemas imunológicos e hormonais, deixando-os mais suscetíveis a doenças.

O rápido crescimento da região também prejudica os botos. A baía abriga três terminais portuários e um estaleiro da Marinha. Os empreendimentos têm direito às chamadas áreas de exclusão, locais onde a atividade pesqueira é proibida. Com isso, pescadores artesanais são empurrados para a área que os animais costumam habitar. Em alguns casos, o boto fica preso nas redes de emalhe e não consegue subir à superfície para respirar, quando não se machuca em equipamentos, como anzóis.

Além de tudo isso, o boto-cinza ainda precisa disputar comida com os grandes barcos ilegais que cometem pesca predatória na região. Os grandes pesqueiros buscam peixes que integram a cadeia alimentar dos golfinhos, que acabam morrendo por desnutrição. A pesca ilegal também não respeita o período de defeso – quando a pesca é proibida – dos peixes consumidos pelo boto.

O animal está listado pelo Ministério do Meio Ambiente como espécie ameaçada e tem status de vulnerável na Lista da Fauna Brasileira de Espécies Ameaçadas de Extinção.

Kátia Groch, médica veterinária da USP, acredita que uma maneira de tentar salvar a espécie é tornar o ambiente em que esses animais vivem mais saudável.

“Se a gente fornece um ambiente com qualidade, acredito que os animais vão ter a resistência suficiente para lidar com os desafios que eles encontram, incluindo as doenças”, explicou

Em 2016, o Ministério Público Federal (MPF) lançou a campanha Salve o Boto – Não deixe o boto virar cinzas, em parceria com a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) e o Instituto Boto Cinza. A iniciativa estimula o uso da hashtag #SalveoBoto com objetivo de mobilizar internautas e organizações a darem visibilidade ao risco de extinção deste animal emblemático, símbolo do município do Rio de Janeiro.

Saiba mais sobre a campanha.