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Grandes mamíferos adubam solo das florestas tropicais

Grandes mamíferos adubam solo das florestas tropicais
Queixadas são um dos maiores fertilizadores das florestas tropicais/Crédito: Sharloch [CC BY-NC-ND 2.0]

Para sustentar seus quase 300 quilos, as antas consomem grande quantidade de plantas, frutos e até cascas de árvores. O mesmo ocorre com outros grandes mamíferos herbívoros, como queixadas e catetos. A dieta generalista e frugívora, faz com que as fezes e urina desses animais sejam ricas em nutrientes, responsáveis por fertilizar o solo de florestas tropicais, como a Mata Atlântica.

A descoberta é de estudo inédito desenvolvido por pesquisadores brasileiros, publicado na revista científica Functional Ecology. O trabalho mostrou, pela primeira vez, a importância dos grandes mamíferos para o ciclo de nitrogênio, elemento essencial para o crescimento das plantas e para a vida no planeta.

“Os mamíferos herbívoros, por consumirem e digerirem grandes quantidades de material vegetal, excretam a ureia que, uma vez depositada no solo, se transforma em amônia, adubando o próprio terreno”, explicou Nacho Villar, primeiro autor do artigo e pós-doutorando do Instituto de Biociências da Universidade Estadual Paulista (IB-Unesp).

Os pesquisadores descobriram que em áreas sem a presença dos grandes frugívoros – espécies que tem os frutos como principal fonte de alimento – a quantidade de amônia, uma forma de nitrogênio no solo, é até 95% menor.

Por circularem em grades áreas, devido ao grande porte, esses animais transportam e redistribuem nitrogênio em grandes extensões de florestas tropicais, enriquecendo manchas pobres em nutrientes. Estima-se que as áreas habitadas por essas espécies, recebem quatro vezes mais amônia e 50 vezes mais nitrato, provenientes das fezes e urina dos animais.

Experimento pioneiro

Para chegar aos resultados, os pesquisadores utilizaram como base o maior experimento de exclusão de mamíferos de grande porte da América do Sul, realizado no Parque Estadual da Serra do Mar, maior reserva contínua de Mata Atlântica do Brasil. No local, algumas regiões são cercadas, impedindo a entrada de grandes mamíferos, enquanto outras são abertas para os animais transitarem livremente.

O desenho experimental permitiu “isolar” os efeitos dos frugívoros de grande porte sobre a floresta. Foram analisadas amostras de solo de oito parcelas cercadas e oito abertas. Além das taxas de amônia serem maiores nas áreas com grandes mamíferos, as análises indicaram que, na presença deles, o composto era convertido em nitrato mais rápido, favorecendo o desenvolvimento das plantas.

“Outro ponto interessante do nosso estudo é a descoberta de que o palmito juçara é também uma espécie-chave na ciclagem de nitrogênio: ele produz abundantes frutos que atraem muitas espécies, incluindo os bandos de queixadas, e isso indiretamente leva à acumulação de amônia no solo”, destacou Nacho Villar.

Trata-se de uma interação em que todos ganham: enquanto os animais se alimentam dos frutos do palmito juçara, a planta é favorecida pela fertilização do solo pelos excrementos dos animais.

Segundo Villar, os queixadas compõem entre 80% e 90% de toda a biomassa de mamíferos da Mata Atlântica. Eles circulam por territórios extensos em grandes grupos, fertilizando a floresta. Com as armadilhas fotográficas instaladas no local, foi possível ver bandos com 50 a 100 queixadas, além de antas e catetos.

“As antas, por terem uma densidade mais baixa, têm uma participação menor no ciclo de nitrogênio, mas a quantidade de excrementos de cada indivíduo e a área que percorrem é considerável, inclusive dispersando sementes”, afirmou Villar.

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Ciclagem de nitrogênio./ Crédito: Divulgação Frugivory UnderpinsThe Nitrogen Cycle

Defaunação

Os pesquisadores chamaram a atenção para a importância dos grandes mamíferos para as florestas tropicais e como o desaparecimento desses animais, devido à caça ilegal, desmatamento e outros fatores, desiquilibra os ecossistemas. “A defaunação, o desmatamento e a colheita ilegal de palmeira e madeira afetam seriamente o ciclo do nitrogênio nas florestas tropicais, que desempenham um papel proeminente no ciclo global desse nutriente”, indicou o artigo.

Para os autores do estudo, preservar os papéis-chave dos grandes frugívoros e as funções que eles executam, exigirá um grande esforço para interromper o ritmo implacável de defaunação nos neotrópicos e a concomitante colheita ilegal de palmeiras e o desmatamento nessas florestas.

Realizado com o apoio da FAPESP, a pesquisa integra o projeto “Consequências ecológicas da defaunação na Mata Atlântica”, coordenado pelo pesquisador Mauro Galetti, professor do IB-Unesp, no âmbito do programa BIOTA-FAPESP.