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Entrevistas

Licenciamento ambiental: heroi, vilão ou vítima?

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Licenciamento ambiental: heroi, vilão ou vítima?
José Cláudio Junqueira

Implementado em 1981 pela Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, o licenciamento ambiental recebeu vários rótulos ao longo dos anos. Antes visto como heroi, o instrumento ganhou o papel de vilão quando se trata do desenvolvimento do país. A história do licenciamento e seu real papel na política pública de meio ambiente é o tema do livro Licenciamento Ambiental: Heroi, Vilão ou Vítima?, que será lançado nesta segunda-feira (22), na Escola Superior Dom Helder Câmara (ESDHC), em Belo Horizonte. A obra foi escrita de forma colaborativa por 13 autores e organizada por José Claudio Junqueira, Doutor em Saneamento, Meio Ambiente e Recursos Hídricos e professor na Dom Helder.

O livro é resultado do trabalho do Grupo de Pesquisa Licenciamento Ambiental e Avaliação de Impacto Ambiental, do mestrado em Direito Ambiental e Sustentabilidade e mostra a mudança da visão do licenciamento ambiental ao longo dos anos. “Em uma reflexão do que foi a história do licenciamento ambiental nestes 30 anos, a gente vê que na verdade ele foi apenas uma vítima, porque os órgãos ambientais, os empresários, o Ministério Público e a sociedade civil, enfim, todos os atores envolvidos, esqueceram que a lei prevê mais uma dezena de instrumentos de gestão. Todos esqueceram estes outros instrumentos e colocaram a responsabilidade nas costas do licenciamento, que evidentemente, como não foi desenhado para suportar tudo, se tornou uma vítima da gestão ambiental no Brasil”, explicou Junqueira.

Confira a entrevista:

Amda – O que motivou a produção do livro Licenciamento Ambiental: Herói, Vilão ou Vítima?

José Cláudio Junqueira – A motivação foi registrar qual é o papel real do licencimento ambiental na política pública de meio ambiente, prevista na Lei da Política Nacional de Meio Ambiente, Lei nº 6.938 de 31 de agosto de 1981, que estabeleceu vários instrumentos, entres eles o licenciamento ambiental, mas não apenas esse valioso instrumento.

Amda – A obra foi escrita de forma colaborativa por 13 autores. Quem são eles e em que áreas atuam ?

J.C.J – Além do professor Alberto Fonseca, da UFOP, mestres e mestrandos da Dom Helder, sendo profissionais liberais, professores de ensino superior, servidores públicos de órgãos ambientais, do Ministério Público e do Tribunal de Justiça.

Amda – Qual a expectativa com a publicação?

J.C.J – Como toda publicação da academia a expectativa é que sirva de reflexão para os atores envolvidos no processo de licenciamento ambiental e de contribuição para seu aperfeiçoamento.

Amda – Desde que foi implementado, o licenciamento ambiental recebeu diferentes rótulos. No início, era visto como um herói, mas, depois, tornou-se o vilão do desenvolvimento brasileiro. Em sua opinião, porque ainda existe essa cultura de que o meio ambiente é um empecilho para o progresso?

J.C.J – No início houve uma grande expectativa sobre o papel do licenciamento ambiental para reduzir a degradação ambiental. Foi tomado como um herói. Entretanto, a falta de planejamento no país, o grande deficit social e a não utilização de outros instrumentos de gestão, previstos na legislação desde 1981, colocou nas costas do licenciamento uma responsabilidade para a qual ele não foi projetado. Tornou-se o vilão que atravanca o desenvolvimento. Na verdade é uma vítima pelo seu uso incorreto.

Amda – Conte-nos um pouco sobre os fatores que desencadearam essas mudanças de rótulo do licenciamento ao longo dos anos.

J.C.J – Exatamente pelas razões citadas, o licenciamento ambiental passou a ser visto como a panaceia. No Brasil o licenciamento ambiental tem sido o locus para discutir todas as mazelas decorrentes do deficit público ambiental e social. Além das medidas mitigadoras e compensatórias para os potenciais impactos de um empreendimento, o licenciamento ambiental tem servido para abrigar condicionantes sem nexo causal com esses impactos. A Ministra do Meio Ambiente Izabella Teixeira usa uma figura de linguagem que me parece interessante. Ela diz que o licenciamento ambiental é como uma árvore de natal onde todos querem colocar um penduricalho. Já ouvi outras comparações menos simpáticas, dizendo que é o momento de morder, arrancar de quem pode. A hora da barganha. Isso só vem piorando com o passar do tempo.

Amda – Os recursos da compensação ambiental, que deveriam ser aplicados na recuperação de danos ambientais, continuam sendo sequestrados pelo governo para sanar déficits públicos. Qual a sua opinião a respeito? Como reverter esse cenário? Qual é o papel da sociedade?

J.C.J – O poder público usa uma expressão diferente: contigenciamento, que no fundo significa vou tomar emprestado e devolvo quando puder. Não seriam os fiscais da lei que deveriam estar exercendo seu papel? À sociedade cabe pressioná-los para que o façam. Às vezes parece que a sociedade é sempre vítima, mas não seria ela a responsável pelo governo que tem? A área ambiental nunca foi uma prioridade de governo e talvez assim seja porque também nunca foi uma prioridade da sociedade num país com tanto deficit social.