Entrevistas

Festival de cinema ambiental brasileiro completa 20 anos

O meio ambiente, aos poucos, vem conquistando espaço de destaque na mídia, seja pelas notícias sobre mudanças climáticas, vazamento de petróleo, Rio + 20, Protocolo de Quioto, dentre outros assuntos. Na sétima arte, não tem sido diferente. Há alguns anos, filmes ambientais exibidos em festivais ou salas de cinema não recebiam muitos expectadores. Os que iam eram tidos como “biodesagradáveis”. Aos poucos, essa percepção está mudando e festivais de filmes ambientais têm recebido variado público.

Criado durante a Eco 92 – Conferência da ONU sobre o Meio Ambiente e Desenvolvimento realizada no Rio de Janeiro em 1992 – o Festival Internacional de Cinema Ambiental e Direitos Humanos, Ecocine encontra-se em sua vigésima edição, sendo o primeiro do gênero no Brasil. Ele acontecia em festivais em São Sebastião, litoral de São Paulo e, após dez anos, passou a promover mostras itinerantes em diversas cidades do país. Algumas delas, inclusive, recebem participação de produções internacionais. Como em um intercâmbio, também são exibidos filmes dentro de festivais dos países parceiros, como Índia e Canadá. Desde 2006, o Ecocine incorporou a temática dos Direitos Humanos em suas exibições. Suas mostras e festivais são realizadas através de parcerias com instituições públicas e privadas.

De acordo com Ariane Porto, antropóloga, roteirista e diretora do Ecocine, o principal objetivo do festival, que é anual, é atrair público diferente com assuntos variados, englobando desde a qualidade de vida, coleta de lixo, uso dos bens públicos entre outros fatores que favoreçam o meio ambiente. “Desconhecimento e falta de informação continuam sendo os grandes responsáveis pela manutenção do estado de destruição e desperdício dos recursos naturais que se verifica atualmente”, diz.

Porto já roteirizou e dirigiu 20 documentários sobre ecologia, a série televisada “Povos do Mar” e o longa metragem infantil “A Ilha do Terrível Rapaterra. Também criou o projeto Bem-Te-Vi (audiovisual para crianças) e é consultora internacional do Projeto GEF Marino (Global Environmental Fund) Programa das Nações Unidas para o desenvolvimento (Pnud) – Chile.

Quanto a possibilidade de o Ecocine vir à capital mineira, Tereza Cristina uma das responsáveis pela administração e produção do festival é quem responde: “Com certeza teremos prazer em participar com o Ecocine em BH, temos que buscar parcerias”.

Amda – Com que intenção foi criado o Ecocine? Havia alguma necessidade especial?

Ariane Porto – O Ecocine foi o primeiro no gênero criado no Brasil. E também foi o primeiro, e creio que ainda ser o único, que coloca a questão dos direitos humanos diretamente relacionada à questão ambiental. As três primeiras edições do festival ocorreram na cidade litorânea de São Sebastião – SP, a partir de então, o Ecocine tornou-se itinerante e tanto o festival oficial quanto suas mostras, começaram a circular por várias cidades do país. A partir da Mostra Competitiva Internacional de Cinema podem ser realizadas mostras itinerantes com os melhores filmes do Festival.

Amda – Que importância ele tem hoje no país?

A.P. – O Ecocine destaca, desde 2005, a ampla questão do fator de direitos humanos, em conjunto com violação de direitos ambientais, como nos casos de guerra, epidemias, que poderiam ser evitados com saneamento básicos, despoluição de fontes de água. A questão de direitos humanos está ligada diretamente à questão ambiental. Então a violação dos direitos culturais, a diversidade cultural, também é uma violação aos direitos humanos e, com certeza, ela vem junto com uma degradação ambiental. Temos um gargalo a ser enfrentado não apenas pelo cinema ambiental, mas por toda produção nacional que é a distribuição. Não temos salas de cinema em número compatível com nossa população e as poucas existentes são ocupadas majoritariamente pela produção norte-americana. As “majors” (grandes distribuidoras internacionais) dominam o mercado. Seria bom termos distribuidoras mais fortes e um circuito exibidor mais extenso.

Amda – Desde 92, o que mudou no Ecocine?

A.P. – Desde 1992, o Ecocine propõe a reflexão ambiental e direitos humanos – um convite apropriado para os dias atuais e movimentos futuros. O festival tem essa proposta, buscar uma reflexão coletiva e fundamentalmente individual para que se promova uma mudança. Ele abrange temas ambientais e sociológicos, que variam entre vídeos, arte, onde o artista expressa de forma poética sentimentos em relação à questão ambiental. Dependendo do público, temos muita animação e filmes para crianças, mas o interessante é que temos dentro do Ecocine uma mostra onde a criança é produtora do seu próprio filme.

Amda- Quais as suas finalidades do Ecocine. Ele tem cumprido seu papel?

A.P. – O cinema ambiental tem como objetivo estudar profundamente o tema sustentabilidade e fazer com que esse “problema social” passe a ser mais discutido. Temos exibido filmes com várias propostas de abordagem e que despertam no público sensações e sentimentos distintos. Muitas vezes, as questões não são tão objetivas e despertam no público uma predisposição para um olhar diferente. Em outros momentos, as denúncias são contundentes e objetivas, o que desperta uma discussão mais focada. Essa é a riqueza da temática sua diversidade.

Amda -Por quais países já passou?

A.P. – Brasil, Itália, Canadá, Argentina, Índia e Chile.

Amda – Como é a sua recepção no Brasil? Ela muda quando é em outros países?

A.P. – As diferenças estão mais relacionadas ao nível de conhecimentos de cada público. Ou seja: os países e regiões mais desenvolvidos, é claro, possuem um nível de conhecimento cerca das questões ambientais globais.

Amda – Tem alguma cidade onde você sente que é mais difícil agradar o público?

A.P. – Não, não dá pra fazer esse tipo de diferenciação.

Amda- Quais os seus grandes obstáculos? O que impede uma repercussão ainda maior?

A.P. – Sempre o que impede a difusão dos bens culturais, sejam eles de que natureza for, é a carência de apoio financeiro ou institucional.

Amda – Como é feita a seleção da filmografia? Quais os critérios de seleção?

A.P. – Existem duas formas: a curadoria – onde os curadores indicam os filmes, e a seleção, a partir da inscrição pelo site.

Amda – Existe algum projeto futuro?

A.P. – Muitos! No que se refere ao audiovisual e meio ambiente temos a nova temporada da serie TV Povos do Mar (que esta no ar desde 1997), a finalização do longa metragem Bem-Te-Vi, O Filme, que estamos produzindo com crianças dos cinco continentes sobre o mundo ideal e mundo real (www.btv.org.br) e, claro, a continuidade do Ecocine.

Amda – Qual o perfil do público?

A.P. – Depende do projeto. O Bem-te-vi tem foco especifico na criança, e os demais, são voltados para todo tipo de público.

Amda – De todos os eventos do Ecocine, qual o acontecimento mais marcante?

A.P. – As participações do nosso querido e saudoso Professor Aziz Ab’Saber, que da forma mais generosa possível, compartilhou seus conhecimentos com todos nós.

Amda – Qual mensagem você deixa para aqueles que, assim como vocês, lutam pela preservação do meio ambiente e maior conscientização da população.

A.P. – Não desistam. E não se esqueçam de que “os fins não justificam os meios”. Não podemos ter um discurso dissociado de uma prática.

Mais informações sobre o Ecocine: http://simposioeducom.blogspot.com.br.