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Seminário discute ameaças e desafios da proteção da fauna silvestre

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Seminário discute ameaças e desafios da proteção da fauna silvestre
Jadir Oliveira

Atropelamentos, caça, tráfico, incêndios florestais e destruição de habitats são algumas das diversas ameaças à fauna silvestre brasileira. Os temas foram discutidos por especialistas no Seminário Fauna Silvestre – Ameaças e Desafios, promovido pela Amda no início de junho com apoio da Usina Coruripe, Cenibra e AngloGold Ashanti.

Em sua fala na mesa de abertura, Dalce Ricas, superintendente da Amda, ressaltou que é necessário aumentar a pressão sobre as autoridades, pois as providências tomadas pelo poder público são ínfimas diante do tamanho da atrocidade contra a fauna silvestre. Edson Valgas, representante da Cenibra, relatou que o primeiro projeto ambiental da empresa, instituído em 1990, foi para reintrodução do mutum-do-sudeste e hoje engloba outras espécies, como jacutinga e jaó. Jadir Oliveira, representante da Usina Coruripe, revelou o pioneirismo da empresa na compra e estruturação da Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN) de Porto Cajueiro.

Mauro Galetti, vice-chefe do Departamento e vice-coordenador da pós-graduação em Ecologia e Biodiversidade da Unesp/SP, abriu o seminário enfatizando que é preciso reverter a defaunação de nossas florestas e afirmou que nunca houve tanta perda de fauna desde que o homem surgiu no planeta. “Particularmente nos últimos 50-80 anos, com a Revolução Industrial, estamos destruindo muitos habitats, acelerando os níveis de defaunação e deixando as florestas sem animais. Uma floresta sem animal é uma floresta vazia e morta”, afirmou.

Galetti ressaltou ainda o papel dos animais silvestres contra as mudanças climáticas. “É um link que pouca gente faz. As florestas tropicais estocam 55% do carbono terrestre. Animais grandes dispersam sementes grandes, que geram grandes árvores, com densidade de madeira alta, ou seja, retêm mais carbono”, explicou.

O pesquisador falou ainda sobre o PL da caça, de autoria do deputado federal Valdir Collato (MDB/SC), lembrando que os danos causados pelo “javaporco” (cruzamento de porco domésticos com javalis africanos introduzidos no país), argumento principal da proposta, está sendo tratado de forma pouco ética. Ele não só concorda que o problema existe, como enfatizou os impactos causados à fauna e flora silvestres, mas disse que há comprovação de introdução intencional por caçadores do animal em outras regiões como forma de garantir a caça.

Crimes contra a fauna e impunidade

Bruno Torquato, professor do mestrado em Direito Ambiental e Desenvolvimento Sustentável da Escola Superior Dom Helder Câmara e coordenador do curso de especialização em Direito Urbanístico e Ambiental da PUC Minas Virtual, falou sobre a impunidade daqueles que cometem crimes contra a fauna. Segundo Torquato, o direito penal ambiental consolidou-se a partir de 1988 com a nova Constituição Federa.

A Lei de Crimes Ambientais, promulgada em 1988, ajudou nessa solidificação, mas trouxe responsabilidades que incomodam, como normas cujo conteúdo necessita de complementações e, por si só, não se bastam; e grande número de crimes de periodistrato – crimes que não punem o ofensor pelo dano, mas simplesmente pela ameaça. Torquato externou sua preocupação sobre o descrédito da lei, ampliado por comentários de penalistas famosos e professores, o que gera enorme problema na aplicação da legislação.

Torquato comentou ainda sobre o princípio da insignificância ou da bagatela, na qual é necessário verificar se a conduta real é expressiva como crime. O professor exemplificou com a pesca de dois peixes durante o período de defeso, quando a atividade é proibida. A princípio, o réu cometeu crime ambiental, mas os tribunais argumentam que é uma atipicidade, ou seja, não há crime. “A verdade é que a maioria dos crimes ambientais pode ser considerada inexpressiva diante do tamanho de toda fauna brasileira. Há uma dificuldade muito grande em perceber o bem jurídico difuso, que extrapola a esfera coletiva e chega inclusive às gerações futuras. Não há consciência dos tribunais em se perceber o bem jurídico meio ambiente relevante, ainda que a ofensa, aparentemente, seja pequena”, afirmou.

A impunidade é combatida diariamente pelo Major Juliano José Trant de Miranda, comandante da Companhia Independente de Meio Ambiente. Para ele, a questão legal ainda é irrisória quando se trata de fauna. Como exemplo, o Major citou a extração de orquídeas em unidades de conservação no entorno de Belo Horizonte. “Prendemos o mesmo rapaz por três vezes na mesma semana. Ele tem várias infrações no currículo e disse que está em um crime muito melhor do que qualquer um, ‘com dinheiro no bolso e sem guerra com ninguém’. Quase disse que ‘o crime compensa'”, lamentou.

Para Lígia Vial, assessora jurídica da Amda, o judiciário é extremamente despreparado para lidar com causas ambientais. “A única forma de revertermos esse quadro é a sociedade se envolver em políticas públicas. Somos propulsores dessa mudança urgente”, afirmou.

Rodovias e atropelamentos

A malha viária de Minas Gerais corresponde a 16% de toda malha viária existente no país. A maior parte foi construída e está em operação sem licenciamento ambiental. Os dados alarmantes foram apresentados por Liliana Adriana Nappi, Superintendente de Apoio à Regularização Ambiental da Semad.

“No âmbito do licenciamento, não tínhamos um olhar tão profundo para a fauna. Era uma coisa mais ‘longe'”, afirmou. Segundo Nappi, estão em andamento a revisão dos termos de referência de manejo de fauna, capacitação de servidores, geoespacialização dos dados de inventário e monitoramento de fauna e tratativas com DEER-MG com vistas ao planejamento do licenciamento da malha viária sob sua responsabilidade – 23.663 km. O departamento foi convidado para participar do seminário, mas não enviou representante.

Dalce Ricas, superintendente da Amda, enfatizou que o licenciamento de rodovias tem de ter foco muito maior do que o asfaltamento e citou pesquisas da Ufla, coordenadas pelo professor Alex Bager, que demonstram impactos radiais de até 5 km. Para ela, é necessário considerar o valor ambiental de áreas de interferência como parâmetro decisivo no planejamento e decisão de abertura de novas vias, e elaborar e observar termos de referência rigorosos para o licenciamento, que envolvam com destaque estudos e medidas mitigadoras para os efeitos radiais e não somente para obras de engenharia. Ela criticou a morosidade dos órgãos ambientais no licenciamento corretivo das rodovias e informou que isto á luta constante da Amda.

Política de proteção da fauna silvestre em Minas

O Instituto Estadual de Florestas (IEF) assumiu a fauna em 2013 após assinatura do acordo de cooperação técnica firmado entre Ibama, Semad e o órgão. Luciana Pereira Carneiro, gerente de Uso e Manejo da Fauna Silvestre do IEF, apresentou dados sobre o tráfico de animais silvestres no estado. As aves são as vítimas mais frequentes, sendo trinca-ferro e canário-da-terra as espécies mais apreendidas.

A superintendente da Amda chamou atenção para o fato de que a política de proteção a fauna ainda é muito voltada para recolhimento de animais, o que é importante, mas o objetivo é muito maior. “O primeiro objetivo deveria ser a redução de apreensões, e isso está diretamente relacionado a políticas públicas. É preciso gerar informação de massa para a área ambiental. Enquanto o assunto não for abordado na base escolar, não vamos sair do lugar”, afirmou Dalce.