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Entrevistas

Atuação política ambiental

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Atuação política ambiental
Deputado federal Sarney Filho / Crédito: página do deputado no Facebook

Em seu 9º mandato como deputado federal, Sarney Filho trilha uma carreira política envolvida em questões ambientais. Ele integra um seleto grupo de parlamentares que realmente atua na área ambiental. Para os ambientalistas e provavelmente para muitas pessoas no país, isto é um grande mérito.

Sarney foi ministro do Meio Ambiente por três anos e acompanhou de perto as discussões sobre o novo Código Florestal brasileiro, que considera um grande retrocesso na legislação ambiental brasileira. “Ao retirar diversas garantias de extrema importância para a proteção do meio ambiente, mediante redução e flexibilização das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de reserva legal, privilegia-se o aumento do desmatamento.”

O deputado pontua ainda que o novo Código Florestal consagra em lei um “tratamento privilegiado para os infratores das normas ambientais, sem a preocupação de considerar as especificidades sociais e ambientais das situações que estão sendo regularizadas, e sem a exigência de compensações ambientais.”

Confira a entrevista completa:

Amda – Há quanto tempo o senhor atua na política? Como surgiu esse interesse?

Sarney Filho – Iniciei a minha vida pública aos 21 anos, como deputado estadual do Maranhão, e estou em meu 9º mandato como deputado federal. De 1999 até 2002, fui ministro do Meio Ambiente, questão que me envolveu desde jovem e tem sido um dos principais focos da minha atividade política.

Como parlamentar, envolvi-me na luta pelas Diretas Já, pela reforma agrária, pela convocação da Assembleia Constituinte, entre outras questões relevantes. Na Constituinte fui coordenador do Grupo Parlamentar para Estudos da População e autor dos dispositivos que tratam do planejamento familiar. Junto com parlamentares ligados à causa socioambiental, como o ex-deputado Fábio Feldman, conseguimos inovar na proteção do meio ambiente na Constituição de 1988. Em 1983, apresentei projeto de resolução que culminou na criação da Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias da Câmara dos Deputados.

No Ministério do Meio Ambiente, promovi a reestruturação da pasta, com a revitalização do Conselho Nacional do Meio Ambiente, a regulamentação da Lei de Crimes Ambientais, a aprovação da Lei n° 10.400, que criou a Carreira de Especialista em Meio Ambiente e permitiu a criação de mais de 2.300 vagas para concurso público, beneficiando os servidores do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis] e do Ministério, bem como a criação de inúmeras unidades de conservação, incluindo o Parque Nacional das Nascentes do Rio Parnaíba. Conseguimos aprovar também a Lei do SNUC – Sistema Nacional de Unidades de Conservação, entre outras iniciativas.

De volta à Câmara, ingressei no Partido Verde, que tem realizado importante trabalho nas questões socioambientais e ligadas a direitos humanos, municipalismo, luta contra a discriminação etc. Revitalizamos a Frente Parlamentar Ambientalista e conseguimos aprovar a Lei de Resíduos Sólidos e a Lei da Mata Atlântica.

Amda – O que mais o preocupa em relação ao Código Florestal?

S.F – A Lei nº 12.651/2012, novo Código Florestal, representa um grande retrocesso na legislação ambiental brasileira. Ao retirar diversas garantias de extrema importância para a proteção do meio ambiente, mediante redução e flexibilização das Áreas de Preservação Permanente (APPs) e de reserva legal, privilegia-se o aumento do desmatamento. Uma verdadeira opção pelo atraso em detrimento da economia verde.

Como exemplo dos problemas existentes, no caso da flexibilização da reserva legal para imóveis com até quatro módulos fiscais – os quais, segundo o Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária], representam cerca de 85% dos 5,2 milhões de imóveis rurais do país -, temos, na prática, uma falácia em termos da exigência da manutenção dos percentuais mínimos de reserva legal exigidos para cada bioma. Na realidade, está configurado mais um incentivo ao aumento do desmatamento e da não observância dos quesitos técnicos e legais voltados à proteção ambiental. Registre-se que os imóveis com até quatro módulos, na Amazônia, alcançam quatrocentos hectares, ou seja, não estão em tela apenas pequenas dimensões de terra.

A anistia alcança, praticamente, tudo o que foi feito em desacordo com a legislação vigente antes de 22 de julho de 2008. Aí estão o perdão a essas ilegalidades e a permissão para o exercício de atividades agrossilvipastoris em encostas, a regularização de atividades de carcinicultura nos mangues, a suspensão de sanções, o cancelamento de multas e a dispensa de recomposição, entre outras flexibilizações. Tudo faz com que o infrator, em comparação com aqueles que cumpriram a legislação, ganhe um verdadeiro prêmio. Essa anistia é inconsistente do ponto de vista jurídico e injusta, além de constituir uma perigosa ferramenta de incentivo à irregularidade e à ilegalidade, principalmente na forma de novos desmatamentos.

Consagra-se em lei, assim, um tratamento privilegiado para os infratores das normas ambientais, sem a preocupação de considerar as especificidades sociais e ambientais das situações que estão sendo regularizadas, e sem a exigência de compensações ambientais. Essa anistia representa, ainda, uma forma de desincentivo para aqueles que acreditaram e cumpriram a legislação ambiental.

Por outro lado, ao se diminuir a proteção das florestas e demais formas de vegetação, se comprometerá, de uma forma irreversível, os serviços ambientais que os ecossistemas naturais prestam. Isso certamente prejudicará, diretamente, a produção de alimentos, uma vez que os insumos necessários ao seu sucesso, como a disponibilidade de água e de terras (sem erosão e sem desertificação), estarão seriamente ameaçados. Também o regime de chuvas de todo o país será prejudicado, pois hoje sabemos que as chuvas tão necessárias para as plantações, em todas as regiões, se formam na Floresta Amazônica e dela dependem.

Um exemplo claro desse problema foi a crise da água que atingiu e atinge o nosso país. A crise levou à falta d’água, com consequências dramáticas para diversas regiões do Brasil, e ao racionamento em centenas de localidades. Os impactos foram amplos e comprometeram a vida dos brasileiros por inúmeras vias, desde a dificuldade do consumo in natura, até a quebra de safras agrícolas e prejuízos para os diversos setores da economia, além do prenúncio de uma crise energética sem precedentes.

Amda – A luta contra a aprovação de diversos artigos do Código, incluindo a campanha Veta Dilma, foi um dos maiores movimentos sociais que aconteceu no Brasil. Porém a impressão que se tem é de que o Congresso e o Poder Executivo a ignoraram consciente e deliberadamente. Em sua opinião, pode-se dizer que este episódio foi demonstração ditatorial e de desprezo pelo que pensa a sociedade por parte dos parlamentares e do governo?

S.F – O Partido Verde, fiel aos seus princípios, bem como à sua Bancada, sempre fez ecoar, no âmbito do Congresso Nacional, os anseios populares, em todas e quaisquer questões socioambientais.

Não foi diferente com o Código Florestal. Ao contrário, participamos intensamente de todas as discussões e, no que diz respeito à campanha Veta Dilma, inclusive, nos permitimos encaminhar a Indicação nº 2864/2012, de 04 de maio de 2012, solicitando da Senhora Presidente da República que fossem adotadas providências no sentido de vetar o PL 1876/1999, votado no dia 25 de abril de 2011, na Câmara dos Deputados. Também nesse sentido, encaminhamos à Senhora Presidente da República o Ofício nº 094/2012, de 03 de maio de 2012, da Liderança do Partido Verde.

Por outro lado, entendo que o engajamento da sociedade foi falho e insuficiente, atendo-se a pequenos eventos, frequentemente sem foco. No Congresso Nacional, também não houve sensibilização e foram raríssimas as manifestações de nossa sociedade, à exceção de poucas Organizações Não-Governamentais que têm sido parceiras da Frente Parlamentar Ambientalista, que coordeno, como Fundação SOS Mata Atlântica, IPAM [Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia], Greenpeace e WWF.

Estamos enfrentando novas tentativas de retrocessos na legislação socioambiental e este tem sido o nosso grande desafio hoje. Somente com a mobilização efetiva da sociedade civil seremos capazes de impedir mais danos ao meio ambiente e partir para um novo modelo de desenvolvimento que seja, verdadeiramente, sustentável.